Descrição de chapéu indígenas marco temporal

Veja os principais argumentos contra e favor do marco temporal para terras indígenas

Segurança jurídica é a principal defesa, e críticos apontam violência e grilagem

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São Paulo

O projeto do marco temporal para terras indígenas, aprovado na última terça (30) na Câmara dos Deputados, pode ser a maior alteração de direitos dos povos originários desde a promulgação da Constituição.

Enquanto os defensores do texto mencionam como benefício a segurança jurídica a indígenas e proprietários rurais, críticos argumentam que o marco, já usado em questionamentos de demarcação na Justiça, dificultará novos processos, investimentos e a proteção de recursos naturais.

foto mostra indígenas durante cerimônia, estão todos de costas, voltados para uma grande tenda ao fundo
Cerimônia dos indígenas wimiri-atroari na aldeia Mynawa, na Terra Indígena Waimiri-Atroari - Lalo de Almeida - 17.set.22/Folhapress

O tema volta a ser julgado no STF (Supremo Tribunal Federal) na próxima quarta (7), após anos de debates sobre as vantagens e riscos que apresenta. No Legislativo, o projeto vai ao Senado, onde o governo Lula (PT) espera ter mais chances de freá-lo.

Os argumentos ainda se dividem entre a pacificação do campo e a fragilização da manutenção dos territórios e dos recursos naturais, fundamentais para a vida e a cultura dos povos originários.

Veja os principais argumentos a favor e contra o projeto de lei, que vai além do marco temporal.

A FAVOR

O fator temporal

Segundo o projeto, o artigo 231 da Constituição diz que o direito está limitado à data da promulgação por dizer "direitos sobre as terras que tradicionalmente ocupam". Também deve ser provada uma ocupação tradicional, com atividades de caráter permanente e necessárias à reprodução física e cultural do grupo.

Segurança jurídica e pacificação

O principal argumento a favor do marco diz respeito à determinação clara que ele dá para a ocupação das terras por indígenas: a data da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988. Isso serviria para resolver disputas por terra e dar segurança jurídica e econômica, no caso de investimentos no campo.

Direito originário

Camada ironicamente de "tese de Copacabana", a interpretação apareceu no voto do ministro Gilmar Mendes na anulação da demarcação da terra indígena Guyraroká, em 2014. Segundo a interpretação, todo o território brasileiro poderia ser reivindicado como terra indígena, incluindo grandes centros urbanos, o que geraria um problema de insegurança sobre a propriedade de imóveis.

Proteção e uso de terras indígenas

O marco temporal é apontado no projeto e por defensores como uma garantia de segurança para terras já demarcadas e ocupadas por indígenas para debates sobre atividades produtivas que podem ser feitas no território.

Participação do Congresso

O projeto diz que a demarcação extrapola as atribuições da Funai porque lida com questões de interesse nacional e direitos individuais e de interesses públicos e privados nos territórios demarcados. Por isso, defende que o processo deve ser submetido à avaliação do Congresso. Também pretende que a demarcação seja feita por meio de uma lei específica.

Avaliação de traços culturais

A lei permitiria avaliar se uma comunidade mantém as atividades que caracterizam o território como terra indígena. Se houver essa perda, a União poderá retomar a terra, destiná-la à reforma agrária, com preferência para indígenas que queiram trabalhar no campo.

Interesse nacional

O projeto, afirmam defensores, também ajuda a resolver questões de infraestrutura e exploração de minérios. Além disso, dizem eles, serão mantidos os protocolos de consulta às populações indígenas.

Estados e municípios

A participação obrigatória dos estados e municípios permitirá que todas as comunidades impactadas pela demarcação tenham a chance de se manifestar.

CONTRA

Forma escolhida e falta de embasamento

Críticos argumentam que o direito dos indígenas, além de fundamental, é constitucional. Assim, só poderia ser discutido por meio de uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional), não por meio de um projeto de lei. Afirmam ainda que a Constituição e os tratados dos quais o Brasil é signatário vedam a possibilidade de limitar em uma data o direito de indígenas de posse sobre a terra.

Mais lentidão

A Constituição determinava que as terras indígenas deveriam ser demarcadas em até cinco anos a partir da data da promulgação. Com o marco temporal, novas terras podem sofrer pressão econômica e criminosa, no caso da grilagem, para serem demarcadas. Hoje, há pelo menos 242 terras indígenas que aguardam demarcação. Também dizem que o direito de indígenas é anterior à existência do Estado brasileiro, que deve reconhecê-lo.

Mortes e deslocamentos forçados

O projeto dificulta o acesso ao direito à terra quando exige a comprovação de permanência na terra a povos que foram deslocados ou reduzidos por assassinatos e doenças.

Insegurança jurídica

Embora não tenha efeito de repercussão sobre outros temas, condicionantes usadas em votos no julgamento da demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol já foram usadas para embargar processos de demarcação. Também embasaram um parecer elaborado pela Advocacia-Geral da União do governo Michel Temer (MDB) que estabelece a condição para processos de demarcação.

Incentivo à grilagem e ao desmatamento

A grilagem, apontada como motor de desmatamento na Amazônia, seria incentivada como forma de tentar comprovar, com fraude, a ocupação de uma determinada terra no período. O movimento já é um problema para o setor produtivo brasileiro, que lida com regulações ambientais mais restritas. Para críticos, a proposta está ligada a uma ideia de expandir fronteiras agrícolas para aumentar a produtividade, lógica já superada.

Ruim para a economia

Ao dificultar a delimitação do que é terra indígena e incentivar a grilagem, o projeto prejudica a governança no campo, especialmente na Amazônia, para atrair investimentos para o campo no Brasil.

Empreendimentos e povos isolados

O projeto diz que critérios de relevância nacional poderão ser usados para decidir sobre o empreendimento, mas a definição é vaga e poderia ser disputada por diferentes setores econômicos. Ainda, ao definir a possibilidade de contato com povos indígenas isolados "para intermediar ação estatal de utilidade pública", o projeto fragiliza a proteção desses povos, geralmente localizados em áreas conservadas de floresta.

Participação do Congresso

Segundo críticos, a participação do Congresso e de estados e municípios nos processos de demarcação sujeita os indígenas a pressões que vão dificultar o acesso à terra.

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