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Rodolfo Guttilla

Propósito e causa em 2020

Em meio à pandemia global, pessoas e organizações estão revendo o seu propósito de vida e as causas em que devem se engajar

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Rodolfo Guttilla

Nas duas últimas décadas, tendo em vista a escalada da desigualdade social e a degradação ambiental em nossa sociedade, pessoas e organizações conscientes vêm refletindo e buscando atribuir um novo sentido para sua existência.

Nesse contexto, a pergunta recorrente é: qual é o meu propósito, minha razão de ser nesse período turbulento de nossas vidas?

Em 1972, a Organização das Nações Unidas (ONU) reuniu chefes de Estado para discutir o avanço da degradação do ambiente e seus efeitos na sociedade. Na agenda, os impactos socioambientais de resíduos, gases de efeito estufa e o esgotamento de diversos recursos indispensáveis à vida humana. E a situação de vulnerabilidade das pessoas e sociedades mais pobres.

Na década de 1980, a ONU retoma o debate e registra suas conclusões sobre a evolução da degradação sócio ambiental no planeta e apresenta o relatório “Nosso futuro comum” (ou “Relatório Brundtland”).

Em resumo, o relatório conclui que as nações deveriam adotar uma política de “desenvolvimento sustentável” –um modelo que atendesse “às necessidades do presente, sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem às suas necessidades”. Há, nesse entendimento, uma relação clara e direta da interrelação do homem com o ambiente.

Como sabemos, no Brasil, essa agenda foi ignorada por uma parcela da elite econômica e política, envolvida em esquemas de clientelismo e corrupção –males que datam da origem de nossa sociedade.

Nesse terrível contexto, as populações mais vulneráveis estão pagando o preço do descaso com suas vidas, diante do avanço da pandemia global da Covid-19.

Afinal, 35 milhões de brasileiros não têm acesso a água tratada e mais de 100 milhões não possuem coleta de esgoto em suas casas, o que impacta negativamente na saúde e qualidade de vida de grande parte da população.

Em nossa triste história de exclusão social, muitos já morreram e muitos outros ainda irão perecer por falta de recursos básicos, recursos que deveriam ter sido providenciados por aqueles que, desde sempre, nos governam.

Diante desse cenário desumano, pessoas, organizações e nossos representantes políticos deveriam refazer, diariamente, as seguintes perguntas: qual é o meu propósito de vida? Que causa devo abraçar?

Com base em um estudo que recentemente divulgamos na Cause, nossos representantes dos poderes Executivo e Legislativo (nos planos federal, estadual e municipal) deveriam, no curtíssimo prazo, se mobilizar para fortalecer a política de isolamento social e as ações emergenciais. Permitindo, assim, que o Sistema Único de Saúde (SUS) amplie a oferta de leitos para pacientes em situação de risco, de modo a assegurar a dignidade do ser humano.

Em outra frente, as lideranças políticas deveriam estar mobilizadas, em ação coordenada entre os entes federativos, para oferecer acesso à água tratada e coleta de esgoto. E, não menos importante, o acesso a uma renda mínima para promover a segurança alimentar e gerar algum conforto para a população mais vulnerável.

Da mesma forma, é imperativo não esquecer causas que, por vícios de uma sociedade fundada no patriarcalismo, se encontram envoltas por um véu de silêncio e omissão, como o enfrentamento da violência doméstica –que vem se agravando durante a pandemia.

Finalmente, devemos todos nos engajar, com determinação e coragem, no combate às notícias falsas que promovem um entendimento enganoso sobre a gravidade da atual situação e expõem milhares de vidas ao risco de contaminação.

Como não poderia deixar de ser, a imprensa possui papel de relevo na condução dessa agenda. Liberdade de expressão e imprensa livre e independente são esteios da democracia.

Como sabemos, vivemos em uma sociedade marcada por enormes diferenças de classe social. Nesse momento, é nosso dever buscar reduzir o sofrimento daqueles que se encontram desprotegidos e desamparados.

Assim, convidamos todos os cidadãos e organizações conscientes que estão a serviço do bem comum a revisitar seu propósito de vida e a se engajar em causas que promovam um futuro mais sustentável, inclusivo e solidário.

Rodolfo Guttilla

Antropólogo e jornalista, é sócio-fundador da Cause, consultoria de advocacy e defesa de interesses públicos.

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