Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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'Lula é o Salvador do Brasil?', pergunta mercado

Não é, mas Brasil barato e PT centrista devem render dinheiro, se diz

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"Is Lula Brazil’s Savior?", no original, é o título de um relatório publicado nesta semana pela consultoria internacional BCA, de matriz canadense, que orienta clientes sobre o que fazer com o dinheiro em mercados emergentes. Não, Lula não é.

Mas, para os estrategistas da BCA, dá para ganhar algum tutu se um Lula "centrista" se eleger presidente, dado além do mais o fato de que o "Brasil está barato". Isto é, na média, as ações estão com valor baixo, considerado o histórico e os retornos das empresas. Os títulos de dívida estão baratos, outro modo de dizer que as taxas de juros estão altas.

Para dar um exemplo mais "pop". A senhora e o senhor que se interessam aí pelo Tesouro Direto devem ter notado que há títulos do governo com vencimento em 2026 pagando 5,21% ao ano além da inflação; em 2035, 5,61% mais IPCA. Isso é uma vergonha, receita para governo e país irem à breca. Mas passemos.

Ex-presidente Luiz Inacio Lula da Silva em evento no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo - Carla Carniel 2.fev.22/REUTERS

O fato é que há gente razoável achando as taxas dos títulos de longo prazo vão cair (o preço dos títulos vai subir), oportunidade para uma boa tacada de especulação razoável. Em uma situação em que o descalabro financeiro (juros e dólar) era muito maior, foi o que gente esperta fez entre 2002, ano da eleição, e 2003, primeiro de Lula 1, enchendo as burras.

A baixa recente do preço do dólar e a entrada de dinheiros de não residentes ("estrangeiros") no mercado financeiro sugerem que a BCA não está sozinha nessa avaliação. Não está mesmo, se ouve em conversas reservadas, em seminários de gestores do dinheiro grosso e se lê em artigos que analistas de mercado publicam em jornais.

Há uma ondazinha favorável a emergentes em geral, mas o real foi a moeda que mais se valorizou de dezembro para fevereiro entre as 38 acompanhadas pelo FMI. Ainda assim, foi a que mais perdeu valor desde o início da epidemia (desde fevereiro de 2020) e a BCA não acredita em apreciação relevante do real.

Diga-se de passagem que, quanto menos demagogia demente o Congresso se dispuser a fazer, maiores as chances de segurar dólar e inflação. Nesta quarta-feira, deputados diziam ter ficado "espantados" com a reação ruim ao pacotaço de redução de impostos e aumento de dívida; que receberam mensagens de "o mercado" afirmando que o tiro demagógico sairia pela culatra ou daria em besteira maior.

Como Jair Bolsonaro tende a se tornar um "pato manco" ou estaria à beira de tomar café frio, para usar a metáfora nacional, os donos do dinheiro estariam prestando mais atenção ao que Lula vai ou promete fazer. Por ora, Lula promete conciliação e moderação. Quanto mais assim for, mais dinheiro entraria.

Não seria uma torrente, até porque os emergentes podem apanhar com a alta de taxas de juros nos EUA, para nem falar dos seus problemas domésticos. O Brasil, sua economia e sua política econômica vão mal. Mas, pelos próximos meses, seus ativos financeiros podem render mais do que as alternativas comparáveis, os países ditos emergentes. É só isso. É o argumento mais comum, um tédio resignado, iluminado ali e aqui pela possibilidade de ganhar algum dinheiro.

Considere-se o cenário da BCA, por exemplo. A perspectiva é de que a primeira metade do governo Lula 3 seja "moderada". Mas não haveria mudanças estruturais ("reformas") profundas que acelerassem crescimento e medidas bastantes a fim de controlar a dívida pública, ao menos as convencionais. Mais para o final do governo, Lula relaxaria e tentaria controlar o aumento da dívida com alguma variante do que se chama de "repressão financeira". As taxas de juros reais seriam baixas (também com inflação maior), o real se desvalorizaria e o Brasil continuaria meio que se debatendo na lama, mas com o nariz um tico acima do atoleiro.

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