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da Folha Online
Jayme
de Carvalho Jr./Folha Imagem
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O
escritor Bento Prado Jr. durante palestra no auditório Folha |
"Nesses 500 anos de história, em quase tudo a gente saiu perdendo. Mas há
um ponto em que nós podemos ser ufanistas: a literatura, e, principalmente,
a poesia de Carlos Drummond de Andrade".
A afirmação é do filósofo Bento Prado Jr., professor na Universidade Federal
de São Carlos e professor emérito da USP, para explicar a abordagem de sua
explanação sobre poesia brasileira.
O tema foi abordado numa palestra promovida pela Folha, na quinta-feira
(18/5), às 19h30. O debate "Poesia no Brasil" integra o ciclo de conferências
com a participação dos autores que escrevem na seção "Brasil 501 d.C.",
do caderno Mais!.
Para falar sobre a obra de Drummond, Bento Prado analisou três poemas do
autor: "O Boi e o Marciano", ".Science Fiction" e "A Máquina do Mundo".
Este último é considerado pelo professor uma das principais contribuições
do autor mineiro à literatura brasileira.
"É a minha primeira tentativa de chegar aonde eu sempre quis: fazer uma
leitura de um poema que, para mim, é especial, pois foi a partir dele que
descobri qual era a verdadeira literatura que buscava", diz. "É apenas um
primeiro passo: um dia vou escrever algo sobre 'A Máquina do Mundo'",
acrescenta.
A poesia de Drummond, segundo ele, é dividida em etapas. Na primeira fase,
o autor tenta romper com a tradição hegemônica do parnasianismo, que se
caracteriza pelo culto de métrica e rima fixas e por uma temática universal,
que fale predominantemente do passado.
Para o professor, a poesia parnasiana era sofisticada sintaticamente, mas
usava uma linguagem diferente da que era falada no Brasil, cujos temas também
eram pouco representativos do cotidiano brasileiro.
A segunda fase é a fase da poesia engajada, com temas políticos da época:
o nazismo, o governo Getúlio Vargas e a Segunda Guerra Mundial. Como exemplo,
"A Rosa do Povo", um dos mais conhecidos poemas do autor. "Essa fase não
é a que me interessa mais, mas é provavelmente, como obra de poesia engajada,
poesia política, a melhor do mundo", afirma Prado.
Para Prado, contudo, a fase mais interessante é a posterior à Segunda Guerra
Mundial. Ele diz que, nessa fase - que inclui os livros "Claro Enigma" e
"Lição de Coisas", Drummond "sofre a ressaca do pós-guerra", e, por
estar ligado ao Partido Comunista, vivencia a Guerra Fria, e sua poesia
se volta para a metafísica.
"Ele volta às formas clássicas, ao soneto, e se torna um sonetista tão bom
quanto Sá de Miranda, Camões, e, certamente, melhor do que os sonetistas
parnasianos", destaca.
O filósofo faz comparações a grandes autores da poesia internacional, como
o português Luís de Camões (1524-1580) e o alemão Rainer Maria Rilke (1875-1926).
Prado afirma que, na poesia do escritor brasileiro, o humor jamais é abandonado.
"Uma das grandes riquezas de Drummond é que ele consegue chegar a linguagem
elevada sem perder a vivacidade da linguagem cotidiana, isto é, sem perder
o humor."
No poema "A máquina do Mundo", há uma referência imediata à tradição clássica
da literatura de língua portuguesa. "No canto décimo de 'Os Lusíadas', Camões
fala da máquina do mundo, que é exatamente o título do poema de Drummond.
Não digo que o humor apareça aqui como aparece em Drummond, mas a língua
de todos os dias se enobrece e se aproxima de Camões. Ele dá atualidade
à língua de Camões", analisa.
(Adriana Resende)
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