Tom Farias

Jornalista e escritor, é autor de "Carolina, uma Biografia" e do romance "Toda Fúria"

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Tom Farias
Descrição de chapéu Livros

A triste saga de Euclides da Cunha, que escreveu sobre a vida dura do sertão

Biografia do escritor faz de Luís Cláudio Villafañe G. Santos um grande recuperador da memória euclidiana

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O escritor Euclides da Cunha não ficou para a história da literatura brasileira apenas como o autor de um dos mais importantes livros de sua geração —"Os Sertões", publicado em 1902. Ele também passou a ser uma de suas personalidades mais emblemáticas, ao ser assassinado no ano de 1909, após trocar tiros com Dilermando de Assis, jovem cadete do Exército e amante de sua mulher, Ana Emília da Cunha.

Não é de hoje que a trajetória literária e existencial de Euclides impacta minha imaginação. Aos 20 anos, li com certa avidez "Os Sertões", numa velha edição que pertenceu ao meu pai, datada de 1963 e fiquei impressionado com a sua escrita e a história do massacre de Belo Monte, na região de Canudos, aldeamento liderado por Antônio Conselheiro, no sertão da Bahia, no final do século 19.

A imagem de Euclides me impressionava também pelo seu brutal assassinato a tiros em 15 de agosto de 1909, no bairro da Piedade, zona norte do Rio de Janeiro, quando enfrentou, à época, sob a alegação de defesa da honra, Dilermando de Assis, tido por exímio atirador.

O escritor Euclides da Cunha, autor de 'Os Sertões' - Domínio Público

Estes dias, porém, me veio à mente cenas de Euclides e de "Os Sertões", quando li "Euclides da Cunha, uma Biografia", de autoria de Luís Cláudio Villafañe G. Santos.

Gosto muito de biografias e sou, como o leitor aqui já sabe, autor de algumas, sobre importantes homens e mulheres que engrandecem a vida brasileira.

Luís Cláudio trabalha com esmero para reconstituir a acidentada vida do escritor fluminense. Digo escritor porque —sendo engenheiro de profissão— foi a literatura que marcaria a breve vida do autor nascido em Cantagalo, no estado do Rio de Janeiro.

Eu tenho sido um fiel leitor de Euclides e de tudo que perpassa o seu universo artístico e intelectual. Faz alguns anos li "O Pêndulo de Euclides", romance cheio de indagações de Aleilton Fonseca e o belíssimo "Euclides da Cunha: Uma Poética do Espaço Brasileiro", catálogo organizado pela Fundação Biblioteca Nacional, pela passagem do seu centenário de morte.

No caso dessa nova biografia —editada no ano passado pela Todavia— o caso é bem outro. O pesquisador Luís Cláudio percorre com detalhamento e meticulosidade a vida de Euclides do nascimento à trágica morte.

Não é um livro novo sobre Euclides , mas é escrito com novidades estéticas, com uma linguagem e um novo olhar sobre fatos já descritos e arrolados em obras anteriores, como o livro escrito por Sylvio Rabello, intitulado "Euclides da Cunha", que também aprecio.

Mas agora percebemos um esforço do biógrafo de recolocar Euclides dentro de uma visão mais técnica (de engenheiro) e intelectual (de escritor) sobre o autor fluminense. Mas senti falta de um pouco mais de profundidade em dois assuntos primordiais: o Euclides poeta e o episódio de sua morte.

Poeta à feição parnasiana, Euclides era sonetista lírico e fescenino. Cabe destacar, nesse campo, o soneto que dedicou a Rodrigo Otávio, escrito no verso de uma fotografia, onde era retratado, e que diz nos últimos tercetos: "Amigo! tu terias com certeza/ A mais completa e insólita surpresa/ Notando —deste grupo bem no meio—/ Que o mais belo, o mais forte, o mais ardente/ Destes sujeitos é precisamente/ O mais triste, o mais pálido, o mais feio".

A morte de Euclides é outro fato que podia ser mais detalhado, por ser —além do livro do "engenheiro-letrado"— o mais relevante de sua história. O processo sobre seu assassinato é caudaloso –que conta com artigos de jornais, verdadeiros folhetins descritivos. Mas penso que cabia, para complementar o livro, três fotografias reveladoras: o corpo passado pela autópsia, da casa onde ocorreu o crime e a imagem da viúva, durante e após o processo que julgou e absolveu Dilermando.

Por último um julgamento melhor dos escritos do matador do escritor e os dilemas de sua vida –Dilermando morreu de infarto, em São Paulo, em 1951, seis meses depois de Ana– e seu sepultamento, no Cemitério do Santíssimo Sacramento, foi negado, devido seu envolvimento na morte de Euclides.

Na minha candidatura em 2021 à Academia Carioca de Letras, tive o voto de Dirce de Assis Cavalcanti, filha de Dilermando, que me mimoseou com um breve relato sobre sua vida com o pai e a leitura crítica que este fez –que também senti falta na biografia, com detalhes– sobre "Os Sertões", feita na cadeia e anos depois como defesa publicada no livro "A Tragédia da Piedade".

Embora destaque estes senões, "Euclides da Cunha, Uma Biografia" faz de Luís Cláudio Villafañe G. Santos um grande recuperador da memória euclidiana no cenário da literatura brasileira.

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