Conheça o que justifica a indicação dos 9 candidatos a melhor filme

Críticos, jornalistas e colaboradores da Folha apontam as razões intrínsecas

Em maior ou menor medida, os nove longas que nesta noite disputarão o prêmio máximo da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas tangenciam questões do debate social e político. 

O campeão de indicações, “A Forma da Água” usa a fantasia para tratar de tolerância. Seu adversário mais forte, “Três Anúncios para um Crime”, fala de uma mulher sedenta por justiça nos rincões da América que elegeu Donald Trump. “Corra” aborda a questão racial, “The Post”, a importância da imprensa livre.

Trama Fantasma” trata de jogos de poder entre homem e mulher. Se parecem mais escapistas, “Lady Bird” e “Me Chame pelo Seu Nome”, ambos sobre amadurecimento pessoal, também falam da grande classe média baixa dos EUA, no primeiro caso, e da superação da homossexualidade como tabu, no segundo.

Por fim, os históricos “Dunkirk” e "O Destino de uma Nação" perseguem ideais de grandeza política que hoje parecem escassos no panorama mundial. 

Aqui, junto à lista dos indicados, críticos, jornalistas e colaboradores da Folha apontam não sua preferência por um ou outro título em disputa na categoria principal, mas as razões intrínsecas que justificam a indicação, e a eventual vitória, de cada um.

 


A FORMA DA ÁGUA

13 indicações

Que forma tem a água, matéria fluida que se molda, escorre e transborda? O título do filme do mexicano Guillermo del Toro anuncia, tal como esse meio, uma ficção difícil de delimitar. 

 

Desde “Cronos” (1993), seu primeiro longa, o cineasta mexicano nunca escondeu a ambição de reinterpretar temas universais e abstratos a partir do código ilimitado do fantástico. 

Em “A Forma da Água”, ele se interessa por algo tão elementar como o amor. Se sua estética barroca e ultradecorativa incomoda os mais puristas, não deixa de ser um baita diferencial alguém apostar tanto na fantasia num momento em que o cinema e as outras artes se enredam em excesso no “real”. 

A parcela mais progressista do nosso tempo está lá, na ternura pela diferença e pelos excluídos. Mas o fato de não se ater à divulgação da mensagem e, junto, propor uma forma que flui entre os gêneros, jogar sorrateiramente com os clichês de Hollywood e abrir as comportas da imaginação já é uma distinção. (CÁSSIO STARLING CARLOS)


DUNKIRK

8 indicações

 

Dunkirk” é cinema em estado puro. Uma história de personagens menores, contada com fotografia espetacular, trilha sonora angustiante, diálogos mínimos e approach singular: é um filme de guerra sem sangue nem batalhas. Sua força está na alternância do tempo, um tema recorrente em outros filmes do diretor, como “Amnésia”, “Interestelar” e “A Origem”.  

Christopher Nolan costura horizontes imensos e espaços claustrofóbicos, com enquadramentos acachapantes e uma enorme compaixão pelas pequenas misérias humanas.

Raridade nesses tempos, seu filme é uma grande produção que não mira o público adolescente nem a agenda política segmentada por grupos de interesse. 

É uma ode ao cinema e à sua capacidade de contar uma história usando com virtuosismo o tripé mais básico: imagem, montagem e som. (VERA GUIMARÃES)


TRÊS ANÚNCIOS PARA UM CRIME ​

7 indicações

 

Um drama sem espaço para cenas dramáticas, cru, muitas vezes, cruel.

"Três Anúncios para um Crime" é um filme de seu tempo. Representa como poucos nesta temporada o ressentimento do americano, esse, que elegeu Donald Trump, contra as instituições tradicionais, no caso do filme, a polícia.

Mesmo violento, curiosamente o filme traz momentos de comédia, evocando a lembrança dos irmãos Coen, fortalecida pela presença de Frances McDormand, que a premiação desta noite deve confirmar como a melhor atriz do ano, e da trilha indicada de Carter Burwell, o mesmo de "Fargo", "Bravura Indômita" e tantos outros da dupla.

Mas o humor do diretor, roteirista e dramaturgo Martin McDonagh não é americano, é inglês. E a Academia adora premiar os ingleses. Aqui, será com justiça. (SANDRO MACEDO)


O DESTINO DE UMA NAÇÃO

6 indicações

 

Muitas cinebiografias ganharam o Oscar de melhor filme ao longo dos anos e, embora o prêmio tenha mudado bastante nos últimos tempos, o filme do inglês Joe Wright, diretor de “Anna Karenina” e “Desejo e Reparação”, preenche uma l acuna: é o longa que mais preserva o formato do cinema convencional, que sempre ganha espaço entre as produções indicadas.

 Como nenhum outro, Wright é um cineasta que se alimenta da tradição, mas sabe revisitá-la com elegância e muita pirotecnia.

Em um ano em que se levantam tantas bandeiras e que se chega à reta final da corrida sem um favorito claro e com muitos filmes dividindo opiniões, votar num longa com estas características pode fazer bastante sentido para uma ala mais conservadora da Academia. (CHICO FIREMAN)


TRAMA FANTASMA

6 indicações

 

Submissão não é condição desconhecida de quem ama. Insubmissão, tampouco, e as trocas de posição pelos protagonistas de “Trama Fantasma” vão costurando uma improvável rede de segurança sob esse casal de trapezistas imprudentes.


Doses de sadismo reforçam o risco de que alguém se arrebente, e o espectador fica ligadão no par que é romântico na essência, mas vil nos desempenhos sociais: o costureiro Reynolds Woodcock (Daniel Day-Lewis) abusa da vantagem de ser rico e famoso e vive enredado no teatro das bajulações; e Alma (Vicky Krieps), garçonete transformada por ele em modelo, joga com irresponsabilidade para dominar.


Com reconstituição farsesca da Inglaterra do pós-Guerra, Paul Thomas Anderson faz essa defesa brilhante de um sentimento já engrandecido por ele em título anterior: “Embriagado de Amor”. (GUSTAVO FIORATTI)


LADY BIRD - A HORA DE VOAR

5 indicações

 

A ansiada e ansiosa passagem da adolescência para a vida adulta de Christine, autonomeada Lady Bird, é o tema do filme de estreia de Greta Gerwig.

Franco e melancólico, com bons diálogos e ótimas atuações de Saoirse Ronan no papel-título e Laurie Metcalf como sua mãe, Marion ( indicadas na categorias de melhor atriz e melhor atriz coadjuvante), “Lady Bird” encanta e comove pelo mesmo motivo que, para alguns, pode ser irritante: conta uma história de ar banal com começo, meio e fim e sem empunhar bandeira alguma. 

Se o filme em si não é político, o fato de Gerwig ter se tornado, no ano do #MeToo, a quinta mulher em 90 edições do Oscar a disputar o prêmio de melhor direção (ela concorre também pelo roteiro do filme, vagamente inspirado em sua própria experiência) pode pesar a favor da singela produção. (FRANCESCA ANGIOLILLO)


CORRA!

4 indicações

 

A produção mais surpreendente de 2017 estreou em fevereiro e não saiu da mente de ninguém após todos esses meses, culminando nas quatro indicações ao Oscar, inclusive melhor filme.

“Corra!” resgata a inclinação à crítica social da ficção científica dos anos 1970 —em especial “As Esposas de Stepford”— ao falar sobre preconceito racial sem catequizar. Nada é por acaso na direção e no roteiro de Jordan Peele. Peças são jogadas como uma armadilha que leva o espectador a uma floresta escura sem que perceba que está entrando na própria alma.

A obra se tornou um fenômeno de bilheteria e rasgou preconceitos que afirmam que filmes protagonizados por negros são restritos a certo público. Bobagem. Ele mostra que não há questão de raça na hora de pagar o ingresso para passar duas horas entretido com inteligência. (RODRIGO SALEM)


ME CHAME PELO SEU NOME

4 indicações

 

Garoto europeu (Timothée Chalamet) tem seu despertar sexual aflorado com a chegada a sua casa de um americano mais velho (Armie Hammer). 

O filme do italiano Luca Guadagnino rumina a natureza do desejo tanto pela via intelectual, despejando referências plásticas, musicais e filosóficas, quanto pela via do instinto puro, fazendo o erotismo brotar a cada quadro (e nas bocas, peitos, calções, frutas...). 

Direção precisa (no limite do maneirista), ótimas atuações e bom roteiro fazem dele o filme mais redondo entre os que disputam o prêmio. 

Mas o fato de outra obra sobre um romance gay já ter vencido o prêmio em 2017 pesa a na direção contrária. Uma pena, “Me Chame” é o que “Moonlight” quis e não conseguiu ser: um bálsamo sensível contra o puritanismo em tempos tão pudicos(GUILHERME GENESTRETI)


THE POST -  A GUERRA SECRETA

2 indicações 

 

Steven Spielberg tem uma carreira irregular, com muitos filmes medíocres e poucos filmes memoráveis. Felizmente, “The Post: A Guerra Secreta” figura no segundo grupo.

Preocupado em filmar com rapidez um longa que respondesse ao momento político dos EUA sob a Presidência de Donald Trump, Spielberg retorna ao início dos anos 1970, quando a imprensa investigativa começa a implodir o governo de Richard Nixon divulgando documentos secretos do Pentágono.

Essa urgência, auxiliada pelo roteiro eficiente de Liz Hannah e Josh Singer, trouxe um frescor que não víamos em seu cinema desde o início dos anos 1980. E ainda temos interpretações sublimes de Tom Hanks e Meryl Streep (ambos há muito tempo não brilhavam com essa intensidade).

Tudo isso torna “The Post” o mais forte, artisticamente falando, dos indicados ao Oscar de melhor filme. (SÉRGIO ALPENDRE)

Erramos: o texto foi alterado

O filme "O Destino de uma Nação" foi incorretamente identificado como "A Hora mais Escura". O texto foi corrigido.

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