Médica incorpora 'Lupita Glamurosa' e humaniza atendimentos no litoral de SP

Sandra Lopez, que é colombiana, atua no Guarujá e em Mongaguá; em seu papel, ela fala portunhol, gosta de Shakira e veste roupas coloridas

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São Paulo

Pacientes de hospitais públicos do Guarujá e Mongaguá, no litoral paulista, são surpreendidos por uma espécie de princesa loira usando máscara, envolta por um vestido amarelo e uma coroa da mesma cor vibrante. Ela entra na enfermaria fazendo brincadeiras em portunhol (mistura de português e espanhol), dançando e tocando músicas latinas, como as da cantora Shakira.

A mulher que leva sua potência a prontos-socorros e a pessoas internadas é Lupita Glamurosa, personagem criada há três anos pela médica colombiana Sandra Lopez para proporcionar um atendimento mais acolhedor, trabalho que ela realiza fora do seu expediente.

"A Lupita é uma maneira de mostrar que é possível fazer medicina humanizada. Ela prova que com alegria você mexe com o emocional e tem resultados na parte clínica. Funciona como uma espécie de programação neurolinguística", afirma Sandra, com um carregado sotaque espanhol.

Médica colombiana usa vestido com uma saia como véu (que ela segura nas mãos), máscara e uma coroa, tudo amarelo; o fundo tem três girassóis falsos à esquerda e outros três à direita, colados na parede
A médica colombiana Sandra Lopez como Lupita Glamurosa no CAPs 3 (Centro de Atenção Psicossocial), no Guarujá, litoral de São Paulo; a cor do figurino remete ao Setembro Amarelo - Karime Xavier/Folhapress

Sandra se divide em três especialidades: ginecologia obstétrica, pediatria e clínica geral. Seus jalecos são diferentes, coloridos e desenhados por ela própria, assim como seus figurinos.

Com o avental, ela costuma trabalhar nos hospitais e, depois das visitas médicas, sugere ao paciente uma brincadeira rápida e logo encarna seu papel.

"Até as colegas enfermeiras interagem e dançam, deixando o astral bem divertido. Todo mundo se envolve e entra na onda da Lupita Glamurosa", diz a médica.

Mas quando termina o expediente e inicia seu trabalho voluntário em outros hospitais, CAPs (Centro de Atenção Psicossocial), lar para idosos, para crianças e até canis, Sandra coloca seu figurino de Lupita.

Ela se lembra de uma paciente que sofreu um derrame e não respondia aos tratamentos. "Coloquei canções latinas e ela demonstrou resposta ao som. A música é um instrumento muito poderoso, porque leva alegria", afirma.

As crianças também demonstram entusiasmo. "Elas ficam doidinhas, abraçam e querem brincar. Até me convidam para os seus aniversários. Quando posso, marco presença e faço homenagens."

A médica conta que sempre gostou de brincar com seus pacientes no pronto-socorro do hospital Vicente de Carvalho, no Guarujá. Mas sua personagem surgiu quando ela começou a interpretá-la em festas beneficentes.

"Para um desses festejos fiz um vestido com uma coroa. Foi aí que o figurino foi surgindo", afirma Sandra, que também apoia campanhas de saúde, como a do setembro amarelo (de prevenção ao suicídio).

Depois dessas celebrações, a médica costumava passar pelos hospitais e prontos-socorros caracterizada e as enfermeiras a chamavam de Lupita.

"O meu cabeleireiro viu e falou que a Lupita era glamorosa. Aí o nome da personagem pegou", explica a médica.

Para Ronaldo Aguiar, diretor artístico da ONG Doutores da Alegria, grupo de atores profissionais que leva a linguagem dos palhaços a hospitais públicos, uma personagem como Lupita Glamurosa dá um respiro tanto à equipe médica quanto aos acompanhantes.

"Essas pessoas têm que lidar com diagnósticos, com o psicólogo do paciente e com tudo que ele está vivendo ali dentro. Não tem nada mais lindo quando um ser humano está inteiro para o outro. O paciente também entra na brincadeira porque percebe que aquilo é verdadeiro", diz.

Aguiar avalia que a atitude de Sandra Lopez rompe com aquilo que foi estabelecido para ela como médica. "Ela mostra que também pode brincar. As pessoas geralmente olham o médico e enrijecem por ele ser aquela figura muito séria, e a Lupita quebra isso."

ROTINA DINÂMICA

Originária de Cali, na Colômbia, Sandra Lopez chegou ao Brasil há dez anos para fazer residência médica. Gostou tanto que por aqui ficou.

Ela se especializou em ginecologia obstetrícia e pediatria. Naturalizou-se brasileira e prestou concursos. Há sete anos, atua em hospitais públicos do Guarujá e de Mongaguá.

Sandra afirma trabalhar 12 horas por dia, e, às vezes, descansa aos domingos. "No plantão, surge todo tipo de atendimento. Infartados, acidentados, feridos graves que precisam de sutura. Na maternidade tem de curetagem a parto. É bem dinâmico."

Para o secretário municipal de Saúde, Luís Cláudio Sartori, a iniciativa é interessante. "Trata-se de uma médica voluntária que colabora com a humanização do atendimento, proporcionando momentos lúdicos a pessoas que estão mais sensíveis por vivenciaram algum tipo de tratamento de saúde."

Numa rotina tão dura, muitas vezes, a médica afirma que Lupita Glamurosa quer passar a seguinte mensagem: "A vida é uma festa viva, viva a vida, viva o amor". Esse é o lema dela, diz Sandra.

De acordo com o Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo), não há restrições para médicos realizarem atividades voluntárias semelhantes às de Sandra Lopez.

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