Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Descrição de chapéu Auxílio Brasil

Lula vence jogo da PEC, classifica centrão e despreza cartão amarelo da dívida

Congresso aceita o grosso do que o PT queria, leva o seu e ignora problema

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De início, o governo eleito queria que a "PEC da Transição" autorizasse gastos adicionais de R$ 175 bilhões em relação ao projeto de Orçamento de 2023. Em dado momento, apareceu a ideia de permitir ainda despesas extras de R$ 23 bilhões, para investimentos, a depender do desempenho da arrecadação. O pacote seria então de R$ 198 bilhões; Luiz Inácio Lula da Silva chegou a dizer que seus valores não eram finais, mas não começaria uma negociação chutando baixo.

Por ora, juntando as tais possíveis despesas em investimento, deve-se aprovar um pacote de R$ 169 bilhões. É quase o valor inicial proposto pelo governo de transição. É o dobro do valor máximo estimado para que se evite um crescimento preocupante da dívida pública. Afora milagres.

Lula ganhou o jogo ou, digamos, nestes dias de Copa, que conseguiu a classificação com folga, mesmo cedendo um empate para o centrão, que também vai para a próxima fase. Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG) estão eleitos para comandar Câmara e Senado nos próximos dois anos.

Davi Alcolumbre, presidente da CCJ, e Alexandre Silveira, relator da PEC da Transição, durante discussão do texto nesta terça - Adriano Machado - Reuters

Lira disse a Lula que só haveria PEC se houvesse um acerto qualquer para manter ou compensar as emendas de relator, o dito "orçamento secreto", tanto faz que o Supremo derrube a atual aberração. Por ora, Lula arrumou maioria parlamentar para aprovar até emendas constitucionais, mas sujeito à boa vontade dos barões da emendinha, de Lira e companhia.

É preciso ver o formato final disso tudo, em detalhes, para saber dos arranjos que serão feitos com o centrão, dos pagamentos devidos pela incompetência atroz do governo de trevas (2019-2022) e outras mumunhas que aparecem em alíneas, incisos e parágrafos.

Dizia-se que o Congresso colocaria um limite nas pretensões de Lula 3. Pela mera aritmética, colocou. Mas R$ 30 bilhões a menos vão fazer apenas coceira nas projeções de aumento da dívida pública.

Não sabemos o que vai ser da arrecadação federal de 2023 (provavelmente maior do que a estimativa pessimista de agora) nem de PIB ou juros, sem o que fica difícil estimar o aumento da dívida pública. Mesmo na melhor das hipóteses, fica também difícil ver como não aumentar a carga tributária ou vender patrimônio a fim de evitar endividamento ainda mais daninho. Difícil acreditar em aumento de imposto e privatização

Sim, o Congresso deve limitar a dita "licença para gastar" (despesa além do teto) por dois anos, o que pode ser irrelevante por pelo menos dois motivos. Se houver regra fiscal que de fato contenha o crescimento sem limite da dívida, a autorização de despesa adicional da PEC pode não valer. Se não houver regra fiscal que funcione, vamos correr riscos muito sérios, tanto faz a duração da "licença".

Há ainda quem diga que se enfiou lá na PEC um artigo obrigando Lula a enviar ao Congresso, até 31 de agosto de 2023, lei "com objetivo de instituir regime fiscal sustentável para garantir a estabilidade macroeconômica do país e criar as condições adequadas ao crescimento socioeconômico". Isto é, uma nova regra de limitação de déficit e dívida.

Primeiro, dada essa redação, esse projeto pode ser qualquer coisa e nada. Segundo, se o presidente não enviar a tal lei, acontece o quê? Se o Congresso quiser, pode inventar um modo de pressionar Lula, a depender da força política e popular do governo. Mas esse artigo é para inglês ver.

Lula leva o seu pacote. Lira leva a reeleição e um esquema qualquer para que seu grupo mantenha o poder de decidir o que fazer de parte gorda do Orçamento que não tem destino obrigatório (cerca de 95%).

O problema fiscal foi levado para debaixo do tapete.

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