Solange Srour

Diretora de macroeconomia para o Brasil no UBS Global Wealth Management.

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Descrição de chapéu Selic juros inflação

Prever inflação nem sempre é difícil

É sempre válido revisitar os erros de previsão econômica e tentar evitar sua repetição

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No fim do ano, é sempre válido fazermos o exercício de revisitar os erros de previsão econômica e tentar evitar sua repetição.

Em 2022, acredito que o primeiro lugar nesse ranking ficou com a avaliação do processo inflacionário global de 2021. No começo de 2022, muitos economistas, inclusive os bancos centrais, ainda esperavam que a inflação fosse transitória –fruto da desorganização das cadeias produtivas e da alta dos preços de energia. Nos EUA, em particular, a expectativa era de que a inflação terminasse 2022 em 3,5%. A alta acumulada até agora não somente é de quase 7%, como também se encontra bem disseminada, e o rendimento do título do Tesouro dos EUA saiu de 0,25% no começo do ano para cerca de 4,25%.

No Brasil, a alta inércia e a desancoragem das expectativas fizeram o Banco Central iniciar o aperto monetário quase um ano antes do Fed. Ainda que na primeira reunião do Copom de 2022 a inflação projetada pelo BCB estivesse em 5,4% –próxima ao nível esperado agora– a hipótese para os preços administrados (que incluem gasolina e energia elétrica) era de alta de 6,6%. Hoje o BC espera inflação de 6% para 2022, mas deflação de 3,6% de administrados! Se não fosse a redução dos impostos e a queda do preço internacional da gasolina, a inflação estaria perto de 8%.

Sede do Banco Central em Brasília; Copom mantém taxa de juros em 13,75% ao ano - Pedro Ladeira/Folhapress

Ao contrário do que muitos economistas ainda afirmam, a alta inflação, no Brasil e globalmente, não é apenas derivada de choques de oferta, mas também de choques de demanda resultantes da combinação de políticas monetárias e fiscais expansionistas adotadas na eclosão da pandemia, que levaram as taxas de desemprego para níveis historicamente baixos e a reajustes de salários acima da produtividade. As pressões sobre os preços são generalizadas, com particular intensidade nos preços dos serviços.

E o que se espera para 2023? Podemos ter como perspectiva que a inflação cederá bem, já que em grande parte do mundo os juros estão menos estimulativos e no Brasil, especificamente, estão em nível bastante restritivo? A resposta deve ser: depende, pelo simples fato de que há muitas dúvidas sobre a política fiscal de diversas economias, desde a Europa até a China.

Os efeitos da política fiscal na inflação são, em geral, divididos em dois. Primeiro, gastos públicos geram demanda por bens e serviços e –quando a economia está próxima do pleno emprego, como é o caso nos EUA e no Brasil– pressionam a capacidade instalada e o mercado de trabalho, provocando aumento da inflação. Segundo, quando a expansão fiscal é forte o suficiente para gerar perspectiva de insustentabilidade da dívida, a pressão sobre os preços vem com a depreciação cambial e desancoragem das expectativas mais longas de inflação.

Entramos no ano que vem com uma expansão fiscal contratada pela PEC da Transição de cerca de 1,7% do PIB e com a determinação de que seja encaminhada ao Congresso uma proposta de regra fiscal que, se aprovada, acabará com o teto de gastos. Isso sem falar das outras benesses recém-aprovadas –e muito bem documentadas em artigo de Marcos Lisboa e Marcos Mendes publicado recentemente no Brazil Journal– que podem levar a conta para mais de 2% do PIB.

Alguns defensores dessas medidas de expansão fiscal argumentam que não devemos nos preocupar com a transmissão da política fiscal para a inflação. Eles dizem que grande parte desse montante será direcionado aos mais pobres, que têm baixa capacidade de consumir e gerar inflação. Por mais meritória que seja a redução da desigualdade social, teríamos de reinventar a ciência econômica para diferenciarmos os "gastos do bem" dos demais na demanda agregada. Não foi à toa que a Selic saiu de 2% para 13,75% com a triplicação do gasto social, e seu efeito na inflação ainda é muito incipiente.

Adicionalmente, sem considerar os impactos da elevação da incerteza sobre qual será o arcabouço fiscal, o aumento de gastos contratados implicará um crescimento de quase 5 pontos percentuais do PIB na dívida pública nos próximos 12 meses. Sob esse aspecto, um argumento muitas vezes usado é o de que não há razoabilidade no conceito de solvência em um país cuja dívida está denominada em moeda nacional. Afinal, é sempre possível imprimir moeda para pagar os credores. A ideia de que bancos centrais possam financiar tesouros nacionais foi enterrada no mundo, mas sobrevive no Brasil.

Se o ano de 2023 não trouxer um arcabouço fiscal crível e medidas compensatórias para tamanha expansão de gastos, não será difícil prever o que acontecerá com a inflação. Do mesmo modo, não será difícil prever qual será a justificativa para o fracasso em controlar o déficit público: os juros altos e a "ambiciosa" meta de inflação

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