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Quando desistir não é fracassar e persistir pode fazer mais mal do que bem

Edição da newsletter Todas fala sobre a série da Folha "Eu desisto"

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São Paulo

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No início deste ano, lançamos na Folha a série "Eu desisto". A ideia surgiu após um bate-papo despretensioso sobre um texto que discutia a mediocridade, ou melhor, como ser uma pessoa "na média" parece ter se tornado algo quase inaceitável. Queremos todos ser os melhores, os maiorais.

E, nesse tom, desistir também virou quase sinônimo de fracasso. Mas, será? Questionamos. Não podia ser só isso.

Ilustração para o texto de estreia da série Saúde Mental
Ilustração para o texto de estreia da série Saúde Mental - Catarina Pignato


Brotou, então, a ideia de uma série sobre desistência, que abordaria o tema em diversos aspectos da vida. O trabalho, o romance, a maternidade, o vício, até a morte. O projeto, coordenado pela repórter Bárbara Blum, começa com uma entrevista feita por ela com o psicanalista Adam Phillips, autor de "On Giving Up" (Sobre desistir, em tradução livre), em que ele aponta a ideia de nunca desistir como algo "fascista".

Em um encaixe ideal para a abertura da série, Phillips mostra que o apego à persistência pode fazer mais mal do que bem.

"Tendemos a pensar em desistir, na forma mais simples, como falta de coragem, como uma orientação vergonhosa ou imprópria em direção ao que é assustador e desonroso. Isso significa dizer que tendemos a valorizar e até idealizar a ideia de terminar coisas em vez de abandoná-las", escreve ele na obra, que deve chegar ao Brasil em julho, pela editora Ubu.

A série trata também do tabu de abandonar a faculdade e de como desistir do trabalho dos sonhos pode ser um recomeço. Lembra da marcante história da ginasta Simone Biles, que nas Olimpíadas de Tóquio, em 2021, abriu mão de participar da maior parte das provas para as quais era favorita em nome de sua saúde mental.

Lembro que tive sentimentos mistos na época. Primeiro, confesso, meu lado competitivo achou uma grande burrice. Como a favorita teve coragem de desistir assim, no momento que poderia ter uma grande coroação? Por outro lado, tive uma profunda admiração. Era pandemia, eu trabalhava como repórter de saúde e a minha mente estava em cacos.

Não conseguia abrir mão de nenhuma das mil atividades que fazia todos os dias em prol do meu bem-estar. E não era nada perto de ganhar uma medalha olímpica.

Em 2023, dois anos após Biles deixar de lado as Olímpiadas e "protagonizar a desistência mais impactante já vista no esporte", como bem disse o autor da reportagem Daniel E. de Castro, ela voltou a competir e ganhou cinco medalhas no Campeonato Mundial. Nesse momento, muitos foram os comentários que diziam como priorizar a saúde mental não era sinônimo de derrota.

Mas, e se a ginasta tivesse fracassado, aplaudiríamos sua desistência da mesma forma? Esse foi o tom do questionamento de Anelise Chen, autora de "Esforços Olímpicos", livro que faz reflexões sobre o fracasso e traz exemplos reais de atletas que desistiram.

"Eu me pergunto como a história mudaria se ela desistisse e nunca mais voltasse à ginástica. Ou se voltasse, mas não conseguisse atingir o nível anterior. Celebraríamos da mesma maneira? Acho que só continuamos interessados porque ela conseguiu voltar e ser ainda melhor do que antes", afirmou.

A história me remete novamente ao psicanalista Adam Phillips. Ele quer que seus leitores se perguntem as razões pelas quais nunca desistimos.

"É difícil pensar em desistir. Somos empurrados a aguentar sofrimento, mas esse caminho e o da desistência precisam estar ambos na mesa".

Para ler na Folha

Ainda no tópico de saúde mental, recomendo a leitura da entrevista com Sônia Barros, diretora do Departamento de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas do Ministério da Saúde. Ela diz que a epidemia de ansiedade e depressão só será amenizada mediante melhora socioeconômica.

Mudando de assunto… A repórter Stéfanie Rigamonti fala sobre como a maternidade é uma questão para mulheres que ambicionam cargos de liderança. Aquelas que têm filhos contam como é difícil conciliar vida e carreira em ambientes que exigem muito tempo e dedicação.

Vale ler o texto da Vera Iaconelli, colunista da Folha. Ela questiona a razão que faz a sociedade arbitrar tanto sobre a beleza feminina. "Tudo emerge da convicção de que a mulher não é inteiramente dona de si, devendo estar à disposição da sociedade para satisfazê-la ou reproduzi-la."

Também quero recomendar

Para escutar, o episódio do Café da Manhã que foi ao ar em 19 de janeiro e trata do tema desta edição. Nele, Magê Flores e Gabriela Mayer conversam com a repórter Bárbara Blum sobre a série Eu desisto.

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