Descrição de chapéu Barbie

Barbie marca gerações com busca por um padrão de beleza inatingível

Médicos dizem que se inspirar na boneca ou se comparar com sua forma física podem ser gatilhos para transtornos

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Ribeirão Preto

A comissária de voo Natália Turri Facella, 37, é apaixonada pela Barbie desde que se conhece por gente, o que a fez criar e manter uma coleção com cerca de 50 bonecas. Facella já comprou os ingressos para o filme sobre a estrela da Mattel que estreou nesta quinta-feira (20) nos cinemas brasileiros.

Ela está ansiosa pelo longa. Diz, porém, que o padrão Barbie nem sempre foi positivo para ela.

A comissária de voo Natália Facella, 37, é dona de uma coleção com mais de 50 bonecas Barbie - Zanone Fraissat/20.jul.2023 - Folhapress

Morena de olhos e cabelos castanhos, não se identificava com a boneca. A irmã, por outro lado, loira de olhos verdes, era chamada de Barbie na infância. Facella, por tabela, ficou conhecida como "a irmã" da boneca".

"Depois, mais velha, identifiquei isso na terapia, que buscava ser algo que não era meu", conta.

Adultos e crianças foram influenciados pela forma física da boneca, conforme apontam estudos. Tanto a Barbie, como seu parceiro Ken, tiveram suas imagens usadas como referência em procedimentos estéticos. Enquanto trabalhos científicos salientam que os brinquedos influenciaram a autoestima, médicos dizem que se inspirar na boneca ou se comparar com sua forma física pode ser gatilho para transtornos.

No caso do cabeleireiro e tiktoker Marcelo Lima, 37, o boneco parceiro da Barbie foi sempre uma referência. Batizado de "Ken Humano", ele usou o brinquedo como inspiração em procedimentos estéticos. Antes de sua transformação, não se considerava uma pessoa bonita. Passou por bichectomia, rinomodelação e alectomia para afinar o nariz. Também fez clareamento da pele.

"Desde criança eu gostava do boneco e dos modelos de capa de revista. E muita coisa me incomoda ainda, mas parei de fazer [procedimentos] porque a grana está curta agora", diz.

A popularização do feminismo e a luta pela diversidade racial e sexual lançou um desafio para o mundo dos brinquedos. A boneca branca, de cabelos dourados e olhos claros, além de magra, marcou gerações. Mas, nos últimos anos, variações ganharam o mercado, com Barbies negras, com deficiência e algumas até levemente acima do peso (embora a maioria ainda tenha o corpo esguio).

Em 2019, uma pesquisa americana de psicologia comportamental mostrou que a simples existência de Barbies com diversos formatos e tamanhos não era suficiente para que as meninas tivessem uma imagem positiva dessas bonecas. O artigo "You can buy a child a curvy Barbie doll, but you can’t make her like it" (Você pode comprar para uma criança a boneca Barbie com curvas, mas não pode fazê-la gostar dela, em português") foi publicado na revista Body Imagem.

Ao todo, 84 meninas de 3 a 10 anos de idade atribuíram características positivas e negativas às Barbies. A boneca curvilínea foi a que as participantes menos gostaram e que foi mais vezes definida como "não é bonita" (53,6%) e "não tem amigos" (42,9%).

O médico Fábio Salzano, vice-coordenador do Programa de Transtornos Alimentares do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP (Universidade de São Paulo), afirma que a exposição a bonecas com padrões corporais irreais na infância e adolescência pode levar a impactos negativos na forma como a pessoa vê a si mesma, causando até distorção de imagem.

A condição pode levar adultos e adolescentes a buscarem emagrecimento, mesmo com estado nutricional adequado. Isso se dá pelo aumento de atividade física e pela restrição alguns tipos de alimentos, além da diminuição da quantidade de comida ingerida nas refeições, o que pode desencadear transtornos alimentares.

"A imagem corporal engloba sensações, sentimentos, pensamentos e autoavaliações relacionados ao seu corpo, com maior definição na adolescência, porém numa transformação continua ao longo da vida", diz ele.

Um estudo de 2016 feito por pesquisadores ingleses e australianos apontou que a exposição de crianças à Barbie gera efeitos na "internalização do ideal de magreza, estima corporal e insatisfação corporal entre meninas". Eles avaliaram 160 meninas de 5 a 8 anos de idade de escolas particulares e públicas.

Margot Robbie em cena do filme "Barbie", lançado em 20 de julho no Brasil - Warner Bros/Divulgação

Wendell Uguetto, cirurgião plástico da SBCP (Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica) e do Hospital Albert Einstein, afirma que os bonecos não possuem proporções humanas, tornando frustrante a experiência de quem se inspira ou se compara com os brinquedos.

"O paciente querer se tornar algo perto da Margot Robbie [protagonista do novo filme] não é tão ruim quanto querer se tornar a Barbie. Quando o paciente quer ser a boneca, ele tem que causar alterações e disfunções no corpo, são cirurgias muitas vezes que causam sequelas. O próprio nariz da Barbie, se ela fosse uma pessoa, seria um nariz que funcionalmente respira mal", afirma.

O procedimento a ser seguido por médicos nesse caso, segundo Uguetto, é orientar sobre a impossibilidade da intervenção, o que resulta na recusa em fazer a cirurgia. Dependendo da situação, é indicado encaminhar o paciente ao acompanhamento psicológico para lidar primeiro com as questões que o levaram até ali.

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