A vida e como prolongá-la

Em vez de tratar das doenças próprias da velhice, pode-se corrigi-las em seu início comum, evitando o envelhecimento

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São Paulo

Nos últimos meses, devido à pandemia do coronavírus, temos falado muito sobre doenças e morte. Para animar nosso espirito e fortalecer nosso otimismo quero falar sobre a vida e como prolongá-la.

Desde Ponce de León (século 16) o homem procura a juventude eterna. Entretanto, somente a partir do fim do século passado somam-se evidências de que o envelhecimento é uma doença que pode ser tratada. Identificaram-se os processos intracelulares responsáveis pela progressiva senescência das células. E, mais do que isso, descobriam-se métodos de como retardá-los.

Para entendermos melhor a evolução desses conhecimentos devemos lembrar que, até 1960, o câncer era considerado incurável. Cabia ao médico identificá-lo o quanto antes para tentar sua extirpação. Não sendo possível, tentava-se apenas suavizar o fim inexorável.

Em 1970, contudo, Peter Vogt e Peter Duesberg descobriram que o câncer resulta de uma mutação genética que origina os oncogenes que podem ser bloqueados. Assim, mudaram radicalmente o conceito anterior. O uso desse método em melanomas com metástase cerebrais tem obtido mais de 90% de cura.

Desde o fim da década de 1990, vive-se uma situação análoga para o envelhecimento. Identificou-se sua causa celular em nível molecular e tenta-se retardá-la geneticamente.

Em 2010, a Royal Society (Londres) reuniu os pesquisadores mais notáveis sobre o tema para discutir a questão. Concluíram que o envelhecimento é uma doença que já pode ser tratada e, no futuro, eventualmente curada. Em vez de tratar cada uma das doenças próprias da velhice, preconizaram corrigi-las todas no seu início comum, ou seja, evitando o envelhecimento.

Apesar de que em 1870 a expectativa de vida média era 37 anos e, hoje, uma criança nascida no Japão, tem mais de 50% de chance de viver até 105 anos, o conceito de que o envelhecimento é inevitável e que a morte não pode ser retardada continua profundamente enraizado na mente humana.

Porém o convencimento do contrário é indispensável para que se adotem as recomendações atuais para atingir o benefício das novas descobertas.

De fato, o seu conhecimento deve estimular uma modificação na nossa maneira de viver. Se antes não valia a pena fazer sacrifícios para tentar viver mais e melhor, atualmente eles se tornam quase obrigatórios. Devemos estar preparados para abrir mão de alguns prazeres, adquirir novos hábitos, adotar uma alimentação adequada e ingerir medicamentos e suplementos que facilitem os processos de reparação celular.

Atualmente entende-se o envelhecimento como decorrente da seguinte sequência de fatos:

• Todas as células contêm DNA que no conjunto constituem o nosso genoma;
• O funcionamento das células é modulado por várias substâncias químicas intra e extracelulares, entre as quais as denominadas sirtuínas, que no conjunto constituem o epigenoma do qual depende nossa sobrevivência e longevidade;
• A cada dia, 2 trilhões de nossas células se quebram, exigindo reparo do seu DNA, que é regulado pelo epigenoma;
• Com o decorrer desses reparos, o epigenoma se desgasta causando progressiva perda da integridade das células. Esse processo é responsável pelo nosso envelhecimento e ao final pela nossa morte.

Se existem, ainda não foram identificados os genes responsáveis pelo envelhecimento (como ocorreu para o câncer). Dessa forma, só nos resta interferir no epigenoma. Essa interferência é feita por agressões intermitentes, não mortais (hormeses), que exacerbam os processos metabólicos de defesa celular.

Vários estímulos podem agir nesse sentido: jejum intermitente, como adotado por motivos religiosos na ilha de Okinawa, rica em centenários e em ratos atrofiados por falta de alimentos que vivem mais, o equivalente a 120 anos para os humanos, mesmo se a falta de alimentos é iniciada tardiamente; variações de temperatura (sauna e banhos gelados); exercício e administração de drogas capazes de provocar baixos níveis de estresse, como rapamicina, metformina e resveratrol, este presente no vinho tinto (principalmente de uvas Pinot Noir).

Em ratos, a administração de metformina aumentou a vida em 20%, e um estudo com 41 mil usuários desse medicamento demonstrou também redução sensível de moléstias cardíacas, câncer, fraqueza e depressão. Em base desses dados, conclui-se que nossos genes não foram criados para viver em conforto contínuo e que pequenas adversidades intermitentes podem atrasar o envelhecimento.

No futuro, se conseguirmos redefinir o epigenoma como um todo, poderemos chegar à perpetuidade e teremos que rever o significado atual do ser humano. Atualmente, no Vale do Silício investem-se bilhões de dólares para tentar obter essa redefinição completa.

Procura-se produzir uma molécula (reversine) capaz de reprogramar e rejuvenescer as células envelhecidas construindo um chip capaz de localizar exatamente quais genes estão se expressando inadequadamente em um órgão doente e corrigi-los.

Entretanto, nenhum projeto é tão ambicioso quanto aquele que usa bilhões ou trilhões de nanorobôs capazes de reparar ou aprimorar completamente o DNA intracelular, dentro dos genes. Acredita-se que somando todos esses benefícios poderemos prologar a vida até os 113 anos.

Em base de todos esses conhecimentos recentes e outros já sedimentados, recomenda-se:

• Beber de 8 a 10 copos de água por dia, evitando água de torneira;
• Comer lentamente pequenas refeições, se possível pulando uma por dia;
• Um indivíduo com 68kg, moderadamente ativo, deve ingerir 2.050 calorias com 94g de carboidratos e não mais de 25% de gordura;
• Evitar amido, açúcar, pães, massas, batata, arroz, leguminosas, crustáceos e miúdos;
• Ingerir hortaliças frescas que crescem acima do solo com ao menos 10/15 gramas de fibras por dia;
• Evitar margarina e substituir óleo de milho por óleo de oliva extra virgem (nunca aquecendo-o acima de 200°C);
• Evitar sacarina e similares, usar stevia;
• Reduzir o consumo de bebidas alcoólicas;
• Fazer exercício regularmente (caminhar 30 minutos);
• Diminuir o estresse —relacionamento com família, amigos e hobbies;
• Tomar por dia: 1 grama de resveratrol, 1 grama de metmorfina, 83mg de aspirina e quantidades adequadas de vitaminas D e K2.

Finalizando, vale comentar que, teoricamente, o aumento do tempo de nossas vidas acarretará uma série de modificações na estrutura atual da sociedade humana, nem todas desejáveis. No entanto devemos fazê-lo acreditando no Homo sapiens, que sempre se adaptou às modificações que lhe foram impostas pelo progresso. Assim, também saberá fazê-lo em relação ao prolongamento de sua vida com a sabedoria que os anos adicionais certamente lhe oferecerá.

Silvano Raia, 89, é professor Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

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