Logo de cara, este texto entrega a notícia mais importante: as crianças (e muitos adultos) estão certos quando dizem que ovo de Páscoa tem, sim, um gosto diferente e melhor do que o gosto das barras de chocolate normais, vendidas ao longo do ano inteiro.
Sabe aquela conversa que sempre rola antes de abril, quando aparece gente nas redes sociais dizendo que um ovo custa o preço de não se sabe quantas barras etc etc, e que valeria mais a pena comprá-las e esquecer de vez os ovos? Pois este argumento não vale quando se trata de produtores de chocolate artesanal, ensina a americana Arcelia Gallardo, chef da Ateliê Mission Chocolate, moradora do Brasil há nove anos.
"A maioria das pessoas faz uma receita específica só para a Páscoa, que não existe o ano inteiro. Como vai ser uma produção limitada, com uma validade mais curta porque será consumido rápido, normalmente eles fazem um produto de maior qualidade", diz Arcelia.
Isso não vale, no entanto, para os ovos de marcas que produzem em mais larga escala, como por exemplo a maioria daqueles que vemos pendurados nos supermercados. Estes, diz a chef, seguem a mesma receita das barras e têm validade extensa —tanto que começam a ser feitos em outubro do ano anterior.
Estudiosa do chocolate há anos, Arcelia também conta como começou a tradição de se comer e dar de presente este tipo de doce na época da Páscoa. Tudo tem início há cerca de dois séculos, quando as pessoas passam a consumir o chocolate da maneira com que conhecemos hoje, em pedaços e adocicado.
Daí, 150 anos atrás, mais ou menos, pela primeira vez o chocolate é derretido e colocado dentro de uma casquinha de ovo comum, desses de galinha mesmo, inventando assim uma tradição seguida até hoje em quase todo o mundo.
"Tanto o ovo quanto o coelho são símbolos de fertilidade, e a época da Páscoa acontece na primavera na Europa e nos Estados Unidos. A Páscoa tem essa relação com uma vida nova, que vem do cristianismo", diz Arcelia.
"As pessoas costumavam fazer um jejum por 40 dias antes da páscoa, em que deixavam de comer carne e, ao final deste tempo, havia uma grande ceia, com bastante comida. Normalmente, as famílias presenteavam todas as pessoas com um ovo cada uma, sendo que os ovos das crianças, para ficarem mais alegres, eram decorados."
Uma das coisas maravilhosas do chocolate, diz Arcelia, é que ele toma a forma de qualquer coisa que se queira. E, aos poucos, a tradição de dar um ovo de animal decorado foi evoluindo para um ovo animal esvaziado de seu conteúdo e recheado com chocolate derretido.
Surge, então, o formato de ovo que usamos até hoje. "Imagina as crianças daquela época, a família perguntando se elas preferiam receber um ovo normal ou um ovo de chocolate", brinca a chef. "Fomos, com o tempo, tendo acesso a formas de plástico e metal e, em vez de todo esse trabalho de esvaziar um ovo, começamos a usá-las no processo."
A decoração dos ovos e de suas embalagens também tem origem lá na época dos ovinhos de presente para as crianças —em vez de casquinhas pintadas à mão, belas coberturas e papéis metálicos para embrulhar.
No Brasil, a tradição dos ovos de chocolate, lembra Arcelia, acontece pelas mãos dos imigrantes italianos, que vinham de um país em que essa forma de celebração da Páscoa já existia. A produção dos ovos em solo nacional, no entanto, só começa por volta dos anos 1950.
Enquanto na Europa e nos Estados Unidos era e ainda é mais comum presentar as crianças na Páscoa com coelhos de chocolate ou cestas de doces, no Brasil, por influência italiana de novo, surgem os ovos com brinquedinhos dentro.
"E outra curiosidade é que o Brasil é realmente o único lugar do mundo em que existe esse ovo de colher, recheado com brigadeiro, essas coisas todas", ri Arcelia. "Isso não existe lá fora."
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