Grupo pede que estátua de Carolina Maria de Jesus seja instalada em praça paulistana

Prefeitura planeja instalar obra que homenageia autora de 'Quarto de Despejo' em parque em Parelheiros

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Jessica Bernardo
São Paulo | Agência Mural

Um manifesto criado por familiares da escritora Carolina Maria de Jesus, ao lado de moradores e coletivos de Parelheiros, na zona sul de São Paulo, tem movimentado personalidades e políticos nas redes sociais. ​

O grupo quer que a prefeitura mude o local de instalação da estátua que vai homenagear a autora de "Quarto de Despejo". A reivindicação é para que seja na praça Júlio César de Campos, no centro do bairro, e não no Parque Linear Parelheiros.

"Queremos Carolina na sala de visitas", cita o manifesto, que já coleciona mais de 2.000 assinaturas e tem o apoio de nomes como o ativista e professor Douglas Belchior, a atriz Drica Moraes e a poeta Maria Vilani.

Joziane Soares de Sousa, uma das mobilizadoras para que a estátua da escritora Carolina Maria de Jesus tenha um local adequado, mostra a praça Júlio César de Campos
Joziane Soares de Sousa, uma das mobilizadoras para que a estátua da escritora Carolina Maria de Jesus seja instalada na praça Júlio César de Campos, em Parelheiros, na zona sul paulistana - Danilo Verpa/Folhapress

A escultura foi encomendada pela prefeitura em agosto do ano passado, depois que o incêndio na estátua do bandeirante Borba Gato, em Santo Amaro, intensificou os debates sobre a falta de monumentos de personalidades negras na cidade. Outros quatro monumentos de outras personalidades foram prometidos na mesma época.

Com previsão de inauguração para março deste ano, a homenagem a Carolina tem o local de destino questionado por moradores do bairro e familiares da escritora, que querem que a escultura possa ser vista por mais pessoas.

"O Parque Linear é de pouca visualização, está atrás do CEU Parelheiros. Ele não fica nem na avenida", afirma Vera Eunice de Jesus, 68, filha caçula de Carolina.

Por outro lado, segundo Vera, a praça Júlio César de Campos, além de ficar em uma das principais vias de acesso ao distrito, tem relação direta com a história da escritora. "Ali nós íamos nas festas de aniversário de Parelheiros, no cinema mudo. Minha mãe me entregou o diploma do quarto ano ali".

Carolina Maria de Jesus viveu em Parelheiros durante 20 anos, em um sítio hoje preservado pela filha. Vera Eunice diz que a mãe era apaixonada pelo bairro. "Carolina amou demais Parelheiros. Em Parelheiros, ela encontrou tranquilidade. A maioria dos [textos] inéditos ela escreveu embaixo das árvores desse sítio."

O endereço reivindicado por Vera para a instalação da estátua é caminho para quem mora em Embu-Guaçu, cidade da Grande São Paulo onde Carolina foi enterrada, e para a população de bairros como Marsilac e Vargem Grande. A praça é também o marco histórico da região e faz alusão ao centenário da Paróquia Santa Cruz.

A secretária municipal de Cultura, Aline Torres, diz que soube do manifesto na segunda (21) e que o tema seria discutido em reunião na manhã desta sexta (25). Segundo ela, a pasta tem uma reserva financeira para a instalação no parque, e a gestão precisa estudar o impacto de uma possível mudança.

Torres afirma ainda que no Parque Linear a estátua estaria mais segura, já que o local é vigiado 24 horas por dia, além de ser um espaço simbólico porque fica próximo a um ponto de leitura que leva o nome da escritora.

Segundo a gestão, a escolha pelo parque também levou em consideração diálogos com movimentos sociais do bairro e a opinião da família da autora, que só teria apontado interesse pela praça depois de uma visita técnica feita no parque no começo deste ano.

O debate sobre o tema chegou à Câmara Municipal de São Paulo. A vereadora Erika Hilton (PSOL) diz que tem tentado uma solução com a Secretaria Municipal de Cultura. "Estamos em diálogo com os responsáveis na prefeitura para ver qual a viabilidade de que a estátua seja instalada de acordo com o que reivindicam os movimentos e os familiares da Carolina", diz ela.

O monumento será o primeiro em homenagem a Carolina em todo o mundo. A produtora cultural Keila Pereira, 25, uma das articuladoras do manifesto, defende que a escultura precisa estar no lugar mais visível do bairro.

"Todo mundo que mora em Parelheiros passa pela praça central e é ali que a gente quer que a Carolina esteja, à vista de toda a população".

Moradora de Parelheiros, a escritora Joziane Soares de Souza, 39, afirma que a presença da estátua na praça servirá de incentivo para mulheres negras e periféricas. "Existe uma mulher que foi moradora de um território periférico e que conseguiu ser escritora."

Joziane diz que decidiu se tornar escritora depois de conhecer a obra de Carolina Maria de Jesus
Joziane diz que decidiu se tornar escritora depois de conhecer a obra de Carolina Maria de Jesus - Danilo Verpa/Folhapress

Hoje fã dos livros de Carolina, Joziane só conheceu a autora em 2014, na ocasião do centenário de aniversário dela. Depois de ter tido contato com a obra da escritora, ganhou coragem para divulgar os próprios textos.

Em 2020, lançou a primeira publicação, a zine "(a)mar", e em 2021 foi uma das mulheres que participaram do livro "Carolinas: a Nova Geração de Escritoras Negras Brasileiras". "Talvez, se eu tivesse conhecido Carolina na adolescência, eu poderia ter me imaginado escritora antes", conta.

Os coletivos estão organizando um protesto na praça Júlio César de Campos para este domingo (27).

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