Homens assumem tarefas domésticas na pandemia, mas mulheres ficam sobrecarregadas

Quase metade deles diz que vai manter rotina de cuidados com a casa após crise

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Danae Stephan
São Paulo

Durante a pandemia da Covid-19, muitos homens tiveram que arregaçar as mangas e se aventurar em uma seara histórica e culturalmente reservada às mulheres: a das tarefas domésticas.

De acordo com pesquisa Datafolha realizada entre 2 e 6 de julho com 700 moradores da cidade de São Paulo, 56% dos entrevistados do sexo masculino tiveram que aumentar sua colaboração dentro de casa.

E 47% deles passaram a cozinhar mais —22% declararam que não cozinhavam antes da pandemia, contra 4% de mulheres.

O problema é que, entre elas, esse número é ainda maior: 63% tiveram aumento de tarefas em casa e 55% estão cozinhando mais.

Ou seja, ainda que se reconheça os esforços deles, a desigualdade aumentou ainda mais durante o isolamento.

De acordo com pesquisa de 2019 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), mulheres que trabalhavam fora de casa dedicavam 8,2 horas por semana a mais a tarefas domésticas que homens também ocupados.

Hoje, esse número chega a 12 horas, segundo estudo do Boston Consulting Group em países europeus.
A boa notícia é que, uma vez que assumam mais tarefas domésticas, mesmo que por um período curto de tempo, esses homens tendem a manter esse comportamento a longo prazo.

Entre os entrevistados da pesquisa Datafolha, 46% dos homens declararam que pretendem continuar a executar as tarefas depois da quarentena, enquanto 38% acreditam que a carga deve diminuir e 8% acham que ela irá aumentar.

“As coisas não mudam da noite para o dia, mas um passinho por vez”, afirma a psicóloga Daniela de Oliveira, do Ambulatório de Medicina e Estilo de Vida do Hospital das Clínicas de São Paulo.

“Mesmo que seja só colocar a louça dentro da máquina de lavar, já é um avanço para um cara que não colaborava em nada. Depois que ele conseguir sustentar a tarefa durante duas semanas, pode ser inserido em mais uma atividade”, afirma Oliveira.

É dessa forma que a designer de joias Rita Abrahão, 58, está encarando a situação.

Com a pandemia, ela dispensou a faxineira semanal e assumiu todo o trabalho da casa, que divide com o marido, Eron, 58, e os filhos Demétrio, 27, e Dora, 24.

“Demorou para eu perceber que estava sobrecarregada, e foi minha filha quem botou os pingos nos ‘is’ e fez uma distribuição de tarefas”, diz Rita.

A comida ficou por conta das mulheres, enquanto os homens são responsáveis por lavar a louça. “É pouco, mas já é um avanço”, afirma Rita.

Seu marido sabe que poderia fazer mais. “Mas ela [Rita] é muito exigente, gosta que as coisas sejam feitas do jeito dela e se irrita com qualquer sujeirinha. Se quiser ganhar esse espaço, vou ter que invadir uma área, o que talvez torne as coisas ainda piores”, diz Eron.

As mulheres precisam aprender a conviver com a diversidade dentro da própria casa, afirma a psicóloga Daniela de Oliveira. “Algumas mulheres não deixam nem os filhos guardarem os próprios brinquedos, porque não vão fazer do jeito delas”, diz.

Quanto aos homens, avisa, não estamos mais em uma fase em que eles “ajudam”. “É preciso compartilhar. Estamos falando de companheirismo, de divisão.”

Casais que já dividiam as tarefas antes da pandemia estão lidando melhor com o aumento de tarefas domésticas.

Os empresários Fernando Eguchi, 43, e Cybele Erika Novo, 42, viram a quantidade de trabalho dobrar depois de mudar de uma casa de 145 metros quadrados para uma de 433, em fevereiro deste ano.

Com o trabalho no ramo de bufês paralisado pela pandemia e sem a ajuda de faxineira, estão dando conta de tudo.

“Desde pequeno ajudava a minha mãe na cozinha, é o que mais gosto de fazer. Já a Cybele é maníaca por limpeza, então essa parte fica com ela”, afirma Fernando.


Os planos pós-quarentena incluíam uma faxineira semanal e alguém para cuidar do jardim e da piscina.

Nestes meses de isolamento social, entretanto, o casal percebeu que a ajuda com a área externa era dispensável.

“Encaramos a rotina de cuidados com a casa com leveza. Não é obrigação, é prazer cuidar do espaço que conquistamos”, afirma Cybele.

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