Caso Daniel Alves inspira projetos de lei para proteger mulheres em estabelecimentos

Propostas visam garantir que vítimas de assédio sexual e agressão sejam rapidamente amparadas, como orienta o protocolo de Barcelona

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São Paulo

Diferentemente do que ocorre no Brasil com casos de assédio sexual, a acusação de estupro que pesa contra o jogador de futebol Daniel Alves, 39, chamou atenção por ter sido conduzida de forma rápida.

Denunciado por uma mulher de 23 anos, o jogador é investigado por suspeita de estuprar a jovem dentro da casa noturna Sutton, em Barcelona, no fim de 2022. Em menos de um mês, Alves foi encaminhado para a prisão preventiva.

Agora, o caso inspira projetos de lei no Brasil nas esferas municipais, estaduais e federal para garantir segurança às mulheres dentro de espaços privados, como boates, bares, restaurantes e casas de shows.

Daniel Alves é acusado de estuprar uma jovem de 23 anos em Barcelona. Ele nega.
Daniel Alves é acusado de estuprar uma jovem de 23 anos em Barcelona. Ele nega. - Lucas Figueiredo 16.nov.22/CBF

A celeridade na investigação está ligada à aplicação do protocolo "No Callem", que foi desenvolvido em 2018 e detalha como espaços privados devem prevenir e agir no caso de agressões dentro dos estabelecimentos.

Na cidade de São Paulo, por exemplo, foram protocolados dois projetos semelhantes na Câmara Municipal, uma da Banca Feminista do PSOL, na segunda-feira (30), e outro da vereadora Cris Monteiro (Novo), na terça.

A vereadora Silvia Ferraro afirma que é importante que a cidade com grande vida noturna tenha uma legislação para proteger as mulheres para que elas se sintam seguras em todos os lugares.

"Queremos evitar que assediadores escapem, e é o que acontece hoje. Se um espaço não está preparado, a vítima vai embora, e até ela fazer um boletim de ocorrência já passou tudo. Se o estabelecimento faz o encaminhamento da ocorrência, isso tem uma importância muito maior", diz.

O projeto prevê que o estabelecimento de lazer noturno preste acolhimento às mulheres vítimas de violência, com auxílio no encaminhamento a uma unidade de saúde, fornecimento de informações e imagens e comunicação imediata à autoridade policial.

O texto do projeto ainda diz que os estabelecimentos serão orientados a assegurar que a pessoa agredida receba cuidados e informações necessárias acerca dos possíveis encaminhamentos legais, além de expressar claramente rejeição à atitude do agressor, que deve ter os dados coletados para eventual denúncia.

Tanto o projeto de Ferraro quanto o de Monteiro preveem que os estabelecimentos que adotarem o protocolo terão um selo que certifique que estão preparados para agir no caso de assédios. Os protocolos não preveem obrigação para a implementação do protocolo. Uma vez aprovado, porém, elas acreditam os locais que aderirem às medidas serão os mais frequentados, pois serão onde mulheres se sentirão mais seguras.

"É bom para os negócios que o estabelecimento mostre que está preparado para detectar um assédio", afirma Cris Monteiro. Em seu projeto ela propõe que o espaço participe de um treinamento para isso.

Em âmbito estadual, a deputada Marina Helou (Rede) decidiu não propor uma nova lei, mas batalhar para a sanção de outra norma que foi aprovada no fim de 2022 na Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) e aguarda a sanção do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos).

O projeto de lei 370/2021 torna obrigatória a capacitação dos funcionários de bares, restaurantes, boates, clubes noturnos, casas de espetáculos para identificar e combater o assédio sexual e a cultura do estupro praticados contra as mulheres.

Ela diz ter receio de que os diversos projetos que estão sendo propostos devido ao caso do jogador Daniel Alves não sejam, de fato, aplicados. "A lei precisa ser efetiva para todo mundo, levando em consideração a realidade de mulheres da periferia. Não adianta que sirva para dez casas de elite em São Paulo", diz Helou.

O deputado distrital Gabriel Magno (PT) protocolou no Distrito Federal um projeto que altera uma lei de 2001 e inclui normas sobre o monitoramento de vídeo a fim de prevenir, principalmente, a violência contras as mulheres nos estabelecimentos.

"Essa medida é crucial, adequada e, no longo prazo, eficaz para a construção de um mundo mais seguro", escreveu Magno nas redes sociais.

No âmbito federal, ao menos quatro deputados protocolaram na Câmara projetos de lei inspirados no "No Callem". Uma das propostas é de Maria Arraes (Solidariedade-PE), que afirma que a ideia é que os estabelecimentos comerciais e de eventos sejam obrigados a instruir os colaboradores para acolher vítimas de forma humanizada.

O PL prevê que os locais sigam ao menos seis etapas caso tomem conhecimento de qualquer ocorrência de violência contra mulher. Entre os procedimentos está o acolhimento de forma humanizada e o direcionamento a um ambiente reservado em que a vítima esteja acompanhada de pessoas conhecidas ou de colaborador preparado para essa situação.

A deputada propõe ainda que a vítima seja orientada sobre seus direitos, receba atendimento médico e tenha garantia do acompanhamento para exame de corpo de delito. Por fim, o agressor precisa ser imediatamente localizado, e as imagens que possam ajuda na investigação devem ser preservadas.

O novo projeto também propõe a ampliar a abrangência da Lei do Minuto Seguinte, que garante o direito ao atendimento prioritário, obrigatório e gratuito nos estabelecimentos de saúde vinculados ao SUS, considerando como violência sexual qualquer ato não consentido.

Sônia Bomfim (PSOL-SP) propôs um projeto semelhante e afirmou pelo Instagram que a medida visa garantir a mesma abordagem do "No Callem" no Brasil, que prevê treinamento específico, vigilância, protocolos de como lidar com vítimas, agilidade na coleta de provas, preservação de evidências, ligação direta com autoridades policiais e ferramentas de prevenção.

Dandara Tonantzin (PT-MG) criou também um projeto que prevê que os estabelecimentos que aderirem ao protocolo tenham o selo "Não É Não" com validade de três anos. As ações previstas no caso de abuso sexual dentro dos locais preveem que uma funcionária, do sexo feminino, deve ser designada para prestar atenção à vítima.

O texto ainda define que a ação prioritária deve ser a atenção à vítima e não a acusação do crime ou do agressor. Entre a forma de prevenção, o documento indica que treinamentos periodícos devem ser conduzidos aos funcionários e a disponibilização de cartazes educativos que desestimulem a prática de crimes que atentem contra as mulheres.

A proposta apresentada por Duarte Jr (PSB-MA) também vai na linha do protocolo de Barcelona. Pelo Twitter, ele afirma que, apesar de o Código Penal estabelecer o feminicídio como crime hediondo, é importante que haja colaboração com as empresas da área do entretenimento para garantir os primeiros socorro e encaminhamento para áreas de saúde e segurança.

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