Descrição de chapéu aborto Todas

Críticas à omissão do governo em PL Antiaborto por Estupro fazem Lula mudar de discurso

Nesta sexta, presidente disse que ainda iria tomar pé da situação, mas no dia seguinte classificou projeto como insanidade

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Brasília

A repercussão negativa sobre a condescendência do governo na votação da Câmara que instituiu regime de urgência ao PL Antiaborto levou o presidente Lula (PT), a primeira-dama, Janja, e a articulação política do Executivo a endurecerem a posição sobre a matéria.

Nesta sexta-feira (14), o chefe do Executivo evitou falar sobre o tema e disse apenas que iria "tomar pé" da situação. Menos de 24 horas depois, deu uma guinada no discurso e afirmou que é uma "insanidade alguém querer punir uma mulher com pena maior que o criminoso que fez o estupro".

O governo não orientou sua bancada na análise do projeto em plenário e lideranças do PT atuaram intensamente para que a votação não trouxesse o nome dos parlamentares favoráveis e dos contrários à proposta.

Homem idoso está em pé, vestido com terno escuro, camisa banca e gravata vermelha. Ele está diante de um púlpito com microfones e com duas bandeiras, um de cada lado dele
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) dirante entrevista a jornalistas neste sábado (15) na Puglia, no sul da Itália, onde participou da reunião de cúpula do G7 - Palácio do Planato/Divulgação

Ambas as estratégias legislativas costumam facilitar a aprovação de projetos polêmicos, uma vez que não houve orientação explícita à base aliada e deputados não precisaram declarar abertamente suas posições.

Mas as críticas à proposta, que abre espaço para estupradores terem penas menores do que mulheres que realizarem estupro, unificaram a esquerda nas redes sociais, provocaram manifestações nas ruas e forçaram o governo a recalcular a rota e mudar de posição.

O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, responsável pela relação entre Congresso e governo, foi o primeiro a explicitar a mudança de postura do Palácio do Planalto.

Depois de a articulação política do Executivo ter facilitado o ambiente para aprovação do regime de urgência na quarta-feira (12), Padilha foi às redes sociais na sexta-feira (14) para dizer que não era para "contar com o governo para qualquer mudança na legislação atual de aborto no país.

A primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja, levou quase dois dias para tratar do tema, mas após ampla pressão se posicionou de maneira contrária ao PL. Janja se diz feminista e costuma influenciar Lula no debate da pauta de costumes para que ele tome posições mais firmes em temas que atingem minorias.

Nesta sexta (14), ela classificou nas redes sociais a matéria em curso na Câmara de "absurda".

"Isso ataca a dignidade das mulheres e meninas, garantida pela Constituição cidadã. É um absurdo e retrocede em nossos direitos. A cada oito minutos uma mulher é estuprada no Brasil. O Congresso poderia e deveria trabalhar para garantir as condições e a agilidade no acesso ao aborto legal e seguro pelo SUS", escreveu.

Nesta semana, o governo também se omitiu em outra pauta cara à base eleitoral mais fiel a Lula. A CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara aprovou a PEC (proposta de emenda à Constituição) que constitucionaliza a criminalização de porte e posse de drogas.

O placar da votação registrou 47 votos favoráveis e 17 contrários. O governo não orientou sua bancada, o que também se tornou alvo de críticas de militantes do campo progressista.

A visão da esquerda é que a criminalização das drogas é uma das causas principais para a superlotação de presídios, o que atinge principalmente pretos e pobres.

O governo anda numa corda bamba em relação aos dois temas sensíveis em curso no Legislativo e a outros da chamada pauta de costumes.

O Executivo sabe que a bancada mais à esquerda é minoritária na Câmara e que o Palácio do Planalto compõe a maioria com partidos de centro que, muitas vezes, apoiam matérias com viés conservador.

Assim, o governo prefere evitar briga em projetos desta natureza para não constranger aliados e contar com votos em projetos econômicos vistos como fundamentais para resolver a crise fiscal e criar o ambiente para o crescimento do país.

No entanto, a estratégia tem um custo político alto que, em algumas situações, não foi bem calculado pela articulação política do Planalto, na visão de parlamentares ouvidos pela reportagem sob reserva.

O caso do aborto é um exemplo nesse sentido. O governo tentou evitar o tema e se eximir de responsabilidade. A cobrança da militância, porém, foi tamanha que forçou uma mudança de posição do próprio presidente da República.

Nesta sexta (14), Lula evitou uma pergunta sobre o PL. "Você acha que é justo? Acabei de sair de uma palestra, [ter que] falar de uma coisa que está sendo discutida na Câmara. Deixa eu voltar para o Brasil, tomar pé da situação, aí você me pergunta", disse Lula a repórteres brasileiros logo após discursar na sede das Nações Unidas em Genebra, na Suíça.

O tom adotado neste sábado (15) foi diferente. "Acho uma insanidade alguém querer punir uma mulher com uma pena maior do que a do criminoso que fez o estupro", disse o presidente. "À distância, não acompanhei os debates intensos no Brasil, mas, quando eu voltar, vou tomar ciência disso. Tenho certeza de que o que tem na lei já garante que a gente haja de forma civilizada para tratar com rigor o estuprador e com respeito a vítima."

Como parte da iniciativa Todas, a Folha presenteia mulheres com três meses de assinatura digital grátis

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.