Sylvia Colombo

Historiadora e jornalista especializada em América Latina, foi correspondente da Folha em Londres e em Buenos Aires, onde vive.

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Descrição de chapéu América Latina

Tropeços do Colorado podem dar vitória à oposição no Paraguai

Alternância de poder seria saudável para atender clamor das ruas e população sem acesso a boa saúde e educação

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Pesquisas de opinião podem não ser o modo mais acertado de projetar o resultado de uma eleição no Paraguai. A maioria delas está vinculada a grupos empresariais ou ao poderoso Partido Colorado —que governou o país por mais de 70 anos e atualmente está no poder.

Um estranho fenômeno, porém, vem sendo registrado entre as principais sondagens realizadas no país vizinho. Duas das mais importantes dão resultados dissonantes às vontades do partido hegemônico.

O líder da oposição, Efraín Alegre, discursa em lançamento de candidatura presidencial, em Assunção - Norberto Duarte - 16.ago.22/AFP

A da Atlas aponta para um empate técnico, com ligeira vantagem (3 pontos) para o candidato opositor, Efraín Alegre sobre o postulante colorado, Santiago Peña. Em outra, da Multitarget, Peña nem sequer está em segundo lugar —não há segundo turno na eleição paraguaia. Tudo se resolverá já no próximo dia 30.

Usualmente, vislumbra-se o vencedor de uma eleição no país com ao menos um mês de antecedência. Desta vez, reina a incerteza e a sensação de que o poderoso Colorado pode estar com a hegemonia em risco.

Quais as principais explicações para um possível fracasso do partido do ditador Alfredo Stroessner, que governou o país de 1954 a 1989? Uma delas, o ocaso do ex-presidente Horacio Cartes, acusado e alvo de sanções por contrabando e narcotráfico pelos EUA. Isso desgastou o Colorado nacionalmente e foi o motivo, por exemplo, das fortes manifestações antigoverno que cobri para esta Folha em 2021.

Há ainda embate frontal entre o atual presidente, Mario Abdo Benítez, da ala antiga e tradicional do Colorado, com Peña, da ala cartista, mais recente. Esse confronto quase significou, mais de uma vez, o impeachment de "Marito", como é conhecido.

Não que Efraín Alegre seja a melhor opção para os eleitores paraguaios, e eles sabem disso, já que ele foi derrotado em duas outras ocasiões em corridas eleitorais, além de ser conhecido por desrespeitar certas alianças. Mas, trata-se de um fato que, para este pleito, Alegre conseguiu unificar centro e esquerda como quase nunca ocorreu na democracia paraguaia —exceção feita à vitória de Fernando Lugo, em 2008.

O que conta a favor de Alegre agora é a exposição de um Estado débil em atender a população em seus pontos frágeis, como a saúde, como ficou exposto na pandemia. Há uma informalidade de 65% no mercado de trabalho, o que resulta numa baixa arrecadação do Estado. Pelo menos 40% da população hoje integra uma classe média vulnerável, enquanto a pobreza atinge quase 30% dos paraguaios.

Os números da macroeconomia paraguaia mostram um país estável, com um crescimento de 4% previsto para 2023 e uma economia em dinâmica transformação —de mero produtor de matérias-primas a um exportador de produtos de maior valor agregado—, e mais pujante devido às chamadas "maquilas", muitas de capital brasileiro.

O caso é que os benefícios desse melhor desempenho econômico nunca chegaram à população mais pobre. E talvez por isso uma pesquisa como a do Latinobarómetro aponte que quase 90% dos paraguaios afirmam acreditar que seus governantes trabalhem apenas para os mais ricos.

É possível que o Partido Colorado tenha de pagar a conta desses erros nesta eleição, numa derrota que seria histórica para sua hegemonia. Não se pode descartar, porém, que a corrupção histórica do país atue na compra ou manipulação de votos de última hora.

Para atender o clamor das ruas em 2021 e, finalmente, uma população que nunca teve acesso a boa saúde e educação apesar do bom desempenho macroeconômico do país, seria saudável, neste momento, uma alternância de poder.

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