Descrição de chapéu Dengue Projeto Saúde Pública

Pior momento da dengue ainda está por vir, dizem especialistas

Pico deve ser diferente nas regiões do país; número de casos nas primeira semanas do ano ultrapassa o registrado em 2023

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

O Brasil iniciou 2024 com explosão no número de casos de dengue em diversos estados. Ao fim de janeiro, o país já marcava aumento expressivo nos registros da doença em relação ao ano anterior.

Segundo o Painel de Monitoramento de Arboviroses do Ministério da Saúde, nas cinco primeiras semanas epidemiológicas de 2024 foram registrados 156.871 casos confirmados da doença. No mesmo período de 2023, foram 82.840 registros.

Para especialistas ouvidos pela Folha, o pior ainda está por vir.

A auxiliar de enfermagem. Gabriela Rodrigues, 32 anos, faz o exame para diagnóstico de dengue na tenda da UPA 26 de agosto
Tenda é aberta para atender pessoas com suspeita de dengue na UPA 26 de Agosto, na região de Itaquera - Ronny Santos/Folhapress

Para Alexandre Naime Barbosa, vice-presidente da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia), o pico de casos e de transmissão é esperado para após o Carnaval. Segundo ele, há a expectativa de melhora do cenário em meados de abril, com a diminuição da chuva e da temperatura.

"É a sazonalidade da dengue. Lógico que em lugares mais quentes e chuvosos você terá uma curva epidêmica mais constante. Em locais em que há grande variação de temperatura e que o inverno é mais seco isso não vai acontecer de forma tão intensa", afirma.

Para o infectologista o manejo clínico é motivo de preocupação.

"Nesse momento que o estrago está feito e os casos já estão em número absurdo, a nossa principal preocupação é com o atendimento médico ser feito de forma correta. As medidas de prevenção foram efetuadas em paralelo, mas o mais urgente é que se crie uma estrutura dentro de municípios e dos estados em relação ao manejo adequado do paciente com dengue", afirma.

David Uip, diretor nacional de Infectologia da Rede D’Or e reitor do Centro Universitário FMABC (Faculdade de Medicina do ABC), afirma que o pico da dengue acontecerá em épocas diferentes no país: no Sudeste e Sul, entre fevereiro e março, e no Nordeste e Norte de um a dois meses depois. Sobre o Centro-Oeste, Uip indica que não tinha dados suficientes para análise.

"A incidência está diferente pelo país", diz ele, que também foi secretário de Estado da Saúde e da pasta de Ciência, Pesquisa e Desenvolvimento em Saúde de São Paulo. "O que estamos vendo na região metropolitana de São Paulo, no Vale do Paraíba, em outros locais do Sudeste e em Brasília é diferente do Norte e Nordeste, onde tem poucos casos e não há pressão nos hospitais. Mas vai aumentar. O pico da doença terá diferentes momentos."

Na opinião de Wanderson Kleber de Oliveira, epidemiologista do Hospital das Forças Armadas e professor do curso de medicina da Uniceplac (Centro Universitário do Planalto Central Apparecido dos Santos), neste momento ainda é prematuro afirmar de que forma será o comportamento da doença no Brasil. Geralmente, o maior número de casos ocorre no fim de abril ou início de maio, mas pode ser que a curva seja antecipada e o pico da doença aconteça mais cedo.

"Talvez tenhamos um padrão parecido com o de anos anteriores ou que esteja dentro das características de alguns anos específicos, porque agora temos a circulação do sorotipo 1. Então é importante a gente olhar mais no território —locais como o município do Rio, Brasília, Acre, Paraná", afirma Oliveira, que também atuou no Ministério da Saúde de 2001 a maio de 2020 como secretário de Vigilância, coordenador geral de Emergências em Saúde Pública e de Doenças Transmissíveis, entre outras funções.

"O Brasil tem epidemia de dengue há muitos anos. Não é aceitável continuarmos com casos tão elevados em todo o território. Por quê? Todo ano sabemos o que vai acontecer. As medidas mais eficientes de combate à dengue devem começar no ano anterior —eliminação de focos do mosquito e de criadouros, ações de educação e saúde, e principalmente fortalecer a atenção primária e o cuidado dos casos já a partir do posto de saúde, com médicos, enfermeiros, outros técnicos e agentes preparados para a sazonalidade que com certeza começa no final de novembro, início de dezembro de cada ano", afirma Oliveira.

"Nós não sabemos fazer isso direito. Depois que a curva pega embalo, vai afetar muita gente e temos dificuldade de controle nesse estágio. Mas dá para diminuir muito as mortes e os casos graves. Para isso precisamos de profissionais qualificados e leitos disponíveis. Algumas unidades federais e municípios estão abrindo leitos e hospitais de campanha. Isso é muito bonito, mas é o fim da linha do processo de resposta. É preciso investir mais em ações de prevenção, principalmente no que diz respeito à responsabilidade civil das pessoas em relação ao seu espaço de convivência", finaliza o epidemiologista.

O que está por trás do aumento de casos?

Há diferentes explicações, segundo especialistas. Uma delas diz respeito à circulação de quatro sorotipos de dengue, o que indica que cada pessoa pode pegar a doença quatro vezes. Quando um indivíduo é infectado por um deles adquire imunidade contra aquele vírus, mas ainda fica suscetível aos demais.

Outra razão é a mudança no perfil geográfico. Locais que antes não tinham dengue passaram a ter, fazendo com que novas populações fiquem expostas à doença.

Além disso, há um processo de expansão da área de transmissão de dengue para o Sul do país, o que é observado nos últimos anos e está associado a mudanças climáticas e ambientais, segundo os médicos. A chuva e o calor cada ano mais intensos facilitam a formação de focos do mosquito Aedes aegypti e a sua proliferação.

"Dengue mata. No ano passado, o Brasil bateu o recorde histórico de mortes por dengue. Nunca na história desse país morreram tantas pessoas de dengue como em 2023. Em 2022, já tinha acontecido isso, ou seja, nós estamos piorando. Com o número de pacientes que a gente já tem nas primeiras quatro semanas de janeiro de 2024 vai, infelizmente, bater todos os recordes anteriores", pontua Barbosa.

A dengue começa com febre alta —geralmente acima de 38,5ºC, segundo Barbosa. Outro sintoma é dor muscular pelo corpo, nas articulações, nos olhos e abdominal, além de manchas vermelhas na pele. Queda acentuada na pressão arterial, sangramentos e desmaios são alguns sinais de gravidade.

Segundo o infectologista, o paciente que busca atendimento rápido, ainda nos primeiros sintomas, e recebe o tratamento adequado, tem baixo risco de morte.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.