Tostão

Cronista esportivo, participou como jogador das Copas de 1966 e 1970. É formado em medicina.

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Talento é também a capacidade de tornar simples o que é complexo

Não se pode confundir o talento e a simplicidade com o vulgar

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Antes de fazer meu curso de psicanálise achava que não entenderia as ideias de Freud, porque imaginava que eram muito complexas e que eu não tinha conhecimento para tanto. Com a ajuda do professor, fiquei surpreso, pela clareza dos textos, que diziam o que eu observava no mundo. Compreendi que até os mistérios da alma tinham uma lógica. Freud colocou ordem no caos.

Quando atuei ao lado de Pelé, percebi que uma de suas principais qualidades era tornar simples o que era complexo. Com poucos movimentos e gestos, Pelé chegava ao gol com facilidade, além de ter uma extraordinária técnica.

Quando me tornei colunista, crítico, voltei no tempo e tentei descobrir algo que, dentro de campo, Pelé tivesse dificuldades, que não fosse excepcional. Não consegui.

Messi carrega a bola durante a final da Copa do Mundo contra a França
Messi carrega a bola durante a final da Copa do Mundo contra a França - Paul Childs - 18.dez.22/Reuters

O grande escritor Graciliano Ramos dizia que escrever é a arte de cortar palavras e que as palavras existem para dizer, e não para enfeitar.

O talento vai além da habilidade, da técnica, da criatividade, da fantasia e das qualidades físicas e emocionais. É também a capacidade de tornar simples o que é complexo.

O artilheiro, como Cano, precisa de um, no máximo dois toques na bola para fazer o gol. A bola não procura o artilheiro, como diz o chavão. É o artilheiro que sabe antes dos outros aonde a bola vai chegar.

Os neurocientistas falam que é uma inteligência cinestésica, espacial, do movimento. Em uma fração de segundos, o jogador mapeia o que está em sua volta e calcula os movimentos e a velocidade da bola, dos adversários e dos companheiros. Nada disso adianta se o jogador não tiver uma grande técnica para finalizar.

O clássico artilheiro não precisa do drible para marcar o gol, mas se ele souber também driblar, será ainda melhor, como o fenômeno Ronaldo e outros. Messi, assim como Pelé, usa o drible, sempre para frente, para achar o momento certo de finalizar com precisão.

Os grandes craques, especialmente os meio campistas, o cérebro e a alma de um time, jogam sem olhar para a bola. Enxergam melhor o que está à frente. Atuam como se fossem um drone, como se estivessem olhando a partida de cima e, ou, com um mega computador colocado no corpo. Fica mais fácil.

Os grandes defensores, como Thiago Silva, anteveem o passe e se antecipam aos adversários. Desarmam e já iniciam as jogadas ofensivas com um bom passe. Tudo parece simples. Os goleiros aprenderam a ficarem mais atentos, para chegar antes dos atacantes nas bolas lançadas nas costas dos zagueiros.

Não se pode confundir o talento, a simplicidade, a capacidade de tornar as coisas mais fáceis, com o vulgar, o comum nem com a falta de conhecimento e de visão crítica. A teoria, o que está escrito nos livros, é fundamental. A prática sem a teoria é uma grosseira simplificação.

A capacidade de, com poucos gestos e ações, escolher o momento certo de fazer as coisas é também uma virtude coletiva. Assim é o Palmeiras dirigido por Abel Ferreira. A equipe, mesmo quando não joga bem, faz as coisas certas. Não complica. Marca um gol e não deixa o adversário empatar, já que tem uma ótima defesa.

Nem sempre os melhores professores, profissionais com grandes conhecimentos teóricos, são os mais eficientes. É necessário também ser um ótimo observador, capaz de com poucos gestos, fazer as melhores escolhas, tornar simples o que é complexo.

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