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'Adolescente não se vacina contra Covid por receio com a segurança', diz médico

Imunização dos mais jovens alcança percentual menor do que o de adultos

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São Paulo e São Luís

Enquanto o governo estadual e o federal trocam acusações sobre a falta de imunizantes para aplicar a segunda dose em São Paulo, a capital paulista lida com um outro problema: a baixa adesão dos mais jovens à vacinação.

Pelo plano das autoridades, a vacinação de adolescentes teria sido completada na semana anterior à do 7 de Setembro, para que o estado avançasse com a aplicação da terceira dose nos idosos.

A terceira dose começou, mas a vacinação dos adolescentes não terminou. Entre os que têm de 15 a 17 anos, por exemplo, tinham se imunizado 73%. No segmento de 12 a 14 anos com comorbidades, deficiência física permanente, grávidas e puérperas, o índice foi bem menor: somente 33% tinham se vacinado.

Uma das explicações para essa baixa adesão na vacinação de adolescentes é a obrigatoriedade da presença de um adulto ou responsável, afirma Sabine Pompéia, professora de cognição humana da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).

Na cidade de São Paulo, por exemplo, é obrigatória a presença de um responsável direto, como pai e mãe, ou de algum adulto com uma declaração assinada pelo responsável.

Pompéia, que pesquisa comportamento de adolescentes, afirma que é comum as pessoas nessa faixa etária terem posições pouca flexíveis. Alguns seguem estritamente os protocolos sanitários contra a Covid, enquanto outros desconsideram as regras.

Além disso, a presença obrigatória de um responsável complica a equação, diz Pompéia. Se o jovem quer se vacinar, mas seus pais não querem levá-lo por qualquer motivo, a imunização não vai acontecer.

O desfecho é o mesmo quando os pais simplesmente não podem levar o filho, em geral por razões socioeconômicas. “Muitas famílias não têm o luxo de ter flexibilidade de horário no trabalho. Então é sempre bom lembrar que essa situação [de obrigação do adulto na vacinação] pode ser muito complicada”, afirma.

Marco Aurélio Sáfadi, professor de infectologia e pediatria da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, afirma que a análise de risco e benefício é outro fator que pode influenciar a atitude dos mais jovens.

Como adolescentes são menos suscetíveis à Covid, alguns podem acabar dando mais peso às eventuais reações adversas num cálculo entre o risco do efeito colateral e o benefício da imunização.

O raciocínio, contudo, é equivocado. Safádi lembra que os efeitos adversos das vacinas contra Covid em jovens são irrisórios e que a taxa de mortalidade da doença entre crianças e adolescentes no Brasil é maior.

Ele chama a atenção ainda para a ascensão de novas variantes mais transmissíveis, como a delta. “A experiência da delta nos Estados Unidos, onde ela está circulando com mais intensidade nos grupos não vacinados, destaca a importância de ter a vacinação em adolescentes. Quando a delta se espalhar [no Brasil], ela vai crescer entre os não vacinados, tanto em adultos quanto em crianças e adolescentes”, diz.

Tanto Safádi quanto Pompéia afirmam que uma solução para aumentar a vacinação entre adolescentes seria realizar campanhas nas escolas que já reabriram.

Safádi menciona casos de países que aplicaram a política de vacinação nas escolas, como Reino Unido e Austrália, e conseguiram imunizar com as principais vacinas recomendadas para essa faixa etária.

Para Renato Kfouri, diretor da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações), falou-se muito que não era para vacinar crianças, relevando a um plano menos urgente a imunização desse grupo, o que pode ter sido mal compreendido pela população.

"O grande problema é a confiança. As vacinas precisam demonstrar segurança e efeitos colaterais aceitáveis dentro dessa população. O que faz um adolescente não se vacinar ou a família não autorizar a vacinação é o receio com a segurança", diz.

"Não é a falta de acesso, as fake news, grupo antivacina. Enfrentamos tudo isso nos adultos e as coberturas são excelentes. Vamos enfrentar um desafio maior que é a comunicação de que essas vacinas são seguras para adolescentes e depois para a população pediátrica", afirma Kfouri.

Ele alerta para os riscos que a Covid oferece para os mais jovens, mesmo que os números pareçam mostrar outra coisa.

“Cerca de 2% das hospitalizações aconteceram neste grupo. Cerca de 0,35% do total de óbitos foram em menores de 20 anos", diz. "Mas estamos falando de 0,35% no total de quase 600 mil óbitos. Mais de 2.000 crianças e adolescentes perderam a vida para a Covid. É mais do que todas as outras doenças que têm vacina e mataram nos últimos anos”, afirma.

Segundo o médico, entre zero e 20 anos, dois grupos possuem o risco aumentado: menores de dois e os maiores de 11. "A vacinação do adolescente é importantíssima, porque a carga da doença, embora menor do que a de adultos, ainda assim é enorme. Tem complicações como a síndrome inflamatória, a Covid longa, o risco que não é desprezível e é muito maior do que as outras doenças que vacinamos crianças e adolescentes".

No Distrito Federal, a professora Kamila Braga Rodrigues, 24, que leciona sociologia para alunos do segundo ano do ensino médio no Centro Educacional 4 de Taguatinga Norte, deparou-se com a rejeição à vacina dentro da sala de aula. Ela conseguiu reverter o quadro.

Quando teve início a vacinação para jovens com 17 anos, Rodrigues perguntou se todos na classe estavam felizes com a possibilidade de se imunizarem.

"Para minha surpresa, a resposta foi não", conta. "Alguns disseram ter medo da reação, como dor de cabeça e no braço, alguns disseram que tinham medo de agulha e outros disseram que não iriam no primeiro dia para não enfrentar fila."

Rodrigues não se deu por vencida. Pediu aos alunos que fizessem pesquisa científica sobre imunização e o controle da pandemia. "Eu queria que eles se conscientizassem sobre a importância de tomar a vacina", diz.

Mas o que funcionou mesmo foi outro incentivo. Ela pediu que cada um apresentasse o cartão de vacina com a data da dose recebida. Em troca, teria um ponto extra na média.

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