Descrição de chapéu Coronavírus

Covid-19 traz mais riscos para doentes crônicos, e isso é ruim para os EUA

Condições associadas a maior probabilidade de morte são mais prevalentes entre americanos do que em outros países

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Jason Douglas Russell Gold
The Wall Street Journal

​Cientistas estão delineando uma visão mais clara do risco extra de morte por Covid-19 para pessoas portadoras de problemas de saúde subjacentes. É um aspecto da doença que, segundo cientistas, pode ajudar a explicar por que alguns países têm epidemias piores que outros.

A má notícia para os EUA é que algumas das condições associadas ao risco mais alto de morte, como obesidade, doenças cardíacas e diabetes, são mais prevalentes nos EUA que em outros países comparáveis.

“Se tivéssemos resultados de saúde melhores, se tivéssemos menos diabetes, menos hipertensão, menos doença cardiovascular, provavelmente não veríamos morbidade e mortalidade tão altas quanto estamos vendo com a Covid-19”, disse Monique Brown, professora de saúde pública na Universidade da Carolina do Sul.

Paciente com Covid-19 é tratado em UTI de hospital em Houston, no Texas - Go Nakamura - 28.jul.20/Getty Images/AFP

Cerca de 15 milhões de pessoas em todo o mundo já foram infectadas pelo novo coronavírus, segundo dados compilados pela Universidade Johns Hopkins. Mais de 624 mil mortes em todo o mundo foram atribuídas à Covid-19, a doença provocada pelo vírus, sendo 143 mil delas nos EUA.

Os números de casos vêm aumentando em grande parte dos EUA desde que as restrições à vida diária foram suspensas.

Más condições de saúde subjacente podem estar contribuindo para a gravidade da pandemia nos EUA e outros países fortemente atingidos, dizem pesquisadores, com a ressalva de que políticas públicas, fatores demográficos, geográficos e outros também exercem um papel.

Os EUA notificaram 432 mortes por milhão de pessoas, um índice de mortalidade mais alto que a maioria dos países, mas inferior ao de outros países ricos, incluindo o Reino Unido, França, Itália e Suécia, segundo pesquisadores da Universidade de Oxford.

Desde o início da pandemia, médicos notaram que pessoas com problemas médicos preexistentes figuravam entre as mais afetadas. Análises de pacientes em Wuhan e outras áreas da China indicaram que muitos dos pacientes mais doentes sofriam de hipertensão, diabetes e outros problemas crônicos comuns.

O padrão se repetiu à medida que o coronavírus se alastrou pelo mundo. Dados da Itália mostram que menos de um em cada 20 dos cerca de 3.000 pacientes que morreram de Covid-19 nesse país não tinham problemas de saúde crônicos antes de contrair a infecção. Quase dois terços tinham três ou mais comorbidades, ou doenças crônicas. Médicos no Reino Unido e França fizeram observações semelhantes.

Um relatório recente do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) destacou que 76,4% das pessoas que morreram de Covid nos EUA tinham pelo menos uma condição médica preexistente. Até meados de julho, o Massachusetts havia notificado 4.071 óbitos de pacientes com comorbidades –e apenas 73 sem nenhuma.

O volume crescente de dados sobre pacientes com Covid-19 está permitindo aos cientistas estimar a variação do risco de doença grave ou morte, dependendo das comorbidades existentes.

Em artigo publicado este mês pelo periódico Nature, pesquisadores da Universidade de Oxford e da London School of Hygiene and Tropical Medicine examinaram as fichas médicas de 17 milhões de residentes na Inglaterra para determinar quais fatores estão ligados ao risco mais alto de morte por Covid-19.

A idade foi de longe o fator mais significativo, relataram os autores do artigo. Pacientes na casa dos 80 anos tinham 20 vezes mais chances de morrer de Covid do que outros na casa dos 50, depois de levar em conta todos os outros fatores.

Mas pessoas com doenças crônicas têm risco maior de morte do que pessoas sem essas condições, mostrou a análise. Os diabéticos com alto nível de açúcar no sangue têm chance de morrer de Covid quase duas vezes maior que os não diabéticos. Doenças do coração, rins e fígado também estão associadas a um risco de mortalidade maior.

Um fato peculiar é que os pesquisadores constataram que pessoas com asma não parecem correr risco maior de morte por Covid que as que não têm. É intrigante, dado que os asmáticos geralmente são mais afetados por outros vírus respiratórios, disse Ben Goldacre, diretor do Evidence-Based Medicine DataLab da Universidade de Oxford e um dos autores principais do estudo.

Outro estudo recente, este publicado no periódico Diabetes, Obesity and Metabolism, reuniu os resultados de 18 estudos de todo o mundo cobrindo mais de 14 mil pacientes com Covid-19 e concluiu que o risco de doença grave ou morte por coronavírus é pelo menos 1,5 vez mais alto para pessoas com condições que incluem diabetes, doenças crônicas renais, cardíacas e pulmonares e câncer, comparadas com adultos saudáveis.

Mais de um quinto dos pacientes hospitalizados cobertos no estudo tinha hipertensão. Mais de um em cada dez tinha diabetes.

A conexão entre comorbidades e resultados mais graves de Covid é problemática para os EUA, onde muitos dos fatores complicadores são mais prevalentes.

Paciente com Covid-19 e diabetes é transferido de hospital na Cidade do México - Edgard Garrido - 8.jun.20/Reuters

A Commonwealth Fundo, firma independente de pesquisas de saúde, informou que 28% dos adultos nos EUA apresenta várias condições crônicas como diabetes e doença cardíaca, contra 14% dos residentes na Holanda, 17% dos alemães e 18% dos franceses.

Entre o grupo das sete economias mais avançadas, os habitantes dos EUA apresentam o risco mais alto de morrer entre os 30 anos e 70 anos de doença cardíaca, câncer, diabetes ou doença pulmonar crônica, segundo a OMS.

Ajustada para idade, a taxa de mortalidade nos EUA em 2016 dessas quatro grandes doenças não transmissíveis foi também a mais alta no G-7 e quase o dobro da do Japão, que tem a taxa mais baixa.

“Acho que isso transmite a mensagem profunda de que muitos de nós, entre os quais eu me incluo, podemos e devemos fazer mais para conservar nossa saúde para os momentos em que nossa saúde está sob ataque, como quando você tem gripe ou tem Covid”, disse Andrew Badley, médico de doenças infecciosas e presidente da força-tarefa de pesquisas sobre a Covid-19 da Clínica Mayo.

Não está inteiramente claro por que essas condições crônicas são tão problemáticas para os doentes com Covid, fato que ressalta quão pouco é sabido sobre a doença desde que ela primeiro apareceu, em dezembro.

“Boa parte da patogenia não é claramente compreendida”, comentou Trish Perl, chefe da divisão de doenças infecciosas do University of Texas Southwestern Medical Center, em Dallas.

Kamlesh Khunti, professor de atendimento à diabetes em clínica geral e de medicina vascular na Universidade de Leicester, no Reino Unido, desconfia que a resposta imunológica inflamatória frequentemente desencadeada pela Covid-19 pode interagir com inflamação crônica decorrente de algumas dessas comorbidades, agravando os sintomas.

Para alguns médicos, a explicação mais provável é que a saúde fraca reduz a capacidade das pessoas de enfrentar uma infecção viral.

“Cada comorbidade que você tem reduz suas reservas fisiológicas”, disse Amesh Adalja, acadêmico sênior na Universidade Johns Hopkins.

Tradução de Clara Allain

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