Tati Bernardi

Escritora e roteirista de cinema e televisão, autora de “Depois a Louca Sou Eu”.

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Tati Bernardi

Esquerdolavo

Em seu Lattes você deveria colocar a frase 'stupid destroyer' cem vezes

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Estou escrevendo uma série pra TV e, como bem sabem os roteiristas, agora toda sala de roteiro que se preze tem um jovem recém-chegado de um curso gringo que está ali apenas para “fazer o Olavo de Carvalho” e meter a britadeira e a metralhadora em qualquer ideia.

Ele diz que trabalha com “leitura crítica”. Ele diz que trabalha com “script doctor”. Não, amigo, esses especialistas dão caminhos. Você trabalha pelo extermínio da imaginação, você trabalha contra. Em seu Lattes deveria ter a frase “stupid destroyer” repetida cem vezes.

O vândalo de cérebros alheios quase sempre é contratado por algum produtor bocó, excitadíssimo pela ideia de ter um desgraçado arrogante em seu corpo de funcionários. O garoto nunca rascunhou uma sinopse de três linhas, nunca imaginou no banho um diálogo de meia página, mas porque passou cinco semanas em NY, fazendo um curso que ele nem gostou tanto assim —por que ele não gosta de nada tanto assim— mete uma tromba arrogante na fuça e uma camiseta com dizeres humildes e vem ser filho da puta todas as terças e sextas, no mesmo horário.

Graças a esse garoto que odeia o cinema nacional (mas também odeia Hollywood, porque “né?”), que revira os olhos para qualquer referência “antiga” —mas não tem as próprias; graças a esse garoto burro e pretensamente “perdoável” só porque meteu uma “hashtag obrigada SUS”; graças a esse gênio da chorumela que nasceu de uma grande máquina de cuspir peças replicadas para o não funcionamento de uma engrenagem de mentira.

BullRun/Adobe Stock

Graças a esse lixinho empoderado por niilismo e cinismo e “porranenhumismo” que algum produtor ultrapassado decidiu chamar de “um olhar diferente” (e ele vai dizer que estou cometendo idadismo e encher meu saco com “ismos” e seguir sendo um nadismo). Graças a esse garoto que nunca fez nada, nunca teve nem sequer um caderninho de anotações. Nunca um poeminha adolescente escrito à mão. Nada. Mas passa o dia enfastiado e ofendido com a limitação humana e chama isso de “profissão”, graças a esse moleque, um projeto que já poderia estar pronto nunca nem conseguiu sair do argumento.

A gente respira e ele prepara o bombardeio e um sorriso psicótico. Apenas porque fez um curso e se vendeu pra gente deslumbrada como a salvação da teledramaturgia. Apenas porque o cabelo dele é interessante e ele tem unhas coloridas.

Apenas porque ele odeia o produtor velho e o produtor velho precisa ser odiado para achar que é um desafio perfeito para o seu “status já alcançado” —e jura que necessita desse jovem que o humilha pra ter o dinheiro de um público jovem que o ignora. São seis pessoas sérias tentando trabalhar e apenas o clássico beócio em versão “esta década” atrapalhando e, por Deus, que poder é esse que deram pra ele só porque ele crê que o seu colágeno é uma gosma de superioridade e a sua estupidez opiniosa é o último grito da moda em termos de sabedoria enigmática e o seu hedonismo presumido é um jeito de dizer que nunca antes dele alguém jamais soube viver?

Ele é tão clichê que poderia ser protagonista do roteiro ruim que, por profissão (qual?), diz combater. Ele não melhora estruturas de roteiro, ele apenas aniquila qualquer palavra, qualquer intenção, qualquer convívio. Ele aprendeu que assim pode ter o melhor dos mundos: não trabalhar e, por isso mesmo, ser rapidamente alçado ao cargo de guru (e bem pago para isso). Ah, garoto com posts vazios sobre delírio comunista, você é só mais um discípulo de Olavo de Carvalho, um elite-tosca-blasé-preguiçoso-sem-conteúdo em pele de esquerdista de Instagram, um esquerdolavo, um demolidor da vida porque entendeu muito cedo que não faria nada de útil com a sua. Mas até pra destruir alguém, aprende aqui com a tia.

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