Protesto vira arma de moradores e comerciantes contra cracolândia

Gestão Tarcísio diz que ampliou diálogo no território; Prefeitura de SP afirma que GCM presta apoio para evitar conflitos

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São Paulo

Moradores e comerciantes de Santa Ifigênia e dos Campos Elíseos, no centro de São Paulo, estão recorrendo a protestos contra a cracolândia. Seja para tentar barrar a chegada dos usuários às suas portas, seja para chamar a atenção do poder público para as cenas de violência presenciadas dia após dia.

Grupos em aplicativos de mensagens têm funcionado como aliado importante na convocação dos atos, que unem idosos, mulheres grávidas e até mesmo crianças, sob sol ou chuva.

As mensagens trocadas nesses grupos também ajudam aqueles que chegam do trabalho ou da escola a não serem pegos de surpresa pela correria de usuários durante dispersões realizadas à base de bombas e balas de borracha por agentes da GCM (Guarda Civil Metropolitana) ou da Polícia Militar. É geralmente em dias de ações desse tipo que a tensão aumenta, com saques, furtos e depredações.

Foi por meio de mensagens em rede social que moradores de um conjunto residencial na avenida Duque de Caxias correram para conseguir a adesão de cerca de cem vizinhos para impedir uma possível transferência dos dependentes químicos que estavam na rua dos Gusmões para a alameda Dino Bueno, na noite do último dia 11.

Moradores fecham cruzamento das avenidas Rio Branco e Duque de Caxias contra a cracolândia nos bairros de Santa Ifigênia e Campos Elíseos
Moradores fecham cruzamento das avenidas Rio Branco e Duque de Caxias em protesto contra a cracolândia - Rubens Cavallari - 11.ago.23/Folhapress

De acordo com os moradores, eles viram na TV a notícia de que o endereço seria o novo ponto da concentração de usuários de drogas, o que gerou a mobilização. O ato chegou a fechar por alguns minutos o cruzamento das avenidas Rio Branco e Duque de Caxias, a mais importante do bairro, sob um temporal.

"Quando vimos isso na reportagem, a gente mobilizou os moradores para fechar a [alameda] Dino Bueno, para que eles [usuários] não voltem", disse a farmacêutica Luciana Lanzillo, 48. A via foi um dos endereços mais longevos da cracolândia.

Na tarde da última sexta (18), cerca de cem pessoas consumiam drogas na Dino Bueno, próximo à praça Júlio Prestes.

Foi a poucos passos dali que o porteiro João da Silva Sousa, 54, foi morto durante um roubo no largo General Osório, no início da noite de terça (15). Ele foi atacado por um criminoso, supostamente morador de rua e usuário de drogas, segundo testemunhas relataram a guardas-civis.

A morte ocorreu em dia marcado por forte tensão na região, com confusão entre lojistas e dependentes químicos na parte da tarde. À noite, equipes da GCM dispersaram os usuários que estavam na esquina da rua dos Gusmões com a avenida Rio Branco com bombas e tiros de bala de borracha.

Um dia antes da morte do porteiro, moradores de um condomínio na rua Mauá bloquearam um trecho da via por alguns minutos contra a presença dos usuários de drogas na rua dos Protestantes. Eles se organizaram por meio de mensagens e no boca a boca entre os vizinhos.

É também por meio de aplicativos de mensagem que lojistas da Santa Ifigênia se mobilizam para manifestações. Também se organizam diante de qualquer sinal de risco de a cracolândia passar pela rua de comércio popular e afastar os já minguados clientes.

"Se a gente não se unir agora, daqui dois anos não tem mais nada", diz o comerciante Marcos Felix, 54, que trabalha em uma loja na via.

Felix, no entanto, ressalta que não pensa só em si, mas em todos que sofrem com a ineficiência do poder público em encontrar uma solução para a cracolândia. "Não adianta eu limpar tudo e jogar a sujeira para o meu vizinho. Se [o fluxo] voltar [para a Santa Ifigênia], a gente vai para a rua de novo."

Outro trabalhador que considera os protestos uma ferramenta para chamar a atenção dos governantes é José Márcio, 49, funcionário de uma loja na rua Santa Ifigênia. "É uma forma de ser visto. A partir do momento que a gente se reúne, passa a ser visto."

O presidente da Associação Geral do Centro de São Paulo, Charles Resolve, disse que as manifestações são uma súplica ao governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e ao prefeito Ricardo Nunes (MDB) para que tomem alguma atitude em relação à escalada da violência na região.

"O protesto é justamente para deixar claro aos governantes que nós não aguentamos mais e que não vamos mais aceitar essa inércia. Vai ter de resolver, vai ter de fazer algo para ontem."

Em nota, a SSP (Secretaria da Segurança Pública) afirmou que as forças de segurança monitoram a movimentação dos usuários com o objetivo de garantir não só a segurança de moradores e comerciantes, mas também a de todos que frequentam a região.

A gestão Tarcísio de Freitas disse ainda ter ampliado o diálogo com moradores e lojistas.

Em nota, a Prefeitura de São Paulo afirmou que a GCM presta apoio às ações diretas dos agentes das demais secretarias para mediar e evitar possíveis conflitos na execução dos serviços municipais, assegurando a proteção dos agentes públicos e da população em geral.

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