Tom Farias

Jornalista e escritor, é autor de "Carolina, uma Biografia" e do romance "Toda Fúria"

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Martinho da Vila conta causos em biografia romanceada da mãe

Obra é um mosaico de imagens e emoções que nos faz viajar no tempo

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Martinho da Vila surpreende não só por ser músico e cantor de grande talento e versatilidade. Faz algum tempo que ele também nos surpreende com outra arte: a de escrever, produzindo histórias longas e curtas, reais e imaginadas, através de crônicas, contos e romances, além de se aventurar pelo mundo infantojuvenil e pelo ensaio musical. Mas nunca deixa de falar de si e do mundo do samba, que é, há mais de 50 anos, sua maior diversão.

Na segunda-feira que passou (6), Martinho deu outra amostra de sua versatilidade: lançou o romance "Memórias de Teresa de Jesus", pela editora Malê, do Rio de Janeiro. O livro é, na verdade, uma reescritura de uma obra anterior, publicada por ele originalmente há alguns lustros e intitulada "Memórias Póstumas de Teresa de Jesus".

O título anterior lembra de longe "As Memórias Póstumas de Brás Cubas", publicado por Machado de Assis no ano de 1881. Porém, ao contrário do romance do carioca Machado, a obra do Martinho bibarrense (aquele que nasce na cidade de Duas Barras) é uma biografia romanceada, contando a história e os "causos" da família Ferreira, com destaque para os primórdios de sua formação na cidade interiorana, encrustada entre as serranas Nova Friburgo e Cantagalo.

Martinho é um historiador nato, que lança mão da ficção para narrar as trajetórias de sua vida, do seu gosto musical e de sua família. Não deixa de comentar as suas andanças –o sucesso de sua jornada pelo mundo da música, suas raízes, com viés na ancestralidade, e seus amores.

Teresa de Jesus, mãe de Martinho da Vila e tema de seu novo livro
Teresa de Jesus, mãe de Martinho da Vila e tema de seu novo livro - Reprodução

Ele já tinha feito algo parecido em "Barras, Vilas & Amores", de 2017, publicado pela Editora Sesi, embora o melhor momento de sua carreira literária se dê pelas páginas de "A Serra do Rola-Moça" e "Joana e Joanes, Um Romance Fluminense", este também editado em Portugal.

Com habilidade e coerência narrativa, que carrega alta dose de sentimento nos seus escritos, já bastante conhecido nas festejadas letras de suas canções e sambas, Martinho constrói, através de pedaços de memórias, um mosaico de imagens e emoções que nos faz viajar no tempo, um tempo glorioso, repleto de simplicidade e de valores familiares, que andam se perdendo mundo afora nessa era cada vez mais digital e de inteligência artificial.

No novo romance, por assim dizer, Martinho refunda essa lógica temporal, nos guiando pelas mãos de sua personagem-mãe –Dona Teresa—, protagonista da história, que nos liga o presente ao passado, e vice-versa.

Martinho tem o dom de contador de longas histórias, hábito herdado da convivência maternal, herança de um matriarcado com origens africanas e ameríndias. É da mãe Teresa que adquire essa fama de conversador. Dona Teresa de Jesus gostava de "puxar conversa", de prosear —e o filho Martinho, de ouvir, com a atenção e o respeito de quem está diante de um griô, um "mais velho".

Ou seja, "Memórias de Teresa de Jesus" nos oferece uma grande oportunidade de conhecer a literatura —hoje bastante amadurecida– de um Martinho da Vila escritor.

Capa do livro 'Memóris de Teresa de Jesus', de Martinho da Vila
Capa do livro 'Memórias de Teresa de Jesus', de Martinho da Vila - Reprodução

No caso desse novo livro, baseado em fatos reais, a história da própria família, através da mãe, Martinho parece conversar com o leitor, levando-o a revisitar fatos históricos do passado, desde sua cidade de origem, de onde saiu menino, até entrincheirar-se entre o Morro dos Pretos Forros e a Boca do Mato.

Se Dona Teresa tem história para contar, e "Memórias de Teresa de Jesus" nos recomenda que sim, Martinho José Ferreira –ou grandemente denominado Martinho da Vila– também não fica para trás.

Fato é que por intermédio da história da mãe o popular artista da música, igualmente autor traduzido, premiado e consagrado, insere suas próprias históricas, que por estradas sinuosas, íngremes, cheias de altos e baixos, o trouxe até os nossos dias.

Ler Martinho, portanto, é saborear também de sua genialidade por meio de sua escrita. É desse lugar que, indiscutivelmente, ele se coloca, aos 85 anos, como grande referência, no campo da arte e da ancestralidade.

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