NBA se curva a Doncic, esloveno de 20 anos que joga como veterano

Atleta do Dallas Mavericks é cotado ao prêmio de melhor jogador da temporada

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São Paulo

Com um microfone na mão, o esloveno Luka ​Doncic ensandeceu fãs, falando em espanhol perfeito antes de um jogo do Dallas Mavericks contra o Detroit Pistons no México. A partida na América Latina, em dezembro, fez parte do NBA Global Games, projeto da liga americana de basquete para expandir sua marca internacionalmente.

Ainda que Doncic falasse em outro idioma, não seria necessário traduzir o efeito produzido pelo jovem de 20 anos na NBA.

Após retornar nesta quarta-feira (12) de uma lesão no tornozelo, ele será um dos destaques do Fim de Semana das Estrelas da liga, de sexta (14) a domingo (16).

Em seu segundo ano na NBA, o atleta caminha para se tornar um dos rostos mais conhecidos do basquete mundial. As expectativas em torno do europeu são justificadas pelos números.

Ele é o jogador com mais triplos-duplos (dois dígitos em pontos, rebotes e assistências) antes de completar 21 anos –são 20. Possui médias de quase 29 pontos, 9,5 rebotes e 8,7 assistências por partida.

Nos primeiros 88 jogos da carreira, marcou mais pontos do que Kobe Bryant, mais rebotes que Kevin Garnett e mais assistências que LeBron James com o mesmo número de partidas. Nesta temporada, acumula 12 jogos com triplos-duplos, liderando a estatística ao lado do ala dos Lakers.

Apontado como candidato ao prêmio de MVP (jogador mais valioso da temporada), Doncic se diz surpreso com o próprio desempenho: “Eu só estou jogando basquete. Não esperava por tudo isso." Quem o acompanha desde o início da carreira, entretanto, não previa nada menos.

O armador da seleção brasileira Rafa Luz, que fez carreira na Espanha, relembra uma semifinal da Copa do Rei há quatro anos, na qual seu então Baskonia perdeu para o Real Madrid do esloveno: “Acho que nunca vi isso na minha vida, Doncic dominou de forma impressionante. Naquela partida, ele destruiu! Jogávamos em casa para 16 mil pessoas e ele fez jogadas de cinema."

"Depois disso, foi importante para ele a temporada de 2018, em que Sergio Llull [armador titular do time] ficou de fora com o joelho machucado. O Real Madrid confiou nele, e esse passo gigantesco o preparou para aguentar a badalação da NBA”, afirma Luz.

Naquele mesmo ano, o jovem chegou aos Estados Unidos com status de estrela: campeão e jogador mais valioso da ​Euroliga. Mesmo assim, acabou preterido por três times. Na noite do draft (processo de recrutamento de calouros), foi selecionado na terceira posição pelo Atlanta Hawks e trocado minutos depois com o Dallas Mavericks, pela quinta escolha, o armador americano Trae Young.

Muitos olheiros e analistas torceram o nariz para o estrangeiro de 2,01 m de altura, por ele supostamente não estar adaptado ao jogo praticado nos EUA e até pelo seu físico mais robusto.

Outro armador da seleção brasileira, Marcelinho Huertas conhece bem a transição do basquete europeu para o americano: saiu do Barcelona para o Los Angeles Lakers, em 2015.

“Sem dúvida, existe certo preconceito com jogadores de fora. Menos que antigamente, graças ao sucesso de tantos que escreveram uma história espetacular nessas últimas décadas. Mas muitas análise pré-draft são baseadas no quão atlético os jogadores são, e talvez por não ser o mais rápido nem o que mais saltava, Doncic tenha sido escolhido depois", ele afirma.

Totalmente adaptado à NBA, o esloveno contrariou em quadra os prognósticos pessimistas. Só sente falta mesmo de um bom “cevapcici”, espetinho de carne tradicional do seu país.

A história de Doncic com a bola laranja começou em 2000. Com apenas um ano de idade, ele ganhou sua primeira tabelinha do pai, o ex-jogador de basquete Sasa Doncic. Ainda que praticasse outros esportes, como futebol, judô e esqui, o basquete o acompanhou ao longo da vida na nação de 2 milhões de habitantes.

Aos 7 anos, teve o primeiro contato com o basquete competitivo, no Union Olimpija Ljubljana, principal equipe eslovena. Aos 13, deixou o país para integrar a base do Real Madrid. Aos 16, tornou-se o mais jovem da história a vestir a tradicional camisa branca e o terceiro mais novo em solo espanhol a debutar como profissional.

“Às vezes, ele ia ao vestiário e ficava vendo os jogos do profissional, era muito observador. Nós nos cumprimentamos poucas vezes com um oi. A impressão que Doncic passava lá atrás é a mesma de hoje:a de um cara tranquilo, humilde, trabalhador e mais quietinho", diz o pivô do Franca (SP) Rafael Hettsheimeir, que atuava pelo Real Madrid na época em que o esloveno se juntou ao clube.

Luka Doncic durante o Eurobasket 2017, torneio vencido pela Eslovênia
Luka Doncic durante o Eurobasket 2017, torneio vencido pela Eslovênia - Ozan Kose - 14.set.17/AFP

Na Eslovênia, Doncic havia aprendido os fundamentos do basquete praticado no leste europeu, que teve uma poderosa Iugoslávia dominando o cenário do esporte até a sua desintegração, em 1992.

Com a camisa da seleção, ele obteve grande feito ao vencer em 2017 o Eurobasket –campeonato no qual se enfrentam a cada dois anos os melhores países europeus. Naquela época, teve a ajuda principalmente de Goran Dragic, armador do Miami Heat.

Em 2015, os fãs brasileiros puderem conhecer o talento europeu. Ele viajou a São Paulo com o Real Madrid para jogar contra o Bauru pelo Mundial Interclubes de Basquete.

Atual técnico do Mogi das Cruzes (SP) pelo NBB, Guerrinha comandava o Bauru à época. Doncic era reserva e teve uma árdua missão: substituir o experiente Sergio Rodríguez, expulso na segunda partida.

“A gente imaginava, sim, que ele seria tudo isso, apesar de naquela época Doncic ainda não ter ganhado corpo, somente era grande. O que se destacava nele era o lado técnico, a facilidade de dominar os fundamentos e fazer tudo certo e com qualidade, executando na hora correta", afirma Guerrinha.

Não à toa, hoje o técnico do Dallas Mavericks, Rick Carlisle, confia muito no esloveno para chamar as jogadas em quadra –atuando como ala na primeira temporada e, nessa, armando o time.

Ricardo Fischer, armador do Corinthians, também o enfrentou no Brasil. “Ele atrai muito a defesa para si e, quando não consegue finalizar, acha um companheiro livre. Essa é uma grande qualidade que quem arma precisa ter.”

Se em quadra Doncic joga como um veterano de apenas 20 anos, fora dela diverte os fãs com cenas descontraídas: reagindo de forma entusiasmada a jogadas bonitas de seus companheiros de equipe, rasgando a camisa ao ficar irritado e postando nas redes sociais memes de si próprio.

Em um vídeo promocional gravado com colegas de time em que eles dizem que tipo de jogador seriam caso jogassem futebol, o esloveno pensa rapidamente antes de cravar: "eu seria o Pelé".

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