Travada desde 2011, reforma do Copan deverá ser retomada em novembro

Impasse atual diz respeito às pastilhas que revestem o prédio tombado, que não são mais fabricadas

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Restauro do Edifício Copan. Detalhe da tela de proteção dos últimos andares do Edifício Copan, que iniciou obra de restauração em 2011

Restauro do Edifício Copan. Detalhe da tela de proteção dos últimos andares do Edifício Copan, que iniciou obra de restauração em 2011 17.out.2019 - Eduardo Knapp/Folhapress

São Paulo

Há quase oito anos, 5.000 habitantes do centro de São Paulo têm sua vista obscurecida por uma névoa.
Era dezembro de 2011 quando o Conpresp, conselho municipal de preservação do patrimônio, autorizou a instalação de tela e bandeja de proteção na fachada principal do Edifício Copan, evitando acidentes pelo descolamento de pastilhas do revestimento.

A anuência era necessária porque o edifício projetado por Oscar Niemeyer tinha, desde 1992, seu processo de tombamento em análise —a medida foi efetivada em 2012.

De lá para cá, a demora no restauro somou-se às estatísticas colossais do prédio, uma estrutura sinuosa que impera sobre a av. Ipiranga, com 1.160 apartamentos dispostos em 32 andares e 80 lojas no térreo. 
Espera-se, contudo, que até o fim do mês a questão clareie. 

É quando vence o prazo, estabelecido em reunião do Conpresp para que o condomínio apresente a empresa responsável pelo projeto e pela execução do restauro.

Com dimensões sem par entre os prédios da cidade na época —e, por muito tempo em, todo o país, com seus 115 mil m² de área—, o Copan já nasceu complicado.

O projeto iniciado no começo anos 1950 esteve em obras até 1972, quando finalizaram-se os acabamentos, com parte dos apartamentos já habitados desde 1962, como conta Carlos Lemos, colaborador de Niemeyer, no livro “A História do Edifício Copan”. 

Restauro do Edifício Copan. Vista  aérea do  Edifício Copan, no centro de São Paulo
Restauro do Edifício Copan. Vista aérea do Edifício Copan, no centro de São Paulo - 17.out.2019 - Eduardo Knapp/Folhapress

Durante a obra, o projeto mudou de incorporador e sofreu modificações. A complexidade de gerir um edifício onde vive mais gente do que em 1.253 municípios brasileiros pode explicar, em parte, o passo lento do restauro, arrisca Eduardo Ferroni.

“As pessoas estão acostumadas a olhar o Copan um pouco como um objeto; vê-se o todo, não é uma somatória de gavetinhas”. Por isso, diz, não percebem que o prédio é “um organismo social” e “como é complexo o encaminhamento de uma questão como essa”. 

Morador do Copan há 18 anos, Ferroni tem a responsabilidade de encerrar o impasse sobre o restauro do edifício. 

Ao lado de Pablo Hereñú, também habitante do Copan e seu sócio no escritório H+F, ele se comprometeu a escolher a melhor entre três firmas especializadas em restauro de bens tombados, levando em conta o orçamento e o currículo de cada uma.

A apresentação de um projeto de restauro completo, com desenhos, diagnóstico técnico dos problemas e um memorial dos procedimentos a serem realizados, assinado por profissional competente, foi uma das diretrizes fixadas pelo Conpresp em 2011, ao autorizar que o edifício fosse embalado. A administração do Copan fez estudos, mas não detalhou as soluções. 

Muito tempo se gastou na discussão sobre o tipo de pastilhas a usar. As originais, cerâmicas, não são mais fabricadas nas mesmas especificações. As propostas pelo condomínio, de vidro, tinham aspecto diferente e ficariam visíveis se aplicadas em lacunas.

As empenas —laterais que unem as duas fachadas curvilíneas— estão desde 2018 sem o revestimento. No seu lugar, foram refeitas duas camadas de massa, sobre a qual as novas peças deverão ser aplicadas.

Em 2011, o Conpresp determinou que as pastilhas descoladas fossem, após a retirada, armazenadas para possível reaproveitamento na obra. 

Indagado sobre se as conservou, o síndico do Copan, Affonso Celso Prazeres de Oliveira diz que “lógico que não”. Morador do prédio há 56 anos e seu administrador há 26, Oliveira diz que mais de 20% das peças já haviam caído e teria sido inútil o esforço. “Era impossível” atender à determinação, afirma.

“Você não tem o parecer do Falcão Bauer, que me manda retirar tudo”, continua. A empresa Falcão Bauer, especializada em laudos de engenharia, foi uma das que fez os estudos da situação do prédio. 
“Tudo” são cerca de 46 mil metros quadrados de superfície pastilhada. A estimativa, a ser atualizada, era que a obra custaria R$ 23 milhões.

Passeando pelo edifício, Oliveira, 80, mostra o que tem feito pelo prédio na sua longa gestão. De fato, o interior do Copan é limpo e conservado. Cinco oficinas de marcenaria e serralheria, localizadas no subsolo, fazem reparos. 

Não basta, porém, a dedicação cotidiana que qualquer prédio exige. “Todos os prédios, tombados ou não, precisam de manutenção. Quando se fala de prédios que têm uma significação especial na cidade, esse cuidado é compartilhado com o poder público”, resume Raquel Schenkman.

A arquiteta é diretora do Departamento do Patrimônio Histórico (DPH), corpo técnico da prefeitura que subsidia o trabalho do Conpresp. Ela diz que, ao longo dos anos, nenhuma das análises trazidas pelo Copan justificava a retirada total das pastilhas, o que feriria um dos princípios básicos de qualquer restauro, o da mínima intervenção.

Em sua opinião, talvez tenha existido incompreensão da gravidade do problema. Para ela, faltava que o Conpresp desse um “não” ao Copan. 

Em 16 de setembro, o “não” veio. Na ocasião, o órgão recusou o último estudo apresentado pelo edifício, encomendado à arquiteta Valéria Bomfim.

Mestre pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP com uma dissertação sobre a conservação das fachadas do Copan, ela apresentou um parecer em junho.

Este era limitado à fachada norte, contrariando o pedido original do órgão, o que resultou na negativa —e, além disso, numa ameaça de multa ao condomínio, se duas semanas depois, na reunião seguinte, não fosse dada uma posição mais satisfatória.

Nem Bomfim, nem Oliveira estavam lá no dia 16. Moradores do Copan presentes, como registra a ata, se queixaram de que também para eles a situação era nebulosa e se comprometeram a conversar com o síndico.

Uma reunião extraordinária do conselho levou à contratação do H+F para organizar a licitação. 
A empresa que vencer a concorrência do Copan tem um longo trabalho pela frente, e ele não se limita às pastilhas.

Espera-se que a firma atualize e complete o diagnóstico dos problemas do edifício; monte um plano de ação, fixando as prioridades da obra; detalhe o que deve ser feito na fachada norte —a dos quebra-sóis— e nas laterais do edifício; e, por fim, estabeleça um plano também para os demais elementos a restaurar.

Destes, o aspecto mais evidente é a fachada sul (a parte posterior da onda do Copan, voltada para o miolo da quadra). Embora menos visível — corresponde às áreas de serviço das unidades— ela está na mira do Conpresp. 

Muitos moradores quiseram aproveitar o espaço para outras finalidades e as modificações se refletem na fachada, com trocas de caixilho e retiradas de elementos originais.

Segundo Raquel Schenkman, em geral os tombamentos não estabelecem regras para interior de apartamento. O que não significa que “cada um pode trocar sua janela do jeito que bem entender”.

Para a arquiteta, moradores que fizeram obras que interferiram na fachada após o tombamento, sem anuência, agiram contrariamente à lei. 

“A gente orienta que quem não mudou até agora não mude”. Mas, frisa, “cabe ao condomínio impor a mudança aos condôminos; não é o órgão do patrimônio que vai obrigar”.

Schenkman espera que, desta vez, as partes cheguem a acordo. O que todo do mundo quer, diz, é que o Copan “fique num bom estado de conservação e possa exercer esse sentido simbólico e referencial que tem na paisagem”.

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