Descrição de chapéu Alalaô

Carnaval de rua de SP vira disputa entre marcas e entra na tendência do naming rights

Rede social fechou contrato para adquirir direitos sobre o nome de bloco que atrai 500 mil pessoas; outras empresas turbinaram distribuição de brindes

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São Paulo

Diante de um Carnaval de rua cada vez mais caro, em que os blocos praticamente não vão para a rua sem patrocínio, as empresas que aproveitam os dias de desfile em São Paulo para expor suas marcas têm inovado em estratégias e acirrado a disputa por espaço publicitário na cidade.

As tradicionais ativações de marca, que em anos anteriores se restringiam à exibição de logotipos e cores em trios elétricos e guarda-sóis de ambulantes, avançaram e, hoje, incluem até adquirir os direitos sobre o nome de um bloco e dividir sua gestão artística.

Foliões usam viseiras distribuídas por aplicativo de entrega no Carnaval de São Paulo
Foliões usam viseiras distribuídas por aplicativo de entrega no Carnaval de São Paulo - Ronny Santos - 20.fev.23/Folhapress

Fundado em 2015, o bloco Agrada Gregos irá desfilar neste Carnaval como Bloco do TikTok com Agrada Gregos, após a rede social oferecer parceria de naming rights. "Mais do que um patrocinador, o TikTok neste ano criou o bloco junto com a gente", diz a sócia Nathalia Takenobu.

Com um repertório pop, inspirado nas baladas paulistanas onde a fundadora tocava como DJ, o Agrada Gregos reuniu 500 mil pessoas no desfile do ano passado em frente ao parque Ibirapuera —a maioria jovens, mesmo público da rede social.

Além de batizar o bloco, a marca teve participação na escolha das atrações musicais e vai transmitir o desfile em live na plataforma. Sobre o risco de perda de identidade com o acordo comercial, Nathalia compara a situação a um casamento "em que cada um precisa abrir mão um pouco do que é para dar certo". "Estamos ganhando muita exposição e a possibilidade de desfilar em um ano em que muito bloco cancelou", diz a sócia.

Neste ano, ao menos 129 blocos foram cancelados pelos organizadores até o pré-Carnaval, realizado no último fim de semana. Blocos tradicionais, como Domingo Ela Não Vai e Meu Santo É Pop, desistiram por dificuldades em fechar as contas. A gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) afirmou que confirmou 536 desfiles neste ano.

Segundo Gabriel Simas, líder de marketing do TikTok na América Latina, este é o segundo ano de investimento da marca no Carnaval e o primeiro em São Paulo. Em 2023, a rede social produziu um bloco próprio em Salvador. Agora, além do Agrada Gregos, o TikTok fechou parceria de naming rights com os blocos A Favorita, no Rio de Janeiro, e NuOutro, na capital baiana, sempre com participações de famosos. "É um momento relevante para a cultura, que traz impacto socioeconômico", diz o líder. "Um momento que a gente leva nossa marca para conectar com as pessoas."

Em São Paulo, os desfiles dos blocos representam uma oportunidade única para as marcas porque o edital do Carnaval de rua flexibiliza a lei Cidade Limpa durante os dias de festa, quando é permitida a exposição de propaganda em locais públicos proibida por lei municipal desde 2007 para combater a poluição visual na cidade.

Diferentemente da rede social que "comprou" o Agrada Gregos, há outra modalidade de negócio gerenciada por agências que funcionam como produtoras de blocos. A GoFun, por exemplo, vai levar para as ruas de São Paulo dez blocos próprios com atrações famosas de pagode universitário, sertanejo e axé. Ao menos três grandes marcas patrocinam as produções.

"Começamos com atrações famosas em 2015, levando para a avenida Faria Lima o Bloco do Rindo à Toa, com a Banda Falamansa. Desde então, já trouxemos Claudia Leitte, Anitta, Baile da Favorita, Gustavo Mioto, entre outros", diz o dono da agência, Gustavo Gomes Pereira.

Neste ano, ele afirma que a empresa irá investir 30% a mais do que em 2023. "A explosão de blocos em São Paulo inflacionou muito o mercado nos últimos anos. Um trio que pagamos R$ 8.000 em 2015 hoje está em R$ 60 mil. Com a queda de alguns blocos parece que os fornecedores estão voltando à realidade", opina.

A maior demanda dos blocos por patrocínio atraiu neste ano novo segmento de empresas interessadas em participar, como sites de apostas e de conteúdo adulto. Maior plataforma de busca de profissionais do sexo do Brasil, a Fatal Model vai patrocinar ao menos dois blocos de rua de São Paulo.

Procurada, a gestão do prefeito Ricardo Nunes afirmou que cada bloco é responsável pelo próprio patrocínio, e que disponibiliza um guia de regras para os blocos e outro para os patrocinadores.

A comunicação visual das marcas nos dias de festa, neste ano, inclui também uma espécie de disputa pelas cabeças dos foliões, com o aumento de distribuição de brindes para proteger do sol, como viseiras e bonés. A tática foi lançada no Carnaval de rua pelo aplicativo de entregas iFood em 2019 e, desde então, todo ano o acessório vermelho com a logomarca se espalha pela cidade até depois dos desfiles, quando o brinde é usado pelo público no dia a dia.

"A ideia foi dar uma conveniência para o público já que o aplicativo também é de conveniência", diz Fernanda Neder, gerente de brand experience do iFood. "Foi a forma que encontramos para sair do online para o offline", continua.

Diante do sucesso de engajamento, ao menos duas marcas também vão aderir à distribuição de acessórios para a cabeça neste ano no Carnaval. O aplicativo chinês de compartilhamento de vídeos Kwai afirmou que irá oferecer cerca de 100 mil brindes nas ruas da capital paulista, além de Rio de Janeiro e Salvador. Entre os itens estão viseiras com o logotipo da marca. A Hering também prepara ação parecida com a oferta de bonés. Procurada, a marca não respondeu.

Para o pesquisador Guilherme Varella, autor do recém-lançado livro "Direito à Folia", essas estratégias refletem o modelo de financiamento do Carnaval paulistano em que as empresas usam o espaço público para exibir a marca e se apropriar da paisagem urbana por meio dos blocos. "É uma distorção da espontaneidade do Carnaval de rua", diz. "Passa a tratar o Carnaval como fenômeno político e econômico, não cultural, esvazia o sentido cultural da política pública", continua.

O folião Bruno Vilaça, que usava uma das muitas viseiras vermelhas no pré-Carnaval, disse que está acostumado com a entrega de lembranças em festivais, não no Carnaval. "Só de viseiras acho que tenho umas dez em casa. Eu acho legal. É brinde eu estou pegando."

No mesmo desfile, havia oferta gratuita de pochetes e mochilas com o nome de uma rede social, copos com o nome de uma marca de cerveja e óculos de comprimido para evitar a ressaca.

Colaboraram Isabella Menon e Stefhanie Piovezan

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