Descrição de chapéu Obituário Roquelina Alves Rodrigues (1940 - 2023)

Mortes: Matriarca de povo indígena, defendia a ideia de 'não fugir da luta'

Tereza Kariri dominava a cura com ervas e escrevia poesias

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Juazeiro (BA)

"Não fugir da luta" é o quinto dos dez mandamentos indígenas escritos pela pajé Tereza Kariri. Ela foi uma das mulheres responsáveis pelo resgate indígena no sertão do Ceará.

Na década de 1980, os povos indígenas eram tidos como extintos no estado e algumas lideranças iniciaram um levante de aldeias. Com um caderno debaixo do braço e uma caneta na orelha, Tereza Kariri saia com a filha Cristina Kariri por Crateús (CE) em busca de "parentes".

Essa ideia de mapeamento veio da indigenista Ana Maria Amélia, que a conheceu em uma romaria em Canindé (CE), em 1988. A pesquisadora trabalhava na Missão Tremembé, no litoral cearense, onde iniciou a retomada indígena do estado.

Roquelina Alves Rodrigues, a Dona Tereza Kariri (1940 - 2023)
Roquelina Alves Rodrigues, que era conhecida como dona Tereza Kariri (1940 - 2023) - Joedson Kariri

Ao ser questionada sobre sua origem, Tereza negou. Cumpria a promessa que tinha feito à avó de não revelar suas raízes. "Ela foi ensinada e passou para os filhos nunca dizerem que eram indígenas, pelo medo da perseguição", conta a neta Jamilly Kariri, 22.

Após muita insistência da indigenista, ela se tornou a primeira a se assumir indígena em Crateús e a primeira da etnia Kariri no Ceará.

Tereza nasceu Roquelina Alves Rodrigues, no Crato (CE), mas adotou o nome de uma prima que morreu jovem. Sua mãe morreu no parto e ela foi criada pela tia. Frequentou uma escola de freiras, mas teve que largar os estudos para trabalhar.

Na década de 1950 foi para Crateús (CE), acompanhando uma família como babá. Na nova cidade, conheceu seu marido, Antonio Jovelino, da etnia Tabajara.

Seu trabalho fez da região a mais diversa em etnias do estado e inspirou outros povos do Ceará e do Piauí. "Era essa pessoa de apoio às comunidades, de fortalecimento do movimento", afirma o professor e líder do movimento indígena Joedson Kariri, 27.

A pajé era curandeira. "Minha avó nasceu com uma missão, acho que nem ela sabia que ia ser tão grande", diz Jamilly.

Mesmo em contexto urbano, ensinou os costumes indígenas aos netos, como a pesca e o artesanato. Também contava sobre a origem da família na aldeia Marrecas, dizimada em um etnocídio.

Gostava de cantar e escrever poesia. Guardava cadernos e mais cadernos. Em uma das canções dizia "a luta indígena hoje é árdua, mas vale a pena".

Tereza usava marcapasso e, por causa de um enfisema pulmonar, precisou de bala de oxigênio no último ano.

Morreu de parada cardíaca no dia 11 de outubro, um mês após a filha Cristina, ou se "ancestralizou", como diz seu povo. Deixa mais cinco filhos, Eliane, Zezinho, Tetê, Antônio Elson e Quinquinha, e 11 netos.

coluna.obituario@grupofolha.com.br

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