Descrição de chapéu Causas do Ano Datafolha

2 em cada 10 homens se dizem vítimas de agressão ou violência sexual quando menores

Pesquisa Datafolha encomendada por Instituto Liberta mostra que índice entre mulheres é mais que o dobro

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Giovanna Balogh Gabriela Caseff
São Paulo

Dois em cada dez homens adultos (21%) dizem ter sido vítimas de agressão ou violência sexual quando menores de idade. Índice semelhante ao de pessoas com 60 anos ou mais (19%), que passaram por situações como ser exposto a órgão genital, ter suas partes íntimas tocadas ou ter sido vítima de violência sexual mais grave na infância ou adolescência.

O resultado está no levantamento do Datafolha, em pesquisa encomendada pelo Instituto Liberta, que ouviu 1.671 pessoas, com 18 anos ou mais, em 130 cidades brasileiras entre 7 e 13 de junho. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos.

Homem negro com cabelo black power veste camiseta regata e posa para foto mostrando tatuagens cobrindo os dois braços
Fabrizio Guaitacá, 34, foi abusado quando tinha dez anos enquanto cortava o cabelo em um salão de bairro - Divulgação

O Datafolha aponta que 43% das mulheres disseram ter sido vítimas de pelo uma situação de agressão ou violência sexual antes dos 18 anos –mais que o dobro do índice masculino.

Muitos homens, no entanto, têm dificuldade de falar sobre isso. O designer de joias Fabrizio Guaitacá, 34, diz que só foi se reconhecer vítima por volta dos 10 anos de idade.

"Foi preciso muita coragem para entender tudo o que tinha acontecido comigo e como isso afetou meus relacionamentos", diz ele.

Fabrizio conta que foi abusado por um cabeleireiro no bairro em que morava, em Sorocaba (interior de SP). "Ele se esfregou em mim, me tocou e me fez tocar nele. Chegou a ejacular em mim e, depois disso, nunca mais voltei lá. Não contei para ninguém", recorda.

O designer conta que recentemente passou em frente ao salão onde foi vítima. Foi um grande gatilho perceber que outras pessoas podem ter passado pela mesma situação.

"Lembro que na época não queria cortar mais o cabelo. Quando minha mãe pedia para eu ir, sempre inventava uma desculpa. Não tinha espaço para falar sobre isso em casa e não sei se acreditariam."

Segundo ele, além do abusador ser próximo da sua família, ele era casado e tinha filhos.

Como forma de garantir privacidade em um assunto delicado como violência sexual, os entrevistados com mais de 18 anos foram convidados a responder questões mais pessoais da pesquisa usando um tablet.

O Datafolha revela que 12% dos homens declararam ter recebido proposta de "recompensa" de um adulto em troca de ato sexual quando menores de idade. Entre as mulheres, o índice foi de 19%.

Outros 10% afirmaram que um adulto mostrou de propósito o órgão genital a eles e 8% foram tocados ou acariciados intimamente, sem consentimento, na infância e/ou adolescência. Entre as mulheres, o índice foi de 28% e 24% respectivamente.

Entre os homens, 6% disseram ter sido vítimas de violência sexual mais grave, como estupro, antes dos 18 anos –ante 21% das mulheres entrevistadas.

"Temos a ideia de que nós, homens, temos sempre que ser 'viris' para reafirmar a masculinidade. Quanto mais reprimir os sentimentos, esconder emoções e dores, mais viril eu sou", diz Fábio Manzoli, palestrante e facilitador de cursos de autoconhecimento para homens.

Ele acrescenta a necessidade de quebrar o tabu de que homens não são vítimas de agressão ou violência sexual. Nos cursos que ele dá, alguns contaram pela primeira vez sobre as violências sofridas.

"Isso acontece porque na infância a sociedade diz que menino não pode chorar, que ‘é coisa de viado’ e de mulher. Falar dá muito alívio e quebra o mindset misógino e homofóbico", diz Manzoli.

Para a presidente do Instituto Liberta, Luciana Temer, a violência sexual é um crime de gênero que acomete mais as meninas, mas meninos também são vítimas. "Em um país machista como o nosso, o constrangimento e o silêncio sobre essa violência são ainda maiores."

No caso das pessoas com 60 anos ou mais, Luciana diz que é difícil para eles reconhecer que a agressão pode ser algo ‘não carnal’, que acontece sem penetração sexual.

"Até pouco tempo atrás, o estupro era algo que acontecia só quando havia penetração, mas a legislação mudou. Para os idosos, é mais difícil se reconhecerem como vítimas."

Luciana relembra ainda que a luta contra a violência sexual começou entre as pautas feministas, há cerca de 35 anos. "A violência sexual foi tirada da invisibilidade nos últimos anos, pois não se falava sobre isso, principalmente, violência contra meninos e meninas", diz

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