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Banheirão renasce em São Paulo com propina, grupo organizado e códigos

Homens que utilizam sanitários de locais públicos para fazer sexo com desconhecidos têm estratégias para driblar cerco das empresas

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São Paulo

O fisioterapeuta Caio, 23, voltava do trabalho numa noite de janeiro e resolveu parar no banheiro da estação Pinheiros, na zona oeste de São Paulo, para urinar. Minutos depois, ele era conduzido a uma delegacia sob acusação de atentado ao pudor.

Homens que estavam naquele espaço foram flagrados por seguranças trocando carícias nas partes íntimas. O jovem nega, porém, participação na "brincadeira" e, aos risos, declara que, desde então, mudou o trajeto para casa.

A prática desenrolada naquele sanitário tem nome: banheirão, a utilização de um banheiro público para sexo entre homens. Há vários pela cidade, uns famosos e outros mantidos em segredo.

Parede de banheiro de ladrilhos azuis com um rolo de papel higiênico que ao invés de papel há camisinhas para destacar
Ilustração de rolo de papel higiênico com camisinhas para destacar - Catarina Pignato

Cientes disso, empresas tentam reprimi-los, mas esbarram na resiliência dos praticantes, mesmo o ato sendo crime de atentado ao pudor. A pena prevista vai de três meses a um ano de reclusão ou multa.

Em estações e shoppings, onde ela se dá com mais frequência, guardas e faxineiros tornaram-se barreiras treinadas pelas empresas contra cruzadores —termo usado para descrever quem usa áreas públicas para ato libidinoso. A ordem é segurá-los e chamar a polícia.

Após a pandemia, época de pico nos banheirões, muitos acreditaram que a atividade estava condenada. Os praticantes, porém, não recuaram e passaram a usar estratégias mais ousadas. Organizados em redes sociais, seguem ocupando banheiros públicos e, quando flagrados, tentam aliciar os funcionários. Dois articuladores experientes, Marcelo e Gabriel, que pediram para não terem os sobrenomes divulgados, explicaram à reportagem como operam.

De antemão, os territórios são mapeados, fotografados e levados para análise do coletivo. São avaliados critérios como limpeza, tamanho e posição do mictório, palco principal das cenas de sexo, apesar da privacidade das cabines. Quanto mais perto da entrada, melhor será a vigilância contra aparições indesejadas.

Aprovado o alvo, indivíduos são escolhidos para invadi-lo. O dia é acordado e, em bando, eles chegam sempre ao cair da noite.

Se ninguém flagrar, tudo certo. Caso um funcionário local aviste a cena, entra a negociação. Propinas para relevar a situação vão de R$ 100 a R$ 200.

O plano deve ser executado sob três preceitos: sem pegação na frente de menores ou heterossexuais visivelmente irritados, nada de perseguir homens desinteressados e, finalmente, evitar ficar lavando as mãos a todo momento para disfarçar a longa permanência. Todos percebem a falsidade.

Para o sexólogo Jairo Bouer, o estímulo erótico dos banheirões é provocado por dois fatores: exposição e perigo. "Tem gente que prefere transar no carro, numa rua abandonada ou com pouco movimento. E tem gente que prefere experiências em banheiros públicos. É um tipo de comportamento bastante comum", diz.

O mapa do prazer

Banheiros eleitos queridinhos pelos cruzadores são apelidados para, quando citados em conversas, dificultar a identificação por estranhos. O mais famoso deles, na estação Palmeiras-Barra Funda, vira "deep" (profundo, em inglês).

A CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos), administradora da parada, diz que suas equipes de vigilância realizam rondas frequentes visando coibir práticas irregulares nas suas dependências. "Caso haja flagrante, as pessoas envolvidas são encaminhadas à autoridade policial", explica.

Brás, Luz e Tatuapé, também administrados pela companhia, compõem o itinerário paulistano da volúpia entre azulejos.

Outros pontos voltados à prática de banheirão incluem as estações Lapa e Vila Olímpia –a última é a favorita de universitários no pós-aula. Por isso, a ViaMobilidade, concessionária responsável pelos locais, relata efetuar patrulhas e capacitar seus funcionários a agir imediatamente quando observarem comportamentos ilícitos.

Existem placas nos acessos e no interior dos toaletes sobre proibições e consequências.

Centros comerciais também são alvos, como os shoppings Tucuruvi, na zona norte, Higienópolis, no centro, e Morumbi, na zona sul. Este último declara não compactuar com tais práticas em seus domínios. Os demais não responderam aos contatos da Folha.

Por fim, há quem busque um supermercado da rede Sonda na movimentada avenida Francisco Matarazzo. A empresa responsável diz desconhecer casos do tipo.

Além de cometer uma ilegalidade, quem pratica o banheirão corre outros riscos. Há quem se aproveite da situação para roubar e furtar os praticantes e há quem filme escondido para depois publicar os vídeos em páginas especializadas. Muitos rostos estão nelas sem saber.

Yasmin Curzi, especialista em direito digital e professora da FGV (Fundação Getulio Vargas), declara ser possível a cidadãos prejudicados recorrer ao Judiciário. Eles devem pedir que usuários ou comunidades sejam banidos por violar sua privacidade. "Caso a rede social em questão não aceite isso, a própria terá problemas com a lei", explica.

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