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Lei redigida por ChatGPT é aprovada por unanimidade em Porto Alegre

Vereador propôs lei elaborada por IA para colocar tecnologia em debate

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Porto Alegre

Uma lei da Câmara de Porto Alegre que isenta a população de pagar por um novo medidor de consumo de água caso o objeto seja furtado levou poucos segundos para ser redigida por uma IA (inteligência artificial) e tramitou sem dificuldades pelo Legislativo até ser aprovada por unanimidade em plenário.

Após a sanção da lei pelo prefeito, no dia 23, o vereador Ramiro Rosário (PSDB) divulgou que o projeto foi feito a partir de uma orientação ao ChatGPT com apenas a seguinte orientação, de 289 caracteres:

"Criar projeto de Lei municipal para a cidade de Porto Alegre, com origem legislativa e não do Executivo, que verse sobre a proibição de cobrança do proprietário do imóvel o pagamento de novo relógio de medição de água pelo Departamento Municipal de Água e Esgoto quando este for furtado"

Ramiro Rosário (PSDB) testou tramitação na Câmara de projeto sobre medidor de água feito por IA. - Foto: Leonardo Lopes/CMPA

O pedido resultou em um projeto de lei com oito artigos e justificativa, que foi incluído sem alterações no sistema eletrônico da Câmara Municipal em 7 de junho. Na próxima etapa, a Seção de Redação Legislativa analisa o texto de cada projeto e sugere alterações antes de ele tramitar.

Ali, deu-se o único entrave. Por ter excedido o número máximo de caracteres da ferramenta, a justificativa resultou em um texto incompleto, enviado por Rosário mesmo assim. O setor alertou o gabinete do vereador que não havia recebido o final do texto e ele retornou à ferramenta para solicitar uma versão menor.

Ademais, a Seção de Redação Legislativa não fez objeções ao conteúdo de nenhum dos artigos e tampouco desconfiou do uso de IA. Porém, o servidor público que analisou o projeto sugeriu que os artigos fossem anexados a uma lei de 1987 sobre políticas hidrossanitárias da cidade, cuja existência não era de conhecimento do ChatGPT.

O texto recebeu parecer favorável da Comissão de Constituição e Justiça e foi aprovado por unanimidade pelos vereadores em 18 de outubro. Conforme Rosário, a ferramenta não só cumpriu a tarefa de redigir um projeto de lei de conteúdo simples como foi pró-ativa.

"Em um dos artigos ele determina que, caso não haja reposição do aparelho em 30 dias, o proprietário do imóvel ficará isento do pagamento das faturas de água enquanto não houver medição. Achei uma boa ideia e mantive, embora não tenha sido minha", diz Rosário.

Utilizando o mesmo texto de orientação, a Folha chegou a um projeto bastante similar, mas diferente exatamente nesses pontos. Com dois artigos a menos, ela não estipula prazo para a reposição do aparelho e tampouco prevê isenção das faturas caso não haja reposição. A justificativa também foi 60% mais sucinta.

Na visão do vereador, a difusão da ferramenta pode auxiliar Câmaras de municípios menores a elaborarem projetos melhores economizando recursos. Para Rosário, a ferramenta por si só não traz problemas éticos, apenas dá nova forma a uma prática já recorrente nas casas legislativas.

"É comum vereadores, para elaborarem leis nas suas cidades, buscarem como base uma lei parecida de outra cidade com a mesma finalidade e copiarem a redação. O ChatGPT faz a mesma coisa do jeito dele, recorrendo a um banco de dados de leis que já estão na internet. Considerando que estamos falando de dinheiro público, acho que a tecnologia tem muito a contribuir", diz.

Luiz Afonso de Melo Peres, diretor legislativo da Câmara de Porto Alegre, disse que o projeto do vereador tucano "veio redondinho" e não despertou desconfiança do setor técnico. Ele considera que não há motivo para questionar ou extinguir a lei redigida pela IA em nome de Rosário.

Na opinião de Peres, até a sugestão dada pela sua diretoria, de anexar os artigos à uma lei pré-existente, poderá um dia ser sugerida por IA, caso uma ferramenta seja capaz de rastrear leis em vigor de cada cidade.

"Eu acredito que a única parte do processo legislativo em que a presença humana será sempre imprescindível é o plenário, em que os vereadores debatem e votam. Sobre a validade da redação do texto, ela vem da assinatura do vereador, e não da forma como ele redigiu", resume Peres.

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