Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Vinicius Torres Freire

Causou sensação a lembrança de que os doleiros presos na Operação Câmbio, Desligo tinham longa ficha corrida, uma capivara que vai pelo menos até o caso Banestado. Esse escândalo de evasão e lavagem de dezenas de bilhões ficou público em 1997. Era um rolo que talvez tenha começado em 1989.

Essas pessoas são reincidentes, contumazes ou vítimas de persistentes erros judiciais? Faz uns 20 anos que gente graúda dessa turma está fichada, embora famílias doleiras estejam no ramo do rolo desde 1960. São amigas da elite, conhecidas de festas. Nesta quinta de prisões, eram motivo de fofoca e chacrinha na finança paulistana.

A rede doleira foi oficialmente descoberta aos poucos, por meio do escândalo dos precatórios (1996), das contas CC5 do Banestado (1997), da Operação Macuco (2001), da CPI do Banestado (2003), da Operação Farol da Colina (2004) etc.

Alguns doleiros foram condenados a penas curtas no caso Banestado, convertidas em prestação de serviços comunitários e doação de cestas básicas para pobres. Pois é.

Incompetência, negligência de autoridades do governo do PSDB e a lentidão da Justiça facilitaram a prescrição dos crimes de muitos doleiros. Gracinhas e arreglos de PSDB e PT na CPI do Banestado produziram, afinal, um fiasco, sem relatórios conclusivos, apesar de várias revelações.

Os beneficiários maiores das remessas de dezenas de bilhões de dólares para os EUA e paraísos fiscais não foram revelados, menos ainda punidos. Suspeitava-se de grandes empresas, ricos, políticos, empreiteiras, igrejas, traficantes de drogas e armas etc., o cardápio de sempre.

Difícil que o esquema de corrupção doleira fosse desmontado, se era pequeno o risco de cadeia, se pode dizer. Mas risco de cadeia não basta.

Um exemplo óbvio. O mensalão começou a ser revelado em 2005. Em 2012, houve as condenações principais. Nesse mesmo ano, a ação da gangue dos Odebrecht estava no auge ou, pelo menos, o investimento da empreiteira em suborno ou financiamento ilegal de políticos chegava ao máximo.

Em 2014, com a Lava Jato nas ruas, a Odebrecht ainda gastava 1% de seu faturamento em corrupção.

Esse 1% era a média do que a empresa investira em crime, na década anterior, quando corriam os processos do mensalão.

A caçada das gangues está longe de terminar, decerto. Por exemplo, pouco sabemos da corrupção em cidades e estados, do Acre a São Paulo. Estados e municípios faziam metade do investimento do setor público até 2014, por aí. Onde estão condenações regionais de negociatas em aditivos, suborno, cartel?

Falta ainda, é claro, tirar a carcaça estatal da sala dos predadores, desmanchar o Estado em muitos setores, reorientá-lo para outros, em outros termos. Longo prazo. Falta saber o fim da história dos crimes: como o dinheiro fugia do país? Andando?

As brechas velhas e conhecidas para mandar dinheiro para o exterior começaram a ser cobertas a partir de 1996. Acabaram as contas CC5, um meio de não residentes no Brasil enviarem dinheiro para o exterior que se tornou um grande canal de sonegação, evasão e lavagem.

Mas sobreviveram esquisitices em agências de turismo, casas de câmbio, financeiras que negociavam cheques, no comércio exterior (fictício) etc. Onde está o rolo, agora?

Enfim, não se sabe como o dinheiro do petrolão e esquemas conexos nos anos petistas ia parar em bancos do exterior. Doleiros podem dar uma dica.

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.