Pacientes com sintomas duradouros de Covid se sentem melhor após vacina

Ainda é cedo para dizer se a imunização teve amplo benefício nessas pessoas, mas cientistas começam a estudar o fenômeno

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Pam Belluck
The New York Times

Judy Dodd começou a lutar contra os sintomas duradouros da Covid na última primavera no hemisfério Norte (outono no Brasil) —falta de ar, dor de cabeça, cansaço. Então, ela foi vacinada.

Depois da primeira dose da Pfizer-BioNTech, no final de janeiro, Judy se sentiu tão mal fisicamente que teve de ser convencida a tomar a segunda. Durante três dias depois, ela também se sentiu péssima. Mas, no quarto dia, tudo mudou.

"Eu acordei e pensei 'Que linda manhã!'", disse a professora, que também é atriz e diretora. "Foi como se eu estivesse dirigindo 'Sweeney Todd' há meses e, de repente, estava dirigindo 'Oklahoma'."

Judy, que continua se sentindo bem, é uma das várias pessoas que estão relatando que os sintomas pós-Covid que tiveram durante meses começaram a melhorar desde que foram vacinadas. É um fenômeno que médicos e cientistas estão observando de perto, mas, como em diversos pontos relacionados à pandemia, há muitas incertezas.

Além das pessoas que relatam sentir-se melhor após as injeções, muitas dizem que não sentiram mudanças e um pequeno número afirma que se sentiu pior.

Os relatos dos médicos também variam. Daniel Griffin, especialista em doenças infecciosas na Universidade Columbia, disse que cerca de 40% dos pacientes antigos de Covid que ele trata citam melhoras dos sintomas após a vacinação. "O cansaço não é tão grande e, às vezes o olfato retorna", afirma Griffin.

Outros médicos dizem que ainda é cedo para saber ao certo. "Muito poucos participantes foram vacinados até agora para realmente termos uma visão maior dessa questão", disse Michael Peluso, especialista em doenças infecciosas que trabalha em um estudo de pacientes antigos de Covid na Universidade da Califórnia.

Neste mês, um pequeno estudo feito por pesquisadores britânicos que ainda não foi revisado por pares descobriu que, oito meses depois de serem hospitalizadas por Covid-19, as pessoas vacinadas experimentaram melhora mais significativa em sintomas duradouros da doença do que as que ainda não tinham sido imunizadas. Os 44 pacientes vacinados no estudo eram idosos e tinham problemas de saúde subjacentes.

Um mês após a vacinação, esses pacientes relataram melhora em 23% dos sintomas antigos de Covid, enquanto 5,6% dos sintomas pioraram. As 22 pessoas que não foram vacinadas disseram que 15% de seus sintomas tinham melhorado, enquanto 14% dos sintomas pioraram. Não houve diferença nas respostas entre pessoas que receberam vacinas da Pfizer-BioNTech e da AstraZeneca.

Mais informações vêm de duas outras pesquisas.

Um estudo com 345 pessoas, na maioria mulheres do Reino Unido, descobriu que duas semanas ou mais depois da segunda dose 93 delas se sentiram ligeiramente melhor e 18 voltaram ao normal —32% relataram redução dos sintomas duradouros.

Nessa pesquisa, quase 18%, se sentiram pior e quase a metade relatou não sentir diferença.

Outro estudo, da Survivor Corps, grupo com mais de 150 mil sobreviventes da Covid, concluiu que 225 dos 577 participantes relataram alguma melhora, enquanto 270 não perceberam mudança e 82 se sentiram pior.

Jim Golen, 55, de Minnesota, acha que alguns sintomas persistentes da Covid se agravaram depois da vacinação. Ex-enfermeiro e fazendeiro, ele havia sentido dificuldades durante meses, incluindo coágulos sanguíneos nos pulmões, dor no peito, névoa cerebral, insônia e dificuldade para respirar.

Desde que recebeu a segunda dose da Pfizer, Golen afirmou que a dor no peito e a respiração curta voltaram. De todo modo, ele disse que ficou "muito feliz" por ser vacinado, enfatizando que os efeitos da Covid eram piores e assim evitou que se agravassem.

Algumas pessoas contaram histórias de grande melhora nos sintomas, como Laura Gross, 72, de Nova Jersey. Ela citou uma longa lista de sintomas debilitantes da Covid que apresentava desde abril e, três dias depois de sua primeira vacina da Moderna, no final de janeiro, tudo mudou. "Foi como uma revelação", disse. "Parecia meu antigo eu."

Você pode se sentir melhor pelo efeito placebo, mas é improvável que seu coração passe de 100 para 60 por causa de um efeito placebo. E se continuarmos vendo esse padrão seria um achado

Eric Topol

Professor de medicina molecular no Instituto de Pesquisa Scripps

Isso continuou depois da segunda dose. "É como se minhas células tivessem enlouquecido no ano passado quando conheceram a Covid", explicou ela, e "a vacina disse: 'Espere, não é assim que se luta contra as coisas, faça deste jeito'."

Os cientistas dizem que compreender esses quadros poderá ajudá-los a desvendar as causas subjacentes de diferentes sintomas e potenciais tratamentos.

"Talvez exista um subconjunto de pessoas que têm um certo tipo de Covid longa, que reagem bem às vacinas, mas pode haver outras pessoas que têm um subtipo diferente que ainda não definimos bem", diz Adam Lauring, virologista e médico de doenças infecciosas na Universidade de Michigan.

Akiko Iwasaki, imunologista na Universidade Yale, afirma que uma vacina, ao gerar anticorpos à proteína espícula do coronavírus, poderia eliminar vestígios do vírus ou restos do RNA viral que podem estar em alguns pacientes. Se isso estiver ocorrendo, diz ela, pode sugerir que a vacina "talvez seja uma cura permanente" para esses pacientes.

Akiko explica que a vacina também pode ajudar as pessoas cujos sintomas duradouros de Covid podem ser causados por uma reação pós-viral parecida com uma doença autoimune se "a vacina estimular reações imunes inatas que restringem esses tipos de reações autorreativas". Mas, com base nas experiências de pacientes com outras doenças autoimunes, esse alívio "não duraria muito, e mais ou menos se reverteria", com sintomas como fadiga.

Eric Topol, professor de medicina molecular no Instituto de Pesquisa Scripps, na Califórnia, está iniciando um estudo com pessoas com Covid duradoura antes que elas recebam a vacina e semanas depois. "Realmente gostaríamos de ter uma métrica objetiva", disse ele. "Você pode se sentir melhor pelo efeito placebo, mas é improvável que seu coração passe de 100 para 60 por causa de um efeito placebo. E se continuarmos vendo esse padrão seria um achado."

(Pam Belluck escreve sobre saúde e ciência, é ganhadora dos prêmios Pulitzer e Nellie Bly e autora do livro "Island Practice")

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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