Idadismo afeta a saúde de idosos e pode diminuir seus anos de vida

Estudo mostra que pessoas com pensamentos positivos sobre a idade vivem mais do que aquelas que têm ideias negativas

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Paula Span
The New York Times

A cada outono, Becca Levy pede aos alunos de sua turma de saúde e envelhecimento na Escola de Saúde Pública de Yale, nos Estados Unidos, que imaginem uma pessoa idosa e compartilhem as cinco primeiras palavras que vêm à mente. Não pensem muito, ela diz a eles.

Levy escreve as respostas no quadro. Elas incluem palavras de admiração como "sabedoria" e "criativo" e papéis como "avó". Mas "'senilidade' aparece bastante", disse Levy recentemente, "e muita enfermidade física e declínio: 'curvado', 'doente', 'decrépito'".

O dr. Robert N. Butler, psiquiatra, gerontologista e diretor-fundador do Instituto Nacional sobre o Envelhecimento, cunhou há meio século o termo "idadismo", que ecoa "sexismo" e "racismo", para descrever os estereótipos e a discriminação contra os idosos.

Idoso caminha em rua no centro de Cambará do Sul (RS) - 06.jun.2016 - Eduardo Knapp/Folhapress

Entre as lembranças no pequeno escritório de Levy em Yale está uma foto preciosa dela com Butler, que morreu em 2010. Pode-se argumentar que ela é sua herdeira.

Psicóloga e pesquisadora de saúde pública, Levy demonstrou –em mais de 140 artigos publicados ao longo de 30 anos e em um novo livro, "Breaking the Age Code" (Rompendo o código da idade, em português)– que o idadismo resulta em mais do que sentimentos de mágoa ou mesmo comportamento discriminatório. Afeta a saúde e o bem-estar físico e cognitivo de maneira mensurável, e pode reduzir anos de vida.

"Assim como aprendemos nas últimas décadas que há estruturas tendenciosas contra mulheres e pessoas não brancas, que levam a piores resultados de saúde, ela mostrou que sentimentos negativos sobre a velhice levam a maus resultados em pessoas idosas", disse a doutora Louise Aronson, geriatra na Universidade da Califórnia em San Francisco e autora do livro best-seller "Elderhood" (A fase idosa da vida, em português).

Outra lembrança no escritório de Levy é um cartão em seu quadro de avisos que diz: "Pergunte-me sobre 7,5". A lembrança veio de uma campanha anti-idade em Wisconsin e se refere ao seu estudo de longevidade de 2002, que durante duas décadas acompanhou centenas de moradores com mais de 50 anos em uma pequena cidade de Ohio.

O estudo descobriu que a sobrevivência média foi 7,5 anos maior para aqueles que tinham as ideias mais positivas sobre o envelhecimento, em comparação com os que tinham atitudes mais negativas.

"Uso isso em praticamente todas as palestras que dou, porque é chocante", disse Tracey Gendron, que preside o departamento de gerontologia da Virginia Commonwealth University e cita o trabalho de Levy em seu recente livro "Ageism Unmasked" (Idadismo desmascarado, em português). "Ela foi realmente uma pioneira."

Levy e sua equipe medem as atitudes em relação ao envelhecimento de várias maneiras. Eles usam questionários ou o mesmo exercício de cinco palavras que ela dá aos alunos, além de testar preconceitos subliminares usando programas de computador que exibem palavras negativas ou positivas sobre o envelhecimento tão rapidamente que os participantes as absorvem sem notar.

Também usaram pequenas amostras experimentais de algumas dezenas de pessoas e rastrearam registros de saúde de milhares por meio de grandes pesquisas nacionais. Graças a seus esforços, sabemos que além da redução da longevidade o idadismo também está associado a:

  • Eventos cardiovasculares, incluindo insuficiência cardíaca, derrames e ataques cardíacos. Usando registros de saúde de quase 400 participantes com menos de 50 anos no Estudo Longitudinal sobre Envelhecimento de Baltimore, "conseguimos acompanhar as pessoas durante 40 anos", disse Levy."Elas tinham um risco duas vezes maior se, na juventude, adotassem estereótipos negativos sobre o envelhecimento." Seus problemas cardiovasculares também ocorreram em idades mais precoces.
  • Função física. Entre 100 idosos (com idade média de 81 anos), aqueles expostos semanalmente a estereótipos de idade positivos implícitos durante um mês tiveram melhores resultados em testes de postura, força e equilíbrio do que os grupos de controle. De fato, aqueles que receberam exposição positiva melhoraram mais do que um grupo experimental de idade semelhante que se exercitou durante seis meses. Em um estudo com residentes de New Haven com mais de 70 anos, aqueles com ideias positivas sobre a idade também eram mais propensos a se recuperar totalmente de deficiências graves do que aqueles com crenças negativas.
  • Doença de Alzheimer. Alguns participantes do estudo de Baltimore passaram por exames cerebrais regulares e alguns doaram seus cérebros para autópsias. Aqueles que mantinham crenças de idade mais negativas em idades mais jovens exibiram um declínio mais acentuado no volume do hipocampo, região do cérebro associada à memória. Eles também exibiram, após suas mortes, mais placas e emaranhados cerebrais que são biomarcadores de Alzheimer.

Outro estudo usou dados da Pesquisa Nacional de Saúde e Aposentadoria que incluiu se os participantes tinham o gene APOE4, que aumenta o risco de Alzheimer. Aqueles com o gene e ideias positivas sobre idade "tinham um risco tão baixo quanto as pessoas sem o gene", disse Levy.

A lista continua. As pessoas mais velhas com visões positivas do envelhecimento apresentam melhor desempenho em testes de audição e tarefas de memória. Elas são menos propensas a desenvolver doenças psiquiátricas como ansiedade, depressão, TEPT (transtorno de estresse pós-traumático) e pensamentos suicidas.

De fato, Levy e seus colegas estimam que a discriminação por idade, estereótipos negativos de idade e autopercepções negativas do envelhecimento levam a US$ 63 bilhões em gastos anuais excedentes em condições de saúde comuns, como doenças cardiovasculares e respiratórias, diabetes e lesões.

Absorvemos esses estereótipos desde a tenra idade, por meio de retratos depreciativos na mídia e contos de fadas sobre bruxas velhas e más. Mas as instituições –empregadores, organizações de saúde, políticas habitacionais– expressam um preconceito semelhante, reforçando o que é chamado de "idadismo estrutural", disse Levy. Reverter isso exigirá mudanças radicais, um "movimento de liberação da idade", acrescentou ela.

Mas Levy encontrou motivos para otimismo: ideias prejudiciais sobre a idade podem mudar. Usando as mesmas técnicas subliminares que medem atitudes estereotipadas, sua equipe conseguiu aumentar o senso de competência e valor entre os idosos. Pesquisadores em muitos outros países replicaram seus resultados.

"Você não pode criar crenças, mas pode ativá-las", disse Levy, expondo as pessoas a palavras como "ativo" e "cheio de vida", em vez de "rabugento" ou "indefeso", para descrever os adultos mais velhos.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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