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Eduardo Ohata

Spider-Paul servirá de termômetro para fenômeno de lutas entre celebridades e atletas

Novidade traz benefícios, mas há risco de, com a ausência dos devidos cuidados, respingar no boxe tradicional

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Eduardo Ohata

É jornalista, comentarista de lutas e tem certificado da clínica de juízes do Conselho Mundial de Boxe

São Paulo

O duelo entre o youtuber norte-americano Jake Paul e o brasileiro ex-campeão do UFC Anderson "Spider" Silva, previsto para a noite deste sábado (29), no Arizona (EUA), servirá de termômetro do apetite do público para o fenômeno de lutas de boxe envolvendo celebridades ou esportistas oriundos de outras modalidades.

Nos últimos anos, foram realizados diversos combates envolvendo boxeadores veteranos, ex-atletas de MMA, jogadores da NBA e influenciadores que conquistaram fama na internet.

Não por acaso o mais bem-sucedido card do gênero em termos financeiros foi encabeçado em 2017 por dois gênios do marketing, o multicampeão de boxe Floyd "Money" Mayweather e o falastrão do MMA Conor McGregor, que fazia sua estreia nos ringues de boxe. É a segunda maior luta em vendas de pay-per-view da história, com 4,3 milhões de pacotes vendidos.

Jake Paul e Anderson Silva se encaram na conferência de imprensa antes da luta; combate será nas regras do boxe - Christian Petersen - 13.set.22/Getty Images/AFP

Desde então, o que se viu foi uma enxurrada de eventos do gênero. Exibições ou lutas oficiais entre boxeadores aposentados ou ainda na ativa e celebridades, influenciadores ou desportistas oriundos de outros esportes. Em algumas exibições ficou claro que o boxeador profissional pisou no freio. Em outras aconteceram até nocautes.

Com uma abundância de eventos do gênero, o mercado começa a se mostrar mais seletivo com a novidade.

No caso de Jake Paul, sua luta de maior sucesso financeiro foi o duelo com o ex-UFC Ben Askren em abril do ano passado, que vendeu 1,5 milhões pacotes de pay-per-view nos EUA. Na sequência, o combate contra o ex-campeão do UFC Tyron Woodley vendeu 500 mil pacotes, e a revanche com o mesmo Woodley, encaixado como um substituto de última hora, só 65 mil.

Os números mostram que o público está se cansando desse tipo de luta? Ou o mais recente card envolvendo Paul foi simplesmente mal promovido?

Os números de Paul-Silva, em um duelo de boxe oficial, que põe frente a frente uma das figuras mais populares da cultura pop, com 21 milhões de seguidores no Instagram, mais de 20 milhões de inscritos no YouTube e 4,4 milhões no Twitter, e um dos maiores e mais populares nomes na história do MMA, poderão dar uma boa indicação.

O próprio Paul acredita que o evento tem o potencial para vender até 700 mil pacotes de pay-per-view nos EUA. A luta será transmitida pelo canal pago Combate, a partir das 21h50.

Mas afinal, esse tipo de apresentação prejudica ou ajuda o boxe tradicional?

Esse tipo de card atrai um público que normalmente não estaria assistindo uma luta de boxe. Em alguns eventos os promotores chegaram a incluir apresentações de cantores e bandas musicais com grande apelo junto ao público jovem e até a participação do polêmico rapper Snoop Dogg.

Se um desses eventos atrai alguém da nova geração que não consome boxe e que decide acompanhar as lutas mais tradicionais, já terá sido algo positivo.

Há quem insinue que esse tipo de exibição "suja" a imagem do boxe. Mas aí é o caso de apenas não confundir o que é entretenimento com esporte.

No caso de Jake Paul, até seus críticos mais ferozes passaram a reconhecer seu respeito pelo esporte, por conta de sua ávida dedicação aos treinamentos.

Maurício Sulaiman, presidente do Conselho Mundial de Boxe, mais importante entidade do boxe profissional, já indicou que não afasta a possibilidade de inseri-lo no ranking.

Outros insistem que celebridades ou desportistas envolvidos nas exibições "roubam" espaço dos atletas do boxe tradicional. Não necessariamente.

Certa vez perguntaram para o falecido chefão do departamento de esporte da rede de TV americana Showtime Jay Larkin se ele lamentava que parte significativa do orçamento da emissora era consumida com combates de Mike Tyson. "Não necessariamente. Se não houvesse Tyson, talvez essa fatia do orçamento não existisse", explicou.

E, no sentido de abrir espaço a boxeadores tradicionais na "vitrine", foi o que Jake Paul fez em seu último card. Encaixou na preliminar a multicampeã feminina Amanda Serrano que, meses depois dessa exposição, ganhou a oportunidade de enfrentar outra multicampeã, Katie Taylor, em uma das lutas mais relevantes da história do boxe feminino.

Claro, por conta da idade ou eventual disparidade de qualidade técnica entre os combatentes, é imprescindível a supervisão desses eventos por um órgão ou entidade oficial, para garantir precauções como a presença de médicos e ambulâncias, assim como tem que ser no boxe tradicional.

Qualquer acidente grave pode, sim, respingar no boxe fazendo-o retroceder anos em relação à sua imagem.

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