Descrição de chapéu

'O Filho Uruguaio' aborda sequestro de criança sem maniqueísmo

Trunfo do filme é consciência que, para certas situações, não há solução ideal

LÚCIA MONTEIRO
São Paulo

O Filho Uruguaio

  • Quando estreia nesta quinta (8)
  • Elenco Isabelle Carré, Ramzy Bedia, María Dupláa
  • Produção França, 2017, 12 anos
  • Direção Olivier Peyon

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Sylvie (Isabelle Carré) é uma garçonete francesa que teve o filho sequestrado pelo ex-marido uruguaio. Depois de quatro anos de imbróglio judicial e buscas pouco frutíferas, ela localiza Felipe (Dylan Cortes): o pai morreu, a criança agora vive com a avó e a tia numa cidadezinha do Uruguai. Sylvie consegue juntar dinheiro para a viagem. Apoiada pelo assistente social Mehdi (interpretado pelo comediante Ramzy Bedia, excelente num raro papel sério), pretende raptá-lo e levá-lo de volta à França.

O Filho Uruguaio
Felipe (Dylan Cortes) e Mehdi (Ramzy Bedia) em cena de "O Filho Uruguaio" - Divulgação

Sinopse objetiva de "O Filho Uruguaio", as linhas acima têm o defeito de organizar uma trama que, no filme, surge de maneira confusa. O terceiro longa-metragem do francês Olivier Peyon, autor da ficção "Pequenas Férias" (2006) e do premiado documentário "Como Detestei Matemática" (2013), começa "in media res", ou "no meio das coisas".

Quando vemos Sylvie e Mehdi na embarcação que os conduz a Montevideu, ela contando dinheiro, ele ao telefone, pouco entendemos daquela história que parece ter começado sem nossa presença —e que estampa a tela com tamanha intensidade. Leva tempo até que se entendam as motivações de cada personagem. Tal recurso confere ao enredo um bem construído clima de suspense.

A ousadia narrativa, no entanto, logo esmorece, dando lugar a uma mise-en-scène mais didática e a certo academicismo. Há planos filmados com maestria, num domínio da luz de indubitável beleza. Figurino e cenários, coordenados numa palheta que combina tons de bege e azul, sublinham um retrato nostálgico e pacato do interior uruguaio, por onde circulam velhas bicicletas e caminhões anos 1960.

Mais positivos do que negativos, esses elementos contribuem, no entanto, para que o filme soe falso, sobretudo quando combinados a dificuldades ligadas ao elenco internacional. Produção francesa rodada na América do Sul, o longa de Peyon traz atores desigualmente bilíngues, de modo que cenas rodadas em espanhol precisaram ser dubladas em francês e vice-versa, o que não favorece a autenticidade dos diálogos.

Felizmente, o roteiro não subscreve aos maniqueísmos costumeiramente envolvidos em histórias com crianças sequestradas. Felipe é feliz ao lado da avó e da tia, que lhe tratam com amor. A mãe não se encaixa no papel de heroína. Um tanto descontrolada, assusta o filho. O assistente social foge aos protocolos e se envolve excessivamente com a família.

Diante disso tudo, com quem deve ficar o garoto? Para as mais complicadas e situações da vida, não há mesmo solução ideal. Essa consciência é o trunfo do filme.

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