Cirurgia de ponte de safena é mais perigosa para mulheres do que para homens

Procedimento evoluiu ao longo dos anos, mas disparidade de gênero persiste

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Paula Span
The New York Times

No último Dia de Ação de Graças, Cynthia Mosson passou o dia todo em pé na cozinha em Frankfort, Indiana [EUA], preparando o jantar para nove pessoas. Ela estava quase terminando —o presunto no forno, a farofa pronta— quando, de repente, sentiu a necessidade de se sentar.

"Comecei a sentir dor no ombro esquerdo", diz Mosson, 61. "Ficou muito intenso e começou a descer pelo meu braço." Ela ficou suada e pálida e disse à sua família: "Acho que estou tendo um ataque cardíaco".

Cynthia Mosson
Cynthia Mosson, 61, se recupera de uma cirurgia de emergência de coração aberto no ano passado, em Frankfort, Indiana - Kaiti Sullivan/The New York Times

Uma ambulância a levou rapidamente para um hospital, onde os médicos confirmaram que ela havia sofrido um ataque cardíaco leve. Eles falaram que os exames revelaram bloqueios graves em todas as suas artérias coronárias e disseram a ela: "Você vai precisar de uma cirurgia de coração aberto", lembra Mosson.

Quando os pacientes entram em uma sala de cirurgia, o que acontece em seguida tem muito a ver com seu sexo, relata um estudo recente no Jama Surgery. A pesquisa reforçou anos de levantamentos mostrando que pacientes do sexo masculino e feminino podem ter resultados muito diferentes após uma operação chamada cirurgia de revascularização do miocárdio [conhecida como ponte de safena].

O procedimento restaura o fluxo sanguíneo ao pegar artérias dos braços ou do peito dos pacientes e veias das pernas e usá-las para desviar os vasos sanguíneos bloqueados.

"É a operação cardíaca mais comum nos Estados Unidos", ocorrendo de 200.000 a 300.000 vezes por ano, diz Mario Gaudino, cirurgião cardio-torácico da Weill Cornell Medicine e autor principal do estudo.

Vinte e cinco por cento a 30% dos pacientes submetidos à cirurgia de revascularização do miocárdio são mulheres. Como elas se saem? A taxa de mortalidade para a ponte de safena, embora baixa, é muito maior para as mulheres (2,8%) do que para os homens (1,7%), descobriram Gaudino e seus colegas.

Analisando os resultados de cerca de 1,3 milhão de pacientes (idade média: 66 anos) de 2011 a 2020, os pesquisadores também determinaram que, após a cirurgia de revascularização do miocárdio, cerca de 20% dos homens tiveram complicações que incluíram derrames, insuficiência renal, cirurgias repetidas, infecções do esterno e uso prolongado de ventilador e internações hospitalares. Entre as mulheres, mais de 28% tiveram.

Dessas complicações, "muitas são relativamente menores e se resolvem sozinhas", diz Gaudino. Mas a recuperação de infecções na ferida esternal pode levar meses e "se você tem um derrame, isso pode afetá-lo por muito tempo", observa. Embora os resultados tenham melhorado para ambos os sexos ao longo da década, a diferença de gênero permaneceu.

O estudo "deve ser considerado como um sinalizador explosivo no céu para todos os clínicos que cuidam de mulheres", diz editorial. No entanto, para pesquisadores cardíacos, os resultados soaram familiares.

"Isso é algo que sabemos desde a década de 1980", diz C. Noel Bairey Merz, cardiologista e pesquisadora do Cedars-Sinai Medical Center. A doença cardíaca, ela apontou, continua sendo a principal causa de morte entre as mulheres americanas.

Com a cirurgia de revascularização do miocárdio, "a suposição geral era de que estava melhorando porque a tecnologia, o conhecimento, as habilidades e o treinamento estavam todos melhorando", diz ela. Ver a disparidade de gênero persistir "é muito decepcionante".

Vários fatores ajudam a explicar essas diferenças. As mulheres têm de três a cinco anos a mais do que os homens quando passam por uma cirurgia de bypass, em parte porque "reconhecemos a doença arterial coronariana com mais facilidade e mais cedo nos homens", afirma Gaudino. "Os homens têm a apresentação clássica que estudamos na faculdade de medicina. As mulheres têm sintomas diferentes." Esses sintomas podem incluir fadiga, falta de ar e dor nas costas ou no estômago.

Quando a cirurgia funciona bem, os resultados podem parecer milagrosos. Rhonda Skaggs, 68, fez uma cirurgia de ponte de safena quádrupla em julho de 2022 e passou 12 dias na UTI antes de voltar para casa em Brooksville, Flórida. Seis meses se passaram antes de ela voltar ao trabalho em uma loja da Home Shopping Network.

"Agora, você nunca saberia que eu fiz uma cirurgia de coração aberto", diz ela. "Eu caminho dez mil passos por dia. Dou aulas de dança duas vezes por semana. Recuperei minha vida."

Mas Susan Leary, 71, uma professora aposentada da cidade de Nova York que agora mora em Fuquay-Varina, Carolina do Norte, está enfrentando um segundo procedimento após a ponte de safena na Universidade Duke no mês passado.

"Mulheres têm menos probabilidade de ter todos os vasos que precisam ser desviados", diz sua cirurgiã cardio-torácica, Brittany Zwischenberger, coautora do editorial de chamada para ação no Jama Surgery.

Alguns anos antes, Leary havia procurado um procedimento para diminuir as varizes "feias" em suas pernas; agora, ela não tinha vasos sanguíneos viáveis para enxerto. "Como eu sabia que precisaria de alguns desses vasos para o meu coração?", afirma.

Ela fez uma cirurgia de ponte de safena dupla, em vez da ponte de safena tripla que precisava, o que representa uma "revascularização incompleta".

"Isso pode contribuir para piores resultados e intervenções futuras", diz Zwischenberger. "Felizmente, ela é candidata a um stent" para a terceira artéria bloqueada, que envolve a inserção de um tubo de malha no vaso para dilatá-lo. O procedimento está agendado para o próximo mês.

Para saber mais, Gaudino e outros pesquisadores começaram a inscrever mulheres, e apenas mulheres, em dois novos ensaios clínicos. O estudo internacional Roma, o primeiro ensaio cirúrgico exclusivamente feminino, investigará duas técnicas de ponte aorto-coronária para ver qual produz melhores resultados; o ensaio Recharge, financiado pelo governo federal, comparará o uso de stents com a ponte.

Mosson diz que seus cirurgiões ficaram satisfeitos com os resultados de sua cirurgia de ponte de safena quádrupla, embora ela tenha sido readmitida brevemente no hospital por fluido nos pulmões. Ela começou um programa de reabilitação cardíaca três vezes por semana, recomendado para pacientes que passaram pela cirurgia, e percebe que sua resistência está melhorando.

Ela ainda lida com as consequências psicológicas do seu ataque cardíaco e cirurgia, assim como Skaggs fez e Leary ainda faz. Elas descrevem choque —nenhuma delas tinha histórico de doença cardíaca—, depressão e ansiedade. "Ainda estou lutando com o medo de que isso aconteça novamente", afirma Mosson.

Um antídoto, para Leary, foi ser recrutada para o Roma; Duke está entre os locais do ensaio clínico. Ela aproveitou a oportunidade para se inscrever.

"Deixe-me fazer parte disso", ela disse. "Talvez minha filha precise dessas informações um dia."

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