Paróquias se mobilizam contra projeto de Covas de concessão de cemitérios

Igrejas da zona leste estimulam fiéis a assinar abaixo-assinado contra iniciativa

São Paulo

As paróquias do Belém (zona leste de São Paulo) estão mobilizando os fiéis da região contra a privatização dos 22 cemitérios municipais proposta pela gestão Bruno Covas (PSDB) e contra a cremação de ossadas do cemitério da Quarta Parada. Nas missas, padres têm pedido aos fiéis que participem de um abaixo-assinado.

Ossário do Cemitério da Quarta Parada, na zona leste de São Paulo - Rivaldo Gomes/Folhapress

O bispo auxiliar da Arquidiocese de São Paulo e vigário episcopal do Belém, dom Luiz Carlos Dias, enviou aos padres do bairro uma carta em que pede que os fiéis sejam avisados sobre a privatização e a cremação das ossadas. 

Em junho, a prefeitura conseguiu a autorização da Justiça para cremar 1.600 ossadas do Quarta Parada. Já a concessão está na fase em que a gestão recebeu estudos para definir como será a licitação.

“Uma avaliação isenta acerca das privatizações ocorridas não pode deixar de reconhecer que este processo submete os serviços públicos à lógica do lucro e do mercado”, diz dom Luiz, no texto.

Segundo ele, se os serviços dos cemitérios forem privatizados, haverá “custos pesados e restritivos à maior parte da população”.

Com relação às ossadas, ele afirma que a cremação vai “sepultar a esperança de famílias que ainda têm expectativa de solucionar o desaparecimento de entes queridos”, além de ser “um desrespeito aos restos mortais de uma pessoa”.

Ao final, ele pede que os padres incentivem os fiéis a “firmarem o manifesto contra este projeto”. Nas missas, os fiéis são orientados a levar para casa cópias do abaixo-assinado, para obter mais adesões.

A Arquidiocese de São Paulo afirmou em nota que o abaixo-assinado não é uma iniciativa dela. “Trata-se de mobilização de paróquias da Região Episcopal Belém, em torno da proposta específica de privatização do cemitério da Quarta Parada. O assunto não foi debatido no âmbito arquidiocesano”, disse.

A gestão Bruno Covas (PSDB) não comentou a iniciativa das paróquias. Em nota, afirmou que o procedimento de cremação das ossadas “não é inédito, tendo sido feito pela última vez em 2005 no Quarta Parada”.

Cemitério da Quarta Parada, na zona leste de São Paulo - Rivaldo Gomes/Folhapress

A prefeitura disse ainda que recebeu estudos de seis grupos interessados na concessão dos cemitérios. A partir deles, deve ser lançado o edital de licitação. “Vale ressaltar ainda é preciso autorização legislativa. O projeto de lei deve ser encaminhado em breve para a Câmara.” 

HISTÓRICO

O historiador Luís Soares de Camargo, doutor em história social pela PUC-SP, afirma que a relação da Igreja Católica com os cemitérios é antiga. “Os cemitérios de todo o Brasil eram administrados pela igreja. Era uma prática comum que fossem construídos dentro ou ao lado das igrejas”, conta.

Os católicos acreditavam que isso os aproximava dos santos e auxiliava a entrada da alma no paraíso. A partir de 1889, com a Proclamação da República, os cemitérios da capital paulista passaram a ser construídos pelo poder público, após mais de 30 anos de “briga” entre a Câmara Municipal e a igreja.

“O movimento de proibir os sepultamentos dentro das igrejas e a construção de mais cemitérios no modelo católico tinha a ver com higiene e saúde”, diz o historiador. “A manipulação dos restos mortais no interior das igrejas produzia miasmas (mau cheiro), tidos como a grande causa das doenças no período”, conta Camargo.

Foi assim que, em 1858, foi construído o cemitério da Consolação (região central), o primeiro administrado pela prefeitura. “Com o tempo, os cemitérios católicos, que estavam proibidos de receberem mais corpos, foram desaparecendo, sendo demolidos”, afirma.

Covas defende concessão dos cemitérios 

O prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), defendeu nesta quarta (11) a concessão dos 22 cemitérios da cidade, mais o crematório da Vila Alpina, à iniciativa privada.

Segundo Covas, o município reconheceu que não consegue oferecer serviço de qualidade. “Isso será um avanço na administração pública."

O modelo, diz Covas, não foi definido. Há a possibilidade de ser concessão ou privatização, em lotes ou conjuntamente. “Estamos estudando a melhor proposta para enviar à Câmara o mais rápido possível”, acrescentou.

O prefeito disse que não vê desrespeito.Sobre a mobilização no Belém, disse que “fiéis podem ver outras cidades que privatizaram, que não existe problema nessa proposta.”

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