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Moraes proíbe punições geradas por resolução do CFM que restringia aborto legal

Em adendo à decisão da semana passada, ministro proíbe processos judiciais e administrativos sobre o tema

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São Paulo e Brasília

O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), suspendeu nesta sexta-feira (24) todos os processos judiciais e procedimentos administrativos e disciplinares provocados pela resolução do CFM (Conselho Federal de Medicina) que restringia o aborto legal de gestações acima de 22 semanas resultantes de estupro.

"PROÍBO a instauração de qualquer procedimento administrativo ou disciplinar com base da referida resolução", escreveu o ministro.

A decisão, uma liminar (urgente e provisória), será levada para apreciação dos demais ministros da corte, e é complementar a outra determinação de Moraes, do dia 17, que suspendeu a resolução.

Ato pela descriminalização e legalização do aborto na América Latina e Caribe, na avenida Paulista - Bruno Santos/Folhapress

A decisão do ministro decorre de sanções que foram aplicadas por conselhos regionais de medicina e por gestores de saúde a profissionais de serviços de aborto legal que utilizam a técnica de assistolia fetal para a interrupção de gestações acima de 22 semanas.

O procedimento é indicado para casos de interrupção da gestação acima de 22 semanas, consiste na injeção de produtos químicos no feto para evitar que ele nasça com sinais vitais. É recomendado pela OMS (Organização Mundial da Saúde) e tido pelos protocolos nacionais e internacionais de obstetrícia como a melhor prática assistencial à mulher em casos de aborto legal acima de 20 semanas.

Moraes afirma que a nova decisão foi tomada porque chegaram aos autos "notícias de que 'recentemente ocorreram casos de aborto de fetos com mais de 22 semanas de gestação, levando à suspensão profissional de médicas que realizaram o procedimento'".

Isso, relata o ministro, "teria fundamentado a realização de manifestações populares na sede do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, bem como a 'suspensão do programa Aborto Legal no Hospital Vila Nova Cachoeirinha, repercutindo em supostas vítimas de violência'".

Segundo Moraes, há "ampliado perigo de dano" caso ele não elaborasse uma nova determinação urgente a respeito do tema.

O Hospital Municipal e Maternidade da Vila Nova Cachoeirinha é referência em São Paulo para a realização de abortos legais. Ao menos duas médicas da instituição foram processadas pelo Cremesp (Conselho Regional de Medicina paulista) e tiveram seus registros suspensos.

Em audiência da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Violência e Assédio Sexual Contra Mulheres sobre questões relacionadas ao aborto legal, instaurada pela Câmara de São Paulo, o presidente do Cremesp, Angelo Vattimo, afirmou que o órgão acessou mais de cem prontuários de pacientes que realizaram abortos no hospital e que alguns dos abortos aparentam ser ilegais. Ele fez a declaração sem dar detalhes ou provas da ilegalidade dos procedimentos.

Conforme revelou a Folha, após a publicação da resolução do CFM, serviços de aborto legal suspenderam atendimentos de mulheres e meninas com gravidezes acima de 22 semanas resultantes de estupro. Havia também um clima de medo e insegurança entre as equipes médicas.

O aborto é permitido no Brasil em casos de estupro, risco de vida para a gestante e quando o feto é anencéfalo. Em todos esses cenários, segundo a Constituição, não existe nenhuma restrição para a idade gestacional do feto no momento do aborto.

A decisão de Moraes da semana passada foi proferida em uma ação proposta pelo PSOL e pela Anis - Instituto de Bioética, em que afirmam que a resolução institui "tratamento discriminatório no acesso à saúde", indo na contramão das situações previstas em lei para a realização do aborto legal no Brasil— em caso de estupro, anencefalia do feto ou que envolva risco de vida à gestante.

Eles defendem que a norma é inconstitucional por dar margem incorrer em "violação grave do direito à saúde e de acesso universal e igualitário aos serviços".

Na opinião de Debora Diniz, fundadora da Anis, Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero, ainda que em caráter liminar, a decisão é muito acertada porque resolução do CFM provocava uma instabilidade no acesso aos serviços de aborto legal no país. "Ela é uma resolução que impede o melhor tratamento de saúde e a melhor ciência."

Segundo Debora Diniz, o procedimento é considerado padrão ouro para o cuidado de mulheres e meninas que chegam aos serviços de aborto legal tardiamente. "Os casos são muito dramáticos, de meninas em situação de violência em casa."

Caso o plenário do STF mantenha as decisões de Moraes, a suspensão será valida até o julgamento final da ação.

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