O tratamento antirrugas com toxina botulínica do tipo A é o procedimento estético não cirúrgico mais realizado no mundo, segundo a Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (Isaps, na sigla em inglês). Conhecido como "Botox" —nome comercial do produto fabricado pela farmacêutica Allergan Aesthetics—, o composto é derivado da bactéria Clostridium botulinum e relaxa temporariamente as regiões da face em que é aplicado, atenuando linhas de expressão.
Embora estudos demonstrem a eficácia da toxina para atenuar linhas já instaladas e o aumento da satisfação com o próprio rosto após o procedimento, não há experimentos com grandes amostras atestando que ela previna o surgimento de rugas. "O que vemos é uma diminuição observacional", diz a dermatologista Anna Karoline Tomazine, do Hospital Marcelino Champagnat, em Curitiba.
A maioria das pesquisas de longo prazo para analisar o caráter preventivo do tratamento foram feitas com menos de 100 pessoas, e não com milhares, como ocorre em outros segmentos da medicina. Há desafios metodológicos que interferem nessa análise, diz a dermatologista Valeria Zanela Franzon, professora da PUCPR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná).
Genética, estilo de vida, características da musculatura facial e a forma como cada rosto se expressa dificultam comparações precisas por períodos prolongados. "É difícil avaliar dois grandes grupos durante décadas, e entender que um está melhor ou pior do que o outro só porque um fez o tratamento e o outro não. São muitas variáveis envolvidas", diz Franzon.
Uma das saídas que pesquisadores têm encontrado para realizar essa análise é comparar o efeito da toxina entre gêmeos, que partilham da mesma carga genética. Em 2015, a revista Dermatologic Surgery publicou um estudo com duas gêmeas que foram analisadas durante 19 anos. Uma era regularmente tratada com toxina botulínica e a outra não. A irmã tratada esporadicamente tinha mais rugas de repouso e na contração do que aquela tratada de forma regular.
A satisfação é outro aspecto levado em conta em pesquisas longas sobre o assunto. Um estudo multicêntrico —que ocorre de forma simultânea por meio de um mesmo protocolo em diversas instituições— mostrou que pacientes tratados por mais de cinco anos com a toxina se consideravam em média cinco anos mais jovens. "E quanto maior o tempo de tratamento contínuo, mais jovens se consideravam em relação à idade cronológica", diz a dermatologista Ada Trindade, que está entre as autoras do artigo.
O fato de ser um tratamento utilizado há poucas décadas também interfere na quantidade de questões em aberto, o que mostra a importância de se recorrer a profissionais atualizados, como orienta a dermatologista Ligia Colucci, da Allergan Aesthetics.
Utilizada desde os anos 1970 para tratar estrabismo, a toxina botulínica entrou na estética só no fim dos anos 1980, quando a oftalmologista canadense Jean Carruthers e seu marido, o dermatologista Alastair Carruthers, começaram a testá-la para amenizar rugas. Desde então, muita coisa foi descoberta sobre o procedimento, a exemplo do seu papel na melhora de rugas fixas e não apenas das dinâmicas, que se formam quando se movimenta o rosto. "Mas ainda não temos todas as respostas", diz a dermatologista Alexandra Goetze, preceptora de Cosmiatria e Cirurgia do Mackenzie.
Além do caráter preventivo, também tem sido estudada a resistência que o organismo pode adquirir à substância com o passar dos anos. A toxina inibe a liberação de um neurotransmissor responsável pelo movimento muscular, a acetilcolina. Em aproximadamente um mês, o corpo começa a refazer as conexões neurológicas suspensas pelo produto, levando em torno de três meses para restabelecê-las, e é por isso que o efeito dura esse tempo, explica a dermatologista Elisete Crocco, coordenadora de Cosmiatria da.SBD (Sociedade Brasileira de Dermatologia)"
A questão é que, a cada nova aplicação, o organismo pode produzir anticorpos à substância, reduzindo seu efeito a longo prazo, e a ciência ainda não conhece bem esse mecanismo. Suspeita-se que quanto maior a carga proteica da fórmula, maior a chance de produção de anticorpos. A maior frequência de aplicações também pode estar entre os fatores capazes de desencadear o fenômeno, mas essa é ainda uma das incógnitas a serem solucionadas nos próximos anos.
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