Prisões de segurança máxima como a de Mossoró são raridade na Europa

Países como Reino Unido e Holanda adotaram o modelo para conter fugas; morte de Navalni em presídio russo chamou atenção para situação no país

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Lisboa

Caracterizadas por medidas extremas de controle e pesadas restrições de circulação e de visitação aos detentos, as chamadas prisões supermax, que inspiraram os presídios federais de segurança máxima brasileiros, são minoria na Europa.

O assunto chamou a atenção no país depois que dois presos conseguiram fugir do presídio federal de Mossoró (RN). É a primeira vez que isso aconteceu.

Manifestantes protestam em Berlim após a morte de Alexei Navalni em uma prisão russa
Manifestantes protestam em Berlim após a morte de Alexei Navalni em uma prisão russa - Odd Andersen - 18.fev.24/AFP

Na Europa Ocidental, os Centros de Supervisão Fechada (CSC, na sigla em inglês), no Reino Unido, têm o modelo disciplinar com mais semelhanças em relação às prisões de segurança máxima americanas.

Esse regime especial de encarceramento, no entanto, é de aplicação bastante restrita. Segundo as autoridades britânicas, ele é destinado somente aos indivíduos "mais perigosos do sistema prisional".

Cerca de 55 pessoas, na Inglaterra e no País de Gales, estão atualmente nesses centros, onde os presos são mantidos em isolamento e com monitoramento constante: há um funcionário para cada dois detentos.

Os CSC estão inseridos em complexos prisionais maiores, mas funcionam em espaços isolados e com segurança reforçada. São uma espécie de prisão dentro das prisões, abrigando desde condenados por homicídios até terroristas.

O modelo começou a ser adotado em 1998, depois de um pesado desgaste do governo com fugitivos das cadeias tradicionais. Até o momento, não foram registradas fugas ou rebeliões nessas instalações.

Especialistas em direitos humanos, contudo, criticam o tratamento destinado aos detentos e a falta de transparência do sistema.

"O processo de tomada de decisão não é transparente, o período de segregação não é delimitado, o procedimento para a reintegração na população prisional em geral não é claro e as condições de detenção são comparáveis ao confinamento solitário", disse Nils Melzer, relator especial da ONU sobre tortura.

Cada preso em CSC custa anualmente cerca 100 mil libras (R$ 627,2 mil) aos cofres públicos, o que, segundo o relator das Nações Unidas, pode incentivar financeiramente, em alguns setores, a adoção desse modelo extremo de privação de liberdade.

Em 2022, o governo britânico anunciou planos de expandir o sistema de supersegurança, que atualmente conta com cinco centros.

Na Holanda, o modelo de prisão com medidas extraordinárias de segurança foi implementado em 1993, também como resposta a uma embaraçosa sucessão de fugas dos presídios.

O regime de segurança extra (EBI, em holandês), foi instalado em uma área segregada do complexo prisional de Vught, no Sul do país.

Os detentos são divididos em quatro blocos, com sete celas individuais cada. Para facilitar o controle e a vigilância, deve haver sempre uma cela vazia em cada divisão.

A visitação aos detentos é limitada e há também restrições à interação entre os presos. Toda a correspondência e as conversas dos detentos são monitoradas.

Além de manter os reclusos em espaços individuais, os EBI têm muros reforçados e especialmente construídos para permitir uma visão ampla do complexo. Na parte superior, há barras de proteção para evitar que os presos sejam resgatados de helicóptero ou que recebam armas ou drogas lançadas arremessadas pelos ares.

Não há registro de fugas, mas houve pelo menos dois incidentes de agressões entre presos durante o período de exercício e banho de sol, resultando em uma morte. Em 2015, houve um caso de suicídio dentro do regime EBI holandês.

Embora a capacidade máxima do sistema seja de 24 presos, os últimos anos foram marcados pela baixa utilização desses espaços, que abrigaram em média 9 detidos.

As condições de vida dos detentos, sobretudo em relação ao isolamento, também são alvo de queixas por organizações de direitos humanos.

Na França, as instalações de segurança máxima são conhecidas como maison central (casa central) e podem ser independentes ou estar inseridas em complexos prisionais maiores.

Inaugurada em 2014, a prisão de Vendin-Le-Vieil — uma pequena cidade no Norte, próxima à fronteira com a Bélgica— é classificada como a mais vigiada do país, muitas vezes recebendo indivíduos com episódios de violência em outras instituições.

As instalações são isoladas por três grandes muralhas e são cercadas por fios especiais anti-helicópteros. Além de das câmeras de vigilância convencionais, o sistema especial do presídio conta com 400 dispositivos infravermelhos e sensores de movimento.

Os presos classificados como mais perigosos são mantidos em celas individuais isoladas, onde passam 23 horas por dia. Visitas são limitadas e há proibição de objetos metálicos.

Embora não tenha havido nenhuma fuga, já existiram episódios de agressão entre os detentos, inclusive com a morte de um preso. Os internos também já conseguiram atacar e fazer reféns entre os funcionários e guardas prisionais.

"Não importa se o país é rico ou na União Europeia. O sistema penitenciário de todos os países europeus têm problemas, como mostram os próprios relatórios do Conselho da Europa, que sempre mostram que não há sistemas perfeitos", avalia o sociólogo António Pedro Dores, professor do ISCTE (Instituto Universitário de Lisboa), que integrou o Observatório Europeu das Prisões.

Dados do Conselho da Europa referentes a janeiro de 2021 —cifras mais recentes antes da expulsão da Rússia da instituição—, os países e territórios da Europa tinham cerca de 1,41 milhão de pessoas nas prisões, dos quais 34% (479 mil) em território russo.

A intensificação do regime autoritário de Vladimir Putin, bem como o isolamento internacional do país desde a invasão da Ucrânia, têm contribuído, segundo especialistas, para o aumento da opacidade sobre as condições das prisões russas.

Na última semana, a morte do opositor Alexei Navalni em uma prisão de segurança máxima na Sibéria voltou a atrair a atenção internacional para as condições dos presos —muitos deles políticos— do país. Trabalhos forçados, condições precárias de alimentação e episódios de tortura são frequentemente denunciados.

Uma das prisões mais famosas –e vigiadas– do país é colônia penal número 6, mais conhecida como "golfinho preto" por conta de uma estátua do animal instalada na entrada do complexo. Ela está em funcionamento desde o século 18, mas foi adaptada com equipamentos modernos de segurança para os dias atuais.

Instalada na região de Orenburg, próxima à fronteira com o Cazaquistão, a prisão recebe apenas condenados à prisão perpétua.

São atualmente cerca de 700 presos, todos abrigados em celas individuais. Segundo uma reportagem da National Geographic, um raro caso de jornalistas internacionais autorizados a entrar no local, os detentos são acordados às 6h, durante 16 horas, não têm autorização para sentar ou deitar em suas camas.

Quando precisam sair do confinamento individual, os reclusos são algemados e obrigados a andar com o tórax abaixado. Segundo as autoridades russas, jamais houve um caso de fuga das instalações.

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