Prefeitura desiste de fiscalizar ruído em residências de SP

Medida foi excluída da proposta de revisão da lei de zoneamento enviada à Câmara

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São Paulo

A gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) desistiu de incluir na sua proposta de revisão do zoneamento da cidade de São Paulo a fiscalização a residências que descumprirem regras do Psiu (Programa Silêncio Urbano).

Depois de ter incluído tais medidas em versões prévias da nova Lei de Uso, Parcelamento e Ocupação do Solo, o texto enviado na noite desta quarta-feira (4) para a Câmara Municipal excluiu o tema. A prefeitura justifica que a garantia constitucional à inviolabilidade da propriedade prejudicaria a fiscalização do excesso de barulho em casas e apartamentos.

Aparelho é utilizado para medir ruído em avenida da zona leste de São Paulo
Aparelho é utilizado para medir ruído em avenida da zona leste de São Paulo - Adriano Vizoni - 28.mai.2010/Folhapress

Funcionários responsáveis pelo Psiu, porém, contestavam a decisão da gestão Nunes quanto à fiscalização desses imóveis. Alegavam falta de profissionais em número suficiente para atender ocorrências envolvendo estabelecimentos comerciais, como já determina a regra em vigor.

Das cerca de 25 mil reclamações recebidas pelo Psiu por meio do telefone 156 de janeiro a julho, somente 5.500 (21%) resultaram em fiscalização. Foram aplicadas no período 280 multas, segundo dados da prefeitura obtidos pela reportagem via Lei de Acesso à Informação.

Os limites sonoros em São Paulo variam de 40 a 65 decibéis, dependendo do tipo de zona e horário –quanto mais tarde, maior a restrição. Infrações podem levar a multas de R$ 12 mil a R$ 36 mil e até à interdição do estabelecimento.

O projeto enviado à Câmara também propõe o adiamento para 2029 da conclusão de um mapa para regular diferentes limites de ruído conforme as características de cada bairro ou região da cidade, que já está atrasada. Em nota, porém, a gestão Nunes destacou que propôs para 2026 o mapa de ruído para as áreas mais centrais e próximas a corredores de ônibus e linhas de metrô.

A obrigatoriedade da produção do Mapa do Ruído Urbano foi instituída por lei na gestão Fernando Haddad (PT), em 2016, com prazo de quatro a sete anos para ser aplicada.

Relator da lei de zoneamento na Câmara, o vereador Rodrigo Goulart (PSD) afirma que não há demanda para a inclusão de residências nas regras do Psiu e que, por esse motivo, o tema dificilmente voltará ao projeto.

"Era uma iniciativa do Executivo, não tivemos essa demanda exposta em nenhuma das audiências, por enquanto", disse Goulart, sobre as audiências realizadas pela prefeitura.

A vereadora Cris Monteiro (Novo) discorda quanto à exclusão das residências da fiscalização do Psiu. "O problema está em todos os cantos, em imóveis residenciais, não residenciais, festas, pancadões, bares", diz.

Ela diz, porém, que é mais importante que a prefeitura crie estrutura para cumprir o que a atual legislação já determina. "O cidadão fica à mercê porque a prefeitura não tem condições de fazer a fiscalização", afirma a vereadora.

Além do ruído, a chamada Lei de Zoneamento é responsável por determinar quais atividades podem ser desenvolvidas em diferentes pontos do município. É ela que determina, por exemplo, quais bairros devem ser ocupados somente por residências ou o tipo de empresa autorizada a funcionar em certas ruas. Também determina o tamanho das construções, determinando quais quadras poderão ter prédios mais altos.

A capital tem hoje o menor efetivo de fiscais de rua em atuação dos últimos 20 anos, com 325 profissionais, o que afeta a capacidade de atendimento às demandas do Psiu. A prefeitura tem concurso aberto para contratar 175 novos agentes

É o zoneamento que coloca em prática, quadra a quadra, as orientações do Plano Diretor para o crescimento da cidade, cuja revisão intermediária e obrigatória foi concluída em junho deste ano.

Ponto mais debatido do Plano Diretor, o aumento das EETU (Zonas Eixo de Estruturação da Transformação Urbana) é ponto central da revisão do zoneamento. Dentro destas áreas há incentivos para que as construções sejam maiores em relação a outras zonas, além de não existir limite específico de altura para prédios.

O Plano Diretor aumentou de 600 para 700 metros os raios das zonas de eixo no entorno de estações de metrô e trens. Nos corredores de ônibus, o tamanho da faixa considerada EETU subiu de 300 para 400 metros. Espera-se que a revisão do zoneamento aponte em quais quadras as novas regras serão válidas.

O texto enviado à Câmara pelo Executivo cria algumas restrições para a expansão dessas zonas de eixo.

Quadras serão excluídas da regra se nelas existirem barreiras urbanas (como ferrovias e cemitérios), ladeiras e outras condições que dificultem o trajeto a pé ou exijam caminhada superior a um quilômetro até o transporte público.

A prefeitura também limitou a expansão dos eixos às áreas em que há maior consolidação da urbanização.

São duas grandes porções do território paulistano: a MUC (Macroárea de Urbanização Consolidada), onde estão bairros mais desenvolvidos das zonas central, oeste e sul; e a MQU (Macroárea de Qualificação da Urbanização), que abrange áreas predominantemente residenciais nas franjas do centro expandido.

Para bairros mais afastados, como nos extremos leste e sul, a prefeitura quer que o desenvolvimento ocorra por meio de planos urbanísticos específicos, os chamados PIUs (Planos de Intervenção Urbana).

Na próxima semana, a Câmara deverá definir o calendário de audiências públicas. Na Comissão de Política Urbana, presidida pelo vereador Rubinho Nunes (União Brasil), a expectativa é que a revisão seja aprovada até o fim do ano.

Gestão Nunes diz que Psiu para residências é inconstitucional

A Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento, da gestão Ricardo Nunes, informou reconhecer "a importância do Mapa de Ruído Urbano como ferramenta de apoio às decisões para o planejamento e ordenamento urbano em relação à gestão de ruído na cidade", disse.

A secretaria também afirma que é necessário cruzar as regras desse mapa com estudos já realizados na prefeitura, além de averiguar normas federais. Por isso, propôs que a elaboração seja concluída até 2026 para a Macroárea de Urbanização Consolidada e para os Eixos de Estruturação da Transformação Urbana, e até 2029, para as demais áreas da cidade.

A prefeitura ainda comunicou que a exclusão do dispositivo que propunha submeter as edificações de uso residencial à fiscalização e controle de ruídos deu-se pelo "reconhecimento da inviabilidade da imposição de atividade fiscalizatória de posturas municipais no âmbito domiciliar, em face das garantias constitucionais de sua inviolabilidade".

No entendimento da prefeitura, diz a nota, há outros modos de repressão à utilização abusiva da propriedade, amparados pelo Direito Civil, no âmbito dos direitos de vizinhança.

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