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Ministério Público do Trabalho pede R$ 80 milhões de indenização de Saul Klein

Ação aponta prática de tráfico de pessoas para a submissão a condições análogas às de escravo, com trabalhos de natureza sexual

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São Paulo

O Ministério Público do Trabalho em São Paulo ajuizou uma ação civil pública contra o empresário Saul Klein, 68, filho do fundador das Casas Bahia, Samuel Klein (1923-2014), após investigação apontar a suspeita da prática de tráfico de pessoas para a submissão a condições análogas às de escravo, com trabalhos de natureza sexual.

Considerando o patrimônio do empresário e seu poder econômico, o MPT afirma ter pleiteado indenização de R$ 80 milhões.

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O empresário Saul Klein na inauguração de uma boate, em São Paulo - Letícia Moreira - 13.nov.12/Folhapress

Segundo o advogado Álan Richard de Carvalho Bettini, a defesa de Klein soube da informação da ação civil pública por meio de jornalistas e diz que não recebeu qualquer tipo de notificação ou citação oficial. Por isso, afirma ser é impossível apresentar quaisquer esclarecimentos sobre o tema.

A defesa diz, porém, que, nas sete reclamações trabalhistas que pediam a condenação de Klein por prática de atos ilícitos, cinco foram julgadas totalmente improcedentes e duas ainda estão pendentes de julgamento.

Também há um inquérito policial contra o empresário, conduzido pela Delegacia de Defesa da Mulher de Barueri (Grande SP), que em abril pediu a prisão preventiva de Klein, que não foi acatada pela Justiça. O caso é mantido sob segredo de Justiça.

O inquérito policial apura crimes de organização criminosa, redução à condição análoga de escravo, tráfico de pessoas, estupro, estupro de vulnerável, favorecimento à prostituição, casa de prostituição e falsificação de documento público. Klein é acusado na polícia de estupro e aliciamento por 14 mulheres.

Na época do pedido de prisão, a defesa do empresário disse que que Saul Klein reafirmava que nunca havia cometido crime algum.

Na ação civil pública, ajuizada na 4ª Vara do Trabalho de Barueri, os procuradores do trabalho dizem que "o desprezo do réu pela dignidade das mulheres, sua autonomia, liberdade e saúde sexual viola o pacto social e normativo de respeito à condição humana".

"Necessário uma medida contundente de contenção e reparação por todas as práticas repugnantes aqui narradas, sob pena de o Poder Judiciário ser conivente com uma sociedade de mulheres abjetas, negociáveis e mercantilizadas", afirma trecho da ação, de acordo com os procuradores.

Segundo o MPT, a investigação teve início em 2020, após o recebimento de denúncias de estupro, tráfico de pessoas e favorecimento à prostituição praticado pelo réu, que mantinha uma organização criminosa bem estruturada que arregimentava e prometia trabalho como modelo a jovens e mulheres em vulnerabilidade.

"O aliciamento ocorria com a cooptação de jovens na faixa dos 18 anos e adolescentes com 16 ou 17 anos, em situação de vulnerabilidade econômica e social, que eram convidadas a participar de eventos como modelo para fazer 'presença vip', tirar fotos para campanhas de biquíni ou panfletagem e em seguida eram inseridas no esquema criminoso que visava à exploração sexual", afirma o Ministério Público, em nota.

"Diversas mulheres vieram de outros estados e de outras cidades do estado de São Paulo, evidenciando-se o tráfico de pessoas."

Ainda de acordo com o MTP, mulheres "eram seduzidas e persuadidas a participar de eventos no sítio do réu em Boituva [a 121 km de SP], ocasião em que passavam o final de semana e recebiam pagamento pelos serviços sexuais, que caso se negassem a realizar, eram punidas".

"Algumas vítimas relatam que ficavam mais de 24 horas trancadas num quarto com o réu, e eram dominadas sexualmente a qualquer hora do dia, mesmo enquanto dormiam, sem qualquer chance de resistência física ou moral", diz na nota o procurador do Trabalho Gustavo Accioly, que assina a a ação civil pública, juntamente com as procuradoras Tatiana Leal Bivar Simonetti e Christiane Vieira Nogueira.

"O que se combate aqui não é prostituição em si, já que se ela fosse exercida de forma livre, consentida e voluntária, não haveria ofensa à ordem jurídica. Combate-se o ato de se tirar proveito econômico indevido de pessoas forçadas física ou moralmente, mediante abuso, fraude ou engodo, a praticarem atos sexuais sob forte subjugação", afirma.

"Sob o viés da exploração laboral, o caso em questão se traduz em trabalho sexual involuntário, um ato complexo para tirar vantagem injusta do trabalho de uma pessoa."

Segundo o Ministério Público do Trabalho, a investigação concluiu também que depois de inseridas no sítio, as vítimas eram mantidas durante dias ou semanas sem liberdade de locomoção, pois não podiam sair, e ficavam sem qualquer contato com o mundo externo. O local era vigiado por seguranças armados 24 horas por dia.

Ainda de acordo com o MPT, a casa era cercada com muros altos e havia pessoas da confiança do empresário organizando todas as atividades. "Caso alguém pedisse para ir embora, era imediatamente negado", diz o procurador.

Na ação, os procuradores afirmam que os corpos das vítimas foram tratados como mercadoria ou moeda de troca para proveito dos exploradores, violando gravemente direitos humanos das vítimas, especialmente a liberdade, inclusive a sexual, e a dignidade.

O MPT pede também que a Justiça do Trabalho condene Klein a se abster de traficar pessoas, bem como agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa, utilizando-se de formas de coerção com o propósito de explorá-las sexualmente ou em condições de trabalho análoga a escravo, de submeter crianças e adolescentes à exploração sexual comercial, de violar a autodeterminação, liberdade e dignidade sexual de pessoas entre outras obrigações.

Para cada obrigação descumprida, o MPT pede o pagamento de multa em valor não inferior a R$ 200 mil, por infração e por trabalhador encontrado em situação irregular.

Os valores serão reversíveis ao FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) ou a outra destinação socialmente equivalente, se o MPT ganhar a ação.

Segundo a defesa, há a existência de processos em que foi demonstrado, não só o fato de o empresário figurar como vítima de um esquema de extorsão, "como que os responsáveis utilizaram de diversos meios ilícitos para atingirem seus objetivos, dentre eles a falsificação de documentos e assinatura imputada ao senhor Saul Klein, que foi submetida à perícia técnica".

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