Lira costura acordo para política de armas com meio-termo entre medidas de Lula e Bolsonaro

Parlamentares defendem que governo ceda por não ter base sólida no Congresso

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Brasília

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), costura um acordo entre o governo e parlamentares da bancada de segurança para acabar com o impasse envolvendo as normas de política sobre armas no Brasil.

Pelas negociações em curso, as regras voltariam ao nível de 2018 —antes de o governo de Jair Bolsonaro (PL) flexibilizá-las.

Caso o Planalto aceite, o presidente da Câmara se comprometeria a não pautar os projetos de decreto legislativo que tornariam sem efeito o texto editado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 1º de janeiro.

Pelo acordo, um novo decreto traria normas que representariam um meio-termo entre o que vigorava no governo Bolsonaro e o que propôs o presidente Lula com a revogação das normas da gestão anterior.

O presidente da Câmara, Arthur Lira, e o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante encontro em Brasília
O presidente da Câmara, Arthur Lira, e o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante encontro em Brasília - Sergio Lima - 21.nov.22/AFP

Mesmo na bancada da bala há a avaliação de que a liberação promovida pelo ex-presidente foi excessiva, em especial pela falta de controle do destino final de armas e munições. Por outro lado, os parlamentares consideram que revogar todos os decretos também foi uma decisão absurda.

Eles defendem que o governo deve ceder porque ainda não tem uma base sólida no Congresso. Além disso, os projetos de decreto legislativo passariam facilmente nas duas Casas, o que seria uma derrota para a administração Lula.

Bolsonaro flexibilizou o arcabouço legal sobre as armas em diversas frentes. Antes dos decretos dele, por exemplo, o atirador desportivo era dividido em três níveis. O maior nível, aquele que participa de campeonatos nacionais, poderia comprar até 16 armas e 40 mil munições ao ano.

Com as mudanças no governo Bolsonaro, não houve mais a divisão por nível e qualquer um passou a poder comprar até 60 armas e 180 mil munições ao ano.

O decreto temporário do presidente Lula ainda não definiu a quantidade de armas que podem ser compradas pelo grupo.

No decreto negociado, parte dos deputados quer que seja dada permissão para uso das pistolas 9 mm, que eram consideradas de uso restrito antes de Bolsonaro.

Parlamentares da ala menos radical defenderam que a concessão de registro e a autorização para aquisição de armas para os CACs (colecionadores, atiradores desportivos e caçadores) passe para o comando da Polícia Federal. Na leitura de alguns, o Exército é falho ao fiscalizar esse grupo, que conta com 1,2 milhão de armas.

Na transição, a equipe do presidente Lula já havia sugerido a mudança.

Na visão de alguns parlamentares, o acordo seria bom para os dois lados. Isso porque as novas regras não ficariam tão duras e também a flexibilização não seria tão grande como no governo Bolsonaro.

Houve uma primeira conversa para apresentar algumas das demandas da bancada ao ministro Flávio Dino (Justiça e Segurança Pública) na última terça-feira (21). Ele iria levar o tema a Lula.

Uma nova rodada de conversas do ministro com os parlamentares da comissão de Segurança Pública da Câmara deve ocorrer na próxima terça-feira (28), já com respostas do governo federal.

Os parlamentares defendem ainda sete pontos, como a prorrogação da data limite para recadastramento, hoje prevista para terminar em 3 de abril. Eles pedem mais um mês de prazo.

Na avaliação dos parlamentares, o prazo foi muito curto e os sistemas online não estão conseguindo atender à demanda. Além disso, eles sugerem que a Polícia Civil ajude no recadastramento de armas de uso restrito, que precisam ser levadas à PF para o procedimento, já que o Estatuto do Desarmamento prevê a possibilidade de convênio com os estados.

Outro pleito foi a retomada da emissão de CRAFs (Certificados de Registro de Arma de Fogo) e de CRs (Certificados de Registros), que estão suspensos até a edição de um novo texto.

Eles argumentam que as regras estão sendo descumpridas. Segundo os deputados, o decreto de Lula só poderia barrar os certificados requisitados após 1º de janeiro, mas, na prática, os pedidos de dezembro (antes do governo petista) estariam sendo afetados.

Os parlamentares sugeriram também incluir um integrante da Câmara dos Deputados e um do Senado no grupo de trabalho do Ministério da Justiça que trata da regulamentação das armas.

Felippe Angeli, gerente do Instituto Sou da Paz, diz que é preciso aprimoramentos na política de armas em relação ao que vigorava em 2018, apesar de boa parte dos problemas terem surgido depois disso. Entre eles, acha importante a marcação de munições usadas pela sociedade civil.

"O governo precisa melhorar a articulação política sobre a segurança pública no Congresso. Mais uma vez a comissão é composta de pessoas mais radicais, policiais, cidadãos que defendem o populismo penal. Dessa forma, o governo precisa ficar cedendo sobre o tema", disse.

Ivan Marques, advogado e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, afirmou que voltar às regras de 2018 seria apenas corrigir os absurdos do governo Bolsonaro. No entanto, é preciso avançar porque o porte de trânsito para CACs já existia antes desse período e possibilitou que milhares de pessoas andassem armadas nas ruas, por exemplo.

"O Brasil de hoje é muito mais armado e muito mais radicalizado que em 2018, portanto é preciso avançar nos mecanismos de controle para além dos que já existiam se o Estado quiser retomar minimamente o controle das armas em circulação", avaliou.

"No caso de manter o rol de armas e calibres que se tornaram permitidos sob Bolsonaro, como o 9 mm, me parece mais um buraco no controle de armas no Brasil. O calibre 9 mm é o mais usado no mundo todo no cometimento de crimes, ou seja, liberar é modernizar o arsenal do criminoso. O Brasil não pode insistir no erro", acrescentou.

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