Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Antes de começar, confusão do governo de Milei aumenta

Presidente eleito desnomeia guru da dolarização, chama gente da casta e não tem plano

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São Paulo

A vitória de Javier Milei causou sensação pelo caráter caricato e lunático do presidente eleito da Argentina.

Em seguida, suscitou chutes analíticos sobre mudanças e configurações do "mapa ideológico" da América Latina, embora a América Latina não exista.

A seguir, vieram as especulações de como seriam as relações do governo dos vizinhos com o do Brasil e sobre o futuro do Mercosul, que existe, mas como múmia minúscula. Mais importante, porém, é saber o que vai sobrar da Argentina.

Antes de começar, governo do presidente eleito da Argentina, Javier Milei, já tem confusão - Agustin Marcarian/Reuters

Milei não sabe o que fazer da mera montagem de seu governo, que dirá do seu programa. Nos últimos dias, a dolarização parece ter se tornado um assunto distante. O resto do plano econômico é uma barafunda agora contraditória.

Recém-eleito, Milei e sua coalizão diziam que teriam os cargos principais dos ministérios. Milei também havia praticamente nomeado seu guru da dolarização, Emilio Ocampo, para o Banco Central. A turma de Mauricio Macri, ex-presidente (2015-19) e aliado de segundo turno, ficaria no segundo escalão, "técnico". A "casta" (políticos tradicionais e outros) ficaria de fora.

Ao final da primeira semana de presidente eleito e a 15 dias da posse, Milei desnomeou Ocampo e outros próximos. Patricia Bullrich, candidata derrotada da coalizão macrista, foi indicada para o Ministério da Segurança.

Peronistas não-kirchneristas ganharam cargos no primeiro escalão, entre outros tantos mais da "casta". Mesmo contando as promessas vagas de aliança, Milei não tem 30% das cadeiras da Câmara.

A maior bancada de ministros por ora é a dos ex-colegas de Milei na Corporación America, do empresário Eduardo Eurnekian, holding de aeroportos, energia, minas, agropecuária, construção civil etc.

Luis "Toto" Caputo, banqueiro de investimento que ocupou cargos maiores na equipe econômica de Macri, seria o ministro da Economia. Segundo relatos de jornalistas e consultores da finança, Caputo disse em encontro com empresários e banqueiros que o plano será de choque, mas orlultodoxo e sem surpresas.

Quase ao mesmo tempo, o gabinete de Milei soltava nota dizendo que o fechamento do BC (Banco Central) "não é um assunto negociável".

Fechar o BC é uma ideia exótica, para dizer o menos, embora não se saiba o que queira dizer. Funções de um BC podem ficar a cargo de uma agência reguladora, como a supervisão e a regulação de bancos, embora a fiscalização fique bem capenga, se feita assim à parte.

Mas quem faria política monetária, controle de inflação? Quer dizer, basicamente, determinação de taxas de juros por meio de venda e compra de títulos públicos, controlando em certa medida o excesso ou escassez de moeda? Quem socorreria bancos em crise de liquidez (o que exige criação de moeda, aliás)? O mercado? A gestão de moeda e crédito seria privatizada?

O problema principal de Milei é que o BCRA financia os déficits do governo, emitindo moeda na veia do Tesouro, e sempre o fará, acha. Muito libertário, de resto, acredita que a criação de moeda, a administração de seu valor e a gerência de riscos do sistema inteiro (de bancários a inflacionários) deveria caber aos próprios bancos ou similares, por conta e risco, sendo punidos em mercado por seus excessos.

É possível, mas é uma receita de crises recorrentes e explosivas.

Nem se pergunte de quem seria a responsabilidade de manter reservas internacionais. Como a discussão está posta em termos vagos e doidos, além de ser assunto complicado e comprido, não dá para entrar em detalhes.

O que se quer dizer aqui é que Milei em tese quer virar o sistema financeiro e econômico do avesso, em um país despencando do abismo, quando não sabe nem que rumo dar ao núcleo da sua equipe de governo.

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