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Estudo aponta que 750 mil mortes ligadas a bactérias resistentes a antibióticos poderiam ser evitadas

Medidas envolvem vacinação e acesso a saneamento; condição causa 1,27 milhão de óbitos por ano

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Paris

A cada ano, cerca de 7,7 milhões de pessoas morrem por causas atribuídas a infecções bacterianas. Dessas, 1,27 milhões são associadas a bactérias resistentes a antibióticos.

Um novo estudo, porém, mostra que medidas como vacinação e acesso a saneamento básico podem reduzir cerca de 750 mil destas mortes.

Objeto amarelo toca placa de petri com material rosa
Análise do perfil genético de microrganismos isolados de pessoas com infecção urinária na região de Ribeirão Preto revelou alto grau de resistência e virulência; superbactéria KPC estava presente nas amostras (bactérias com fenótipo de virulência conhecido como hipermucoviscosidade - André Pitondo Silva

A estimativa faz parte de um levantamento divulgado nesta quinta (23) na revista científica The Lancet, a mais renomada do meio médico.

O número chama atenção para os casos de bactérias resistentes a antibióticos, problema presente em todo mundo, mas que afeta particularmente a parcela mais pobre dos países.

Ana Cristina Gales, professora da Escola Paulista de Medicina da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e uma das autoras da série de estudos, explica que existem medidas relativamente simples que podem ser implementadas nos países para reduzir essas mortes.

Uma delas é a vacinação contra outros agentes infecciosos, que podem prevenir hospitalizações e impedir o prolongamento hospitalar —este, sim, associado a infecções bacterianas.

"Você vai ter uma pneumonia bacteriana como uma complicação da gripe e vai usar antibiótico. Então, se você se vacinar contra a gripe, a chance de ter gripe é menor e, consequentemente, terá menos pneumonias bacterianas como complicação desses casos e usará menos antibiótico", explica.

As bactérias resistentes impactam milhares de pessoas. Embora todos estejam sujeitos a essas complicações, crianças, idosos e imunocomprometidos são os principais afetados. Nestes grupos, vacinação contra doenças respiratórias, como a gripe, causada pelo vírus influenza, e contra bactérias pneumocócicas, podem ser aliadas no combate a infecções.

Saneamento básico e acesso à água potável são outras ações que poderiam diminuir a mortalidade por bactérias resistentes: mais especificamente ao evitar cerca de 247 mil mortes por ano, de acordo com as estimativas do estudo. De forma parecida, melhor higienização de equipamentos utilizados em hospitais e UTIs (Unidades de Terapia Intensiva), por exemplo, pode impedir 337 mil óbitos por essa causa.

Uma das razões da pesquisa ser publicada agora é que o tema será discutido na Assembleia-Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), em setembro. "A gente queria ver qual tinha sido o progresso e o que precisava ser feito em relação à resistência bacteriana", afirma Gales, que é também vice-coordenadora do Aries (Antimicrobial Research Institute of São Paulo), um centro de Pesquisa, Inovação e Difusão(Cepid) financiado pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).

Países mais ricos já adotam medidas importantes para combater essas doenças. O cenário, no entanto, é diferente nos locais mais pobres, que também são as regiões com os piores índices de mortalidade associada a bactérias resistentes. Na África Subsaariana, por exemplo, a incidência é de 98 mortes a cada 100 mil habitantes, enquanto em países ricos esse número é 55 óbitos a cada 100 mil habitantes.

Por essa razão, a pesquisadora defende um acordo internacional. No caso do Brasil, o país conseguiu progredir nos últimos anos, com sistemas de vigilância voltados para esse tipo de complicações e um plano de combate à resistência antimicrobiana.

Cientista analisa material em laboratório
Pesquisadores buscam compostos capazes de combater bactérias resistentes - Divulgação/Acervo dos pesquisadores

Uma das principais causas do aparecimento de bactérias resistentes é o próprio uso de antibióticos, já que ele cria uma pressão para a manutenção do número daquelas bactérias que não são eliminadas pelos remédios. Há casos em que um paciente precisa utilizar esse tipo de medicamento –quando, por exemplo, ele conta com uma infecção bacteriana. No entanto, há situações em que o uso é inapropriado.

Por isso, a série publicada na The Lancet recomenda que, para os próximos anos, os países devem se comprometer em reduzir em 20% os casos de uso inadequado de antimicrobianos em humanos. Para animais, esse percentual deve ser de 30%.

Além disso, existe outra meta: diminuir em 10% as mortes associadas a antibióticos, algo que pode ser alcançado com a queda no uso desse tipo de medicamento e também por outras medidas, como a vacinação, saneamento básico e o diagnóstico correto.

Quando o diagnóstico é equivocado ou tardio, o cenário retarda a cura do paciente, o que aumenta o risco de mortalidade e ainda colabora com o aparecimento de bactérias resistentes.

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