Descrição de chapéu Coronavírus

Máscara deve ser usada com rigor na aglomeração, diz secretário de SP

Jean Gorinchteyn afirma que paulistas precisam carregar proteção 'no bolso' e que governo nunca falou que a pandemia acabou

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São Paulo

Desde que o governo do estado de São Paulo anunciou a flexibilização no uso de máscaras em ambientes fechados, duas semanas atrás, a proteção desapareceu dos rostos de boa parte da população.

Segundo o secretário estadual da Saúde, Jean Gorinchteyn, o lugar dela agora é "no bolso dos paulistas". "Para que, numa aglomeração eventual, possam fazer o seu uso de forma bastante rigorosa", disse à Folha.

A explicação do secretário, no entanto, destoa tanto do anúncio do então governador João Doria (PSDB), que falou em "volta à normalidade", quanto da campanha oficial do governo em redes sociais, que nem sequer menciona as recomendações de uso da proteção para determinados grupos e situações.

Jean Gorinchteyn em mutirão de vacinação no parque Villa Lobos, na capital paulista, no último domingo (27) - Bruno Santos - 27.mar.2022/Folhapress

"Houve a orientação de preservação de máscaras em populações específicas, como mulheres grávidas, idosos, portadores de doenças crônicas e alterações em sua imunidade", complementa o secretário. Por que essas informações não constam da campanha? Em entrevista, ele não soube dizer.

Um dos anúncios da campanha oficial do governo celebra a retirada de um ícone da pandemia, símbolo de cuidado com a própria saúde e com a dos outros ao veicular a imagem de uma mulher que remove a máscara, revelando um sorriso.

A foto é acompanhada de termos como "flexibilização" e "liberação". Assim, é passada a ideia de que máscaras não são mais necessárias, ao contrário do que defendem especialistas.

Anúncio do governo de SP sobre flexibilização de máscaras - Divulgação

"Tivemos o nosso papel de responsabilidade de trazer essas informações à população. Se a campanha está assim, levarei isso para a Secretaria de Comunicação", admite o secretário após ser informado sobre a ausência de recomendação de uso de máscaras por certos grupos na publicidade.

Como termo de comparação, a campanha da prefeitura de Campinas (SP) traz uma lista de locais em que o uso da proteção continua obrigatório, seguida de pessoas e situações em que o uso é recomendado e das circunstâncias em que estar com a máscara é meramente opcional.

"A flexibilização de máscaras é algo que convida ao não uso", avalia a infectologista Raquel Stucchi, professora da Unicamp. "E a campanha do governo de São Paulo faz uma exaltação de liberdade", critica.

O secretário paulista defende que a elevada cobertura vacinal na população no estado de São Paulo (93,2% com pelo menos uma dose e 85,74% com duas doses ou dose única, segundo dados do Vacinômetro na noite desta sexta-feira) possibilita a desobrigação do uso da proteção neste momento.

E, segundo Gorinchteyn, o governo está preparado para reagir rapidamente em caso de piora nos indicadores.

"É por isso que nós estamos hoje em uma situação de continuar avaliando os índices de saúde e, eventualmente, se for necessário, retrocedermos em alguma medida assim será feito", diz. "A Covid veio para ficar."

Diferentemente de anúncios anteriores sobre políticas para a pandemia, em que João Doria se apresentou ladeado por parte dos nove médicos que compõem o comitê científico de seu governo, em 17 de março, o presidenciável tucano anunciou a flexibilização do uso da proteção sozinho e em rede nacional, no programa "Cidade Alerta", de José Luiz Datena.

"Acabo de receber autorização do comitê de saúde de São Paulo", afirmou Doria para legitimar o fim da obrigatoriedade do uso de máscaras em locais fechados. "Podemos voltar a sorrir", disse, em tom de campanha.

Críticos da mudança apontaram para a prematuridade da medida, seus riscos e suas potenciais motivações.

O governador João Doria, durante participação em programa do apresentador José Luiz Datena - Reprodução Band

"As pessoas estão retornando a atividades presenciais, com potencial aglomeração, numa época do ano em que infecções respiratórias já são mais frequentes", avalia Stucchi.

"Há pessoas, incluindo os não vacinados, que têm risco de adoecimento grave. E nos locais onde há maior circulação do vírus, o uso de máscaras é fortemente recomendado."

Apesar de ter sido tratada pelo governo e pelo coordenador do comitê científico, Paulo Menezes, como uma decisão unânime, a Folha apurou que a medida não foi consensual entre os médicos do grupo que aconselha tecnicamente o governador sobre a pandemia.

Parte deles segue fazendo uso de máscaras em locais fechados, onde o governo relaxou o uso, e, assim como colegas, prefere esperar pelo comportamento do vírus nas próximas semanas antes de diminuir a proteção.

A alta de casos de Covid na Europa e na Ásia acende alerta para o Brasil, especialmente em um momento de flexibilização das medidas não-farmacológicas.

Ao longo de pouco mais de dois anos de pandemia, as ondas de aumento de contaminação e de óbitos por Covid emergiram nesses locais e chegaram ao Brasil cerca de seis semanas depois.

Segundo Gorinchteyn, o fato de a China decretar um lockdown, confinando quase 40 milhões de pessoas após um surto com milhares de infecções registradas por dia, representa uma estratégia que, aqui, não teria paralelo.

"Essa é uma realidade deles porque eles entendem que a detecção do vírus, mesmo em indivíduos assintomáticos em um local na China, leva a essa medida. Mas aqui nós estamos, duas semanas após a retirada da obrigatoriedade das máscaras, em queda progressiva dos números de internações", afirma o secretário.

O médico e infectologista Drauzio Varella afirmou, em sua coluna na Folha, que a medida do governo de São Paulo foi adotada por razões políticas.

Desde o segundo semestre de 2021, o presidenciável João Doria pressiona o comitê para abolir o uso obrigatório de máscaras em São Paulo. A proteção serve como lembrete permanente de que o coronavírus ainda circula, e de que a Covid-19 ainda mata muitos brasileiros diariamente.

Responsável pela primeira vacina disponível no país, a Coronavac, Doria conta com seu desempenho no combate à pandemia como ativo da campanha presidencial que lutou para disputar.

O presidenciável tucano enfrenta desafios a sua candidatura dentro de seu partido. A última pesquisa Datafolha apontou que ele tem apenas 2% das intenções de voto no momento. Na última quinta (31), rumores de sua desistência da corrida presidencial agitaram o meio político, mas acabou por manter a candidatura.

Desde que liberou o uso de máscaras em locais fechados, diversos estabelecimentos comerciais e culturais, bem como as três universidades estaduais paulistas —USP, Unesp e Unicamp—, comunicaram que o uso da proteção seria mantido em espaços fechados e recomendado em aglomerações nos ambientes abertos.

Para Gorinchteyn, a autonomia das universidades paulistas –assim como de todos os estabelecimentos comerciais— possibilita manter a indicação de uso. "O que não pode é determinação de flexibilização maior do que aquela estabelecida pelo governo", afirma.

De acordo com o secretário, tais decisões são feitas segundo as próprias avaliações das entidades, com base no número de pessoas que irão retornar presencialmente.

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