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Andreza Rodrigues Marreiros de Sousa

Para a nossa felicidade, atletas mulheres não acreditaram que eram frágeis

Pierre de Coubertin dizia que as mulheres deveriam apenas aplaudir e abrilhantar os Jogos

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Andreza Rodrigues Marreiros de Sousa

mestre em ciências pela EEFE-USP, integra o Grupo de Estudos Olímpicos da USP

As minhas vivências esportivas se deram na escola e com as brincadeiras e jogos de rua, quando ainda tínhamos o costume de gastar horas jogando, qualquer que fosse o jogo. Isso era no início dos anos 2000, e mulher praticando esporte ainda soava estranho.

Mesmo com a atuação dos movimentos feministas no século anterior —que não tinham como objetivo principal reivindicações esportivas, mas que naturalmente contribuíram para mudanças no esporte—, as mulheres ainda encontravam dificuldades para ocupar espaços entendidos como masculinos.

Não era sem motivo a exclusão da mulher em contextos esportivos. Mesmo que intoleráveis, os argumentos davam às mulheres apenas a incumbência de cuidar do lar e se resguardar para a função materna. Mais do que isso, discursos médicos reforçavam diferenças biológicas que restringiam essa participação e que determinavam os lugares que as mulheres tinham que ocupar. Essas alegações defendiam a fragilidade do corpo feminino.

No entanto, para a nossa felicidade, esqueceram de avisar às mulheres que o espaço esportivo não foi pensado para elas. Aliás, avisaram sim. Mas elas não aceitaram.

Assim, Maria Lenk deu início a essas participações quando competiu nos Jogos Olímpicos de Los Angeles, em 1932. Sua modalidade era a natação, considerada adequada ao corpo feminino, pois era capaz de proporcionar a harmonia plástica, fazendo com que a mulher não perdesse atributos de um corpo delicado.

Em contrapartida, havia modalidades que exigiam força, velocidade, resistência e outras capacidades atribuídas somente aos homens, não sendo pertinentes ao corpo feminino.

Porém, as primeiras mulheres a competirem pelo atletismo desconsideraram esses discursos e marcaram seus nomes na história. O “medo” daqueles que não concordavam com a participação feminina em determinadas modalidades era que esses corpos tivessem músculos delineados semelhantes aos de um corpo masculino. Mas Benedita de Oliveira, Melânia Luz, Wanda dos Santos e tantas outras subverteram esses pressupostos com maestria.

Sob essa mesma alegação, as mulheres não podiam competir na maratona, pois essa era uma modalidade dura que exigia principalmente coragem. Pasmem, esse não seria um atributo destinado à mulher. Quando a suíça Gabrielle Andersen ignorou seu nível de exaustão e cruzou a linha de chegada mal conseguindo se manter em pé, em 1984, ela não queria medalhas ou prêmios. Ali ela nos mostrava a força do corpo feminino.

“Tomando cuidado” para não masculinizar esses corpos, decretos-leis proibiram a prática do futebol, de lutas e de outros esportes que seriam incompatíveis com a natureza da mulher. Se elas acreditassem nisso, não teríamos Soraia André fazendo história no judô, e Marta e Formiga no futebol, provando que a bola pode ser jogada também por pés femininos.

Como uma menina que cresceu acompanhando esporte, assistindo à maioria dessas mulheres em ação, conhecendo a história de muitas outras e se inspirando em cada uma, eu agradeço a elas por não terem acreditado que seus corpos eram frágeis e inadequados para a prática esportiva.

O meu agradecimento e o de tantas outras meninas e mulheres, que tiveram que subverter a lógica de um esporte somente para os homens, vai para elas que não creram, especialmente, em uma das citações de Pierre de Coubertin, que dizia que as mulheres deveriam apenas aplaudir e abrilhantar os Jogos, pois eram frágeis dos nervos.

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