Descrição de chapéu Futebol Internacional

Mesmo antiquado, Real Madrid se adapta para permanecer poderoso

Clube brigou pela fracassada Superliga europeia, mas tem se virado muito bem sem ela

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Rory Smith
The New York Times

Florentino Pérez tinha um sorriso satisfeito no rosto, e com razão. Ele acabara de ver Espanha e Brasil jogarem um empolgante empate no estádio que ele caríssima e luxuosamente reformou. O todo-poderoso presidente do Real Madrid estava em um túnel caiado, com seu tipo favorito de oportunidade fotográfica.

De um lado estava Vinicius Junior, principal atração do Real Madrid, apresentando obedientemente o homem que paga seu salário aos seus companheiros de equipe do Brasil. Um pouco mais adiante no corredor, apressando-se para prestar homenagem, estava Rodrygo, outro funcionário de Pérez.

Mas o foco de Pérez estava em Endrick, a estrela de 17 anos que completará sua tão esperada mudança para o Santiago Bernabéu no verão europeu. Dizer que os dois tiveram uma conversa seria exagero: nas imagens de seu breve encontro, Endrick não parece falar. Após um aperto de mão, Pérez diz apenas uma frase: "Estamos esperando por você aqui".

O Real Madrid já tinha Endrick em vista havia algum tempo: O clube anunciou um acordo para contratá-lo três dias antes da final da Copa do Mundo de 2022. Ele permaneceria no Palmeiras, o clube que o transformou no prospecto mais cobiçado do futebol mundial, até completar 18 anos, em julho deste ano.

Florentino Pérez acompanha partida de basquete entre Real Madrid e Dallas Mavericks no WiZink Center, em Madri
O presidente do Real Madrid, Florentino Pérez - Juan Medina - 10.out.2023/Reuters

Esse tipo de planejamento de longo prazo parece um pouco fora do estilo tradicional do Real Madrid. O clube se identifica, corretamente, como um titã, e —sob a liderança de Pérez, em particular— tem se orgulhado de viver os valores associados à definição clássica desse termo: impulsivo, impetuoso, irascível.

Ele demite treinadores por não vencer a Liga dos Campeões, contrata jogadores após uma Copa do Mundo estelar e exibe regularmente em seu canal de televisão interno um programa que foi interpretado como uma tentativa preventiva de influenciar e/ou intimidar árbitros.

Tudo isso permanece enraizado no clube. Nos últimos três anos, Pérez não apenas ajudou a conceber uma Superliga que pretendia remodelar o futebol mundial mais ao seu gosto mas a defendeu em um vistoso "talk show" noturno e continuou a promovê-la mesmo depois de ela ser massacrada por, bem, praticamente todo o mundo.

Mas há pouca dúvida de que haja algo diferente na encarnação atual do Real Madrid. O clube sempre se considerou o maior, mais poderoso, mais famoso time não apenas do futebol mas do esporte como um todo. Agora, é possível argumentar que também deveria ser considerado o mais bem administrado.

Seu recorde na Liga dos Campeões comprova isso. Na última década, venceu o torneio que o clube mais preza cinco vezes. Se a equipe de Carlo Ancelotti perder para o Manchester City nas quartas de final, será apenas a terceira vez desde 2010 que o Real Madrid não terá alcançado pelo menos as semifinais da maior competição de clubes do mundo.

Um melhor indicador, no entanto, é o que ocorrerá no meio do ano. Além de Endrick, já ungido como o melhor jogador da nova geração do futebol, espera-se que o Real Madrid finalmente contrate Kylian Mbappé, o destaque da geração atual. Também chegará Alphonso Davies, lateral esquerdo canadense que hoje defende o Bayern de Munique.

Todos os três acordos mostram como o Real Madrid navega habilmente no mercado de transferências. Endrick é outro achado especial de Juni Calafat, o chefe de recrutamento do clube, que há muito tempo é encarregado de levar os melhores prospectos de todo o mundo —da América do Sul em particular— para Madri.

Mbappé tem sido um estudo de caso, com o Real Madrid seduzindo o jogador e aguardando o momento certo, posicionando-se lentamente como sua única rota realista para sair do Paris Saint-Germain, esperando até que as condições econômicas fossem adequadas para contratar um jogador atualmente empregado por um clube que é, na prática, um braço de um estado-nação.

Davies, também, é uma obra-prima de paciência: o Real Madrid apresentará ao Bayern de Munique a escolha de perdê-lo por uma quantia neste verão, ou de graça quando seu contrato expirar em 2025. O Bayern vai se ressentir, é claro. Mas é familiar o suficiente com esse tipo de método de intimidação que pode, secretamente, aplaudir um pouco também.

Não seria o primeiro clube a admirar —ainda que a contragosto— quão bem o Real Madrid se adaptou a um cenário financeiro que, como o projeto da Superliga demonstrou, parecia ter se voltado contra os antigos aristocratas da Europa.

O Real Madrid não tem dinheiro para intimidar os times da Premier League a vender jogadores. Então, em vez disso, contratou Antonio Rüdiger do Chelsea em uma transferência gratuita. O clube mantém uma academia impressionantemente produtiva —de acordo com a empresa de análise CIES, 97 de seus formados estão jogando profissionalmente na Europa—, mas também tem se movido rapidamente para contratar jogadores como Eduardo Camavinga, Jude Bellingham e Aurelién Tchouaméni antes que eles caiam nas garras inglesas.

O resultado é um clube que, quase sozinho entre os grandes times do continente, pode olhar para o futuro com entusiasmo. O Barcelona hipotecou muitos amanhãs para pagar pelos pecados de ontem. O Bayern de Munique está prestes a contratar seu quarto treinador em três anos. A Juventus ainda está se recuperando da renúncia em massa de seu conselho em 2022 em meio a alegações de contabilidade fraudulenta.

Por outro lado, o Real Madrid na próxima temporada provavelmente poderá escalar um meio-campo com Camavinga, Tchouaméni e Bellingham e um ataque com Rodrygo, Vinicius e Endrick. Onde exatamente Federico Valverde se encaixa é um mistério. Certamente não parece que o destino do clube dependa do que Mbappé vá decidir fazer.

De muitas maneiras, o clube permanece antiquado, sendo administrado como um feudo pessoal por um presidente onipotente. Ele não finge ser tão orientado por dados, tão moderno, como o Manchester City ou o Liverpool, e definitivamente não sente, em nenhum momento, a necessidade de dizer a alguém quão inteligente é.

Mas é difícil escapar da impressão de que, entre toda a elite tradicional do futebol, o Real Madrid é agora o que menos precisa de uma Superliga. É verdade que esta não é a realidade que Florentino Pérez esperava vivenciar em 2024. Ele gostaria de que ela mudasse, irrevogavelmente, para se adequar ao seu clube. O inverso, porém, parece ter funcionado igualmente bem. Ele tem seu estádio moderno. Ele tem seu aglomerado de estrelas. O mundo continua como sempre foi, muito ao gosto do Real Madrid.

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